Em novo recorde de mortes registradas no período de 24 horas – 1.188 -, o Brasil superou na quinta-feira, 21, a marca de 20 mil vítimas em decorrência de infecção pelo novo coronavírus. Isso após 66 dias do primeiro caso. O País passou de 10 mil mortes para exatamente 20.047 em apenas 12 dias, e o número de casos continua em curva ascendente.

Já são 310.087 pessoas que se contaminaram em quase três meses desde o início da epidemia. Hoje se completa uma semana que o Ministério da Saúde está sem titular e não há divulgação de novos planos para conter a doença.

A aceleração da epidemia ocorre em direção ao interior do País, o que levanta um novo nível de alerta.

Segundo levantamento feito pela Fiocruz, pelo menos 7,8 milhões de brasileiros vivem em locais que demandam viagens de 4 horas até uma cidade que tenha condições de oferecer tratamento adequado para os casos mais complexos de covid-19, como hospitais com unidade de terapia intensiva (UTI), respiradores e equipes especializadas em doenças respiratórias agudas e graves.

A análise, feita pelo Instituto de Comunicação e Informação em Saúde, expõe o risco às populações mais vulneráveis e o tamanho das dificuldades que serão impostas aos sistemas de saúde com a interiorização da doença. Segundo dados do Ministério da Saúde referentes à quarta-feira, 3.488 municípios, em todo o País, já foram afetados pelo coronavírus, ou 62,6%.

Nas duas últimas semanas, em números absolutos, o Brasil saltou da sétima para a terceira posição entre as nações com mais casos de covid-19. Com isso, se mantém como um dos países em situação mais crítica do mundo em número de infecções, atrás de Rússia, que contabiliza 317 mil casos, e Estados Unidos, com mais de 1,5 milhão.

Na lista de países com mais mortes acumuladas, o Brasil ocupa a 6.ª posição. Fica atrás de Estados Unidos (93.863), Reino Unido (36.124), Itália (32.486), França (28.218) e Espanha (27.940).

A pandemia do novo coronavírus se tornou a principal causa de mortes por dia no Brasil. O maior número de infecções continua em São Paulo, com 73.739 diagnósticos e 5.558 mortes. O Rio tem 32.089 casos e 3.412 óbitos.

No Ceará são 31.413 infecções e 2.161 mortes. O Brasil ainda se tornou nos últimos dias o país com maior crescimento de casos de covid-19 por milhão de habitantes (pmh). De acordo com o cruzamento de dados da plataforma Our World in Data, ligada à Universidade de Oxford, desde a quarta-feira o País passou a liderar o ranking, que considera a confirmação de casos em um período de 24 horas e os dilui por milhão de habitantes, o que permite uma comparação de como a covid-19 está afetando países de populações distintas.

Como ocorre o avanço

Pesquisadores do grupo MonitoraCovid-19 divulgaram nesta quarta-feira uma nota técnica sobre as regiões do País e as redes de saúde, avaliando o deslocamento da covid-19 da capital para o interior e o fluxo de pacientes em busca de internação em grandes cidades.

Somente na semana passada (entre os dias 9 e 16), 227 municípios com população menor que 10 mil habitantes apresentaram o primeiro caso da doença, assim como 197 municípios com população entre 10 e 20 mil habitantes e 112 municípios com população entre 20 e 50 mil habitantes.

As mortes também começaram a ocorrer nessas cidades. De acordo com o levantamento, 50 municípios com menos de 10 mil habitantes apresentaram óbitos pela primeira vez. O mesmo ocorreu em 83 municípios com população entre 10 e 20 mil habitantes e em 98 municípios com população entre 20 e 50 mil habitantes.

A chegada da doença a cidades tão pequenas acende o alerta sobre como vai ser o acesso dos moradores desses locais às redes de saúde em situações de emergências.

Pelos cálculos, 7,8 milhões de pessoas vivem distantes até quatro horas de um polo de atendimento de alta complexidade e os Estados mais afetados são Amazonas, Pará e Mato Grosso – com mais de 20% das populações. O trabalho apontou ainda que em 175 municípios, onde há esses polos de atendimento, mais de 50% dos internados já eram provenientes de outros municípios até o dia 4 de maio.

Redes de saúde

A análise teve como foco avaliar a sobrecarga das redes de saúde e indica que não adianta fazer isolamentos localizados, de um ou de outro município, sem pensar nas regiões como um todo, uma vez que as pessoas precisam se deslocar para buscar atendimento. “Desde o começo da epidemia se fala na necessidade de proteger os sistemas de saúde. De achatar a curva para evitar o colapso. Mas é preciso entender de que sistemas estamos falando. Os moradores de municípios pequenos precisam se deslocar para os grandes para terem atendimento.

Nesse sentido existem regiões de saúde pelo País”, explica Diego Xavier, epidemiologista do Instituto de Comunicação e Informação em Saúde da Fiocruz, que participou do trabalho. “O que sugerimos é que precisa ser adotada uma coordenação de estratégias para definir de modo claro e rápido qual região e qual rede está sendo protegida com uma determinada estratégia. Tem de ser uma união real, e não retórica”, diz.

“Prefeitos têm de sentar com governadores e o governo federal para definir isso pensando nessas regiões de atendimento. Imagine uma região como a de Petrolina (PE) e Juazeiro (BA) (cidades separadas pelo Rio São Francisco). Se um Estado resolve aumentar o isolamento e o outro começar a relaxar, não vai dar certo”, complementa o pesquisador. “O que precisamos é proteger a rede de UTIs e respiradores e isso vai além dos limites municipais.”

O estudo alerta ainda que a doença, que começou pelas grandes capitais e de lá foi para o interior, agora vai fazer o caminho contrário na busca de doentes por atendimento. “Essa doença teve o tempo de ida e nas próximas semanas vamos começar a ver o tempo de volta. Só que as grandes cidades já estão com seus hospitais quase lotados. O isolamento que as cidades grandes adotaram no começo da epidemia fez com que a doença demorasse para chegar ao interior. E agora vamos ver as pessoas dessas cidades indo para as capitais em busca de atendimento”, diz Xavier. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.