Em 2020, quando o assunto ESG (em português, Ambiental, Social e Governança) começou a aquecer, um dos setores que acompanhei em relação a esse tema foi o Agronegócio. De lá para cá, presenciei muitos debates, webinars e discussões sobre o tema, sem contar toda a cobertura midiática especializada e participantes do grande evento do ano, que foi a COP 26 (Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas). Olhando toda essa movimentação, vale lançar luz a temas que foram recorrentes recentemente e discorrer sobre as novas tendências para o setor no que tange ao ESG.

Um dos destaques dos últimos meses tem sido a discussão a respeito do desmatamento. A União Europeia (UE), em um movimento de reforçar os aspectos do Acordo Verde Europeu, lançou recentemente novas regras para que os produtos consumidos pelos cidadãos da UE não contribuam para o desflorestamento. Na prática, isso significa restrições à importação de produtos ligados ao agronegócio que são relacionados ao desmatamento, como produtos de base — soja, carne bovina, óleo de palma, madeira, cacau e café — e a alguns dos seus produtos derivados, conforme citado no próprio site do Acordo Europeu.

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Ainda sobre desmatamento, o assunto também foi tema da COP26. Logo no início da Conferência, houve a assinatura de uma declaração por 105 países, cujas nações se comprometeram, por meio de ações coletivas, deter e reverter a perda florestal e a degradação do solo até 2030. O Brasil também se juntou a este compromisso.

Ainda no contexto mundial, em 2021, também presenciamos o lançamento oficial da Década – A Década das Nações Unidas da Restauração de Ecossistemas 2021-2030, que tem como objetivo engajar a sociedade, governos e população em geral para colaborar com iniciativas de restauração no mundo. Além da proteção dos recursos do planeta, a expectativa é que tais práticas possam gerar empregos e eliminar a fome e a pobreza. Relacionando com o agronegócio, o setor pode contribuir, e muito, com sistemas agroalimentares mais eficientes, inclusivos, resilientes para a produção sustentável de alimentos.

Saindo do cenário global e indo para os temas discutidos pelas empresas do agronegócio em nosso país, conversei recentemente com um gestor de um banco de investimentos que possui vários clientes do setor. Como investidor, ele destacou o que poderia ser prioridade em uma agenda ESG, com destaque para a gestão hídrica, considerando consumo por tonelada produzida, a qualidade do solo e as emissões de gases de efeito estufa.

Fora isso, ainda há a importância da segurança da força de trabalho, a diversidade ampliando a participação de mulheres na direção e conselho de administração, assim como a inclusão e as oportunidades para pessoas com deficiência, além de uma real preocupação com a rastreabilidade dos insumos e as diligências dos fornecedores. Somado a esse contexto, temos também a relevância de certificações, como o Bonsucro, e a comunicação das ações das empresas para dar visibilidade aos impactos gerados, inclusive recomendando-se que as companhias adotem estruturas para gerir seus Programas ESG, robustecendo a governança corporativa.

Outro tema que vale destacar e está relacionado a essa produção é a perspectiva de uma crise financeira, conhecida como Cisne Verde e causada pelas mudanças climáticas. Neste caso, eventos extremos, que são cada vez mais frequentes, podem destruir a plantação, trazer impacto na infraestrutura logística para escoar a safra e gerar prejuízos para o setor do agronegócio.

Por fim, usando o jargão do próprio segmento, não adianta olhar só da porteira para dentro. Considerar o entorno, voltado para à comunidade local e o desenvolvimento econômico regional também deve ser uma realidade das empresas que têm a responsabilidade socioambiental nas suas ações de sustentabilidade. O setor já compreendeu que não impacta somente o “E”, de Ambiental. As outras letras – S (Social) e G (Governança) – também chegaram com força no universo do agronegócio. Tudo isso traduzido em uma ruptura na cultura e mudança de comportamento pela liderança do setor continuará norteando a agenda de sustentabilidade.

*Daniela Coelho é diretora associada de riscos e performance na ICTS Protiviti, empresa especializada em soluções para gestão de riscos, compliance, ESG, auditoria interna, investigação e proteção e privacidade de dados.