O escritor Jorge Amado, conhecido por seus romances geniais, como Gabriela Cravo e Canela, Tenda dos Milagres e Jubiabá, se intitulava cidadão de Ilhéus, município do sul da Bahia, apesar de ter nascido na vizinha Itabuna. Amado, um dos fundadores da “Academia dos Rebeldes”, grupo de jovens que desempenhou um importante papel na renovação da literatura baiana nos anos 1920, certamente aprovaria o que vem acontecendo em sua terra de adoção, conhecida no mundo inteiro pelo cultivo de cacau – mas não exatamente por sua qualidade. A fama das boas amêndoas, para produzir os melhores chocolates do mundo, fica com países africanos, como a Costa do Marfim e Gana, além de México, Equador e Colômbia, na América Latina.

Inconformado com esse estigma, a de fornecedores de segunda categoria no mercado internacional de chocolate, um grupo de produtores de cacau da região está, literalmente, “rodando a baiana”. Por conta  própria, sem incentivos oficiais, eles estão investindo na verticalização da produção, com ênfase no chocolate de alta qualidade, que começa a fazer sucesso no mercado internacional.


Visão: Diego Badaró, da Amma Chocolate, o mais badalado chocolateiro do País, diz que é preciso tirar o cacau da condição de commodity e agregar valor à amêndoa

Nos últimos anos, eles investiram na produção de chocolates finos, de ponta a ponta, para mostrar que são capazes de deter o controle total da cadeia produtiva do cacau, começando pela escolha da fruta colhida no campo, passando pela fermentação e a seleção das melhores amêndoas, a torra controlada, até chegar ao processamento do chocolate e  sua embalagem para consumo. O grupo reúne cerca de oito marcas, mas entre elas os destaques são a Amma Chocolates, do produtor Diego Badaró, a Mendoá, de Leandro Reis Almeida, a Sagarana, de Henrique de Almeida, e a Chor, de Marcos Lessa. “Somos a turma que deseja mudar a imagem do chocolate brasileiro”, afirma Henrique de Almeida,que neste mês assume pela segunda vez a presidência da Associação dos Produtores de Cacau (APC), entidade que reúne cerca de 300 produtores de 21 municípios do sul baiano. Para Lessa, que coordenou o 7º Festival Internacional do Chocolate e Cacau, evento que aconteceu em Ilhéus no mês passado, o País está se preparando rapidamente para produzir um bom chocolate e competir em igualdade de condições com os concorrentes internacionais. Almeida lembra, com desgosto, ter ouvido, em 2008, numa palestra em Paris, no Salon du Chocolat, o mais importante evento do setor, que os brasileiros não teriam como fazer parte do mercado de chocolate premium. “Ficamos engasgados.”

A indústria do chocolate movimenta globalmente US$ 110 bilhões por ano, de acordo com a Euromonitor, a principal agência global de pesquisa de estratégia para mercados consumidores. Não há dados oficiais, mas, presume-se que a fatia de mercado para os produtos premium represente 1% desse valor, ou seja, cerca de US$ 1,1 bilhão. É desse seleto nicho que os brasileiros querem participar. De acordo com a francesa Chloé Doutre-Roussel, consultora e uma das maiores autoridades do mundo em chocolate, definir o termo chocolate fino ou premium não é uma tarefa fácil. “O conceito começou a surgir em 1995, liderado pela França com seus chocolates especiais e pela Suíça, que desenvolveu maquinário para trabalhar a amêndoa do cacau de um modo mais elaborado”, diz Chloé. “Assim, começou uma corrida por amêndoas de qualidade em todo o mundo.” Da França e Suíça, além da Bélgica, da Itália, dos Estados Unidos e Canadá, os chocolateiros saíram pelo mundo em busca das amêndoas perfeitas para serem processadas em seus países. Encontraram no Brasil, por exemplo, o produtor João Tavares, da fazenda São Pedro, em Itajuípe, a 60 quilômetros de Ilhéus, um dos mais renomados produtores de amêndoas de qualidade no País. Entre seus clientes está o célebre chocolateiro francês Sthéphane Bonnat, da Bonnat Chocolatier, tradicional casa fundada em 1884. A produção de Tavares ganhou também, nos anos 2010 e 2011, prêmios de qualidade no Salon du Chocolat. “Tavares é um pioneiro que abriu caminhos para os demais produtores”, diz Lessa. “Seu trabalho em busca de amêndoas perfeitas e os prêmios recebidos apontaram saídas para o nosso cacau.” 

Para a especialista Chloé, que há quatro anos visita fazendas brasileiras, o País tem uma oportunidade de ouro nas mãos e duas tarefas imediatas: mapear as amêndoas de qualidade e provar ao mundo que elas existem. “Se os produtores conseguirem mostrar o produto final do cacau, melhor ainda”, diz Chlóe.  “Os consumidores querem saber de onde vem o chocolate que comem e estão mais educados sensorialmente para saber o que é um bom produto.” A consultora francesa, que ainda engatinha no português, mas consegue se comunicar com desenvoltura em espanhol, foi a conselheira do produtor e administrador de empresas Leandro Reis Almeida, dono da fazenda Riachuelo, localizada a 20 quilômetros de Ilhéus, na criação da marca Mendoá, em 2013. Reis Almeida começou a investir no setor seis anos antes, depois que decidiu se dedicar exclusivamente à fazenda comprada, em 1990, pelo pai, o empresário José Geraldo Reis Almeida. Na época, as terras na região valiam praticamente nada por causa da crise provocada pela vassoura de bruxa, uma praga que quase dizimou a lavoura cacaueira no País (leia mais na pág. 38). “Meu pai comprou uma floresta abandonada, eram 300 hectares com dez funcionários”, diz Reis Almeida. “Mas ele sabia que a floresta guardava um tesouro e hoje estamos desfrutando dessa visão de futuro.” Com negócios nos ramos imobiliário e de telefonia, a família Reis Almeida emprega, atualmente, 300 funcionários na propriedade de 2,5 mil hectares, que além do carro-chefe, o cacau, abriga um rebanho de gado leiteiro e um cafezal.


Toque francês:a consultora Chloé Doutre-Roussel, que trabalha no Brasil há quatro anos, diz que os produtores têm o desafio de mostrar o que é cacau superior

Há dois anos, Reis Almeida investiu R$ 3 milhões para a construção de uma fábrica de chocolate, que conta também com um centro de pesquisa, onde são desenvolvidas variedades do cacau, os blends que compõem as fórmulas dos vários tipos de chocolate e a qualidade das amêndoas. “Não devemos nada a nenhum outro polo de pesquisa no mundo, aqui temos o que há de mais moderno no setor”, diz Reis Almeida. No meio da Mata Atlântica, ou Floresta Atlântica como preferem chamar os nativos da região, o domínio da amêndoa vai do estudo das variedades de cacau que oferecem a melhor composição entre aroma e sabor, até o monitoramento da sombra recebida pelas árvores, para que a genética da planta expresse todo o seu potencial de qualidade. No laboratório da fábrica, amostras das amêndoas são minuciosamente examinadas e somente vão para o processamento final os lotes considerados perfeitos. Para chegar a esse grau de refinamento, Reis Almeida propôs sociedade ao agrônomo Raimundo Camêlo Mororó, um dos maiores especialistas brasileiros do mercado de cacau. Mororó foi pesquisador por 25 anos da Comissão Executiva do Plano da Lavoura Cacaueira (Ceplac), órgão do Ministério da Agricultura. “O segredo do bom chocolate está no controle total da variedade utilizada e no beneficiamento da amêndoa”, diz Mororó, responsável pela gestão da fábrica.


Mercado na cabeça: depois de 25 anos de pesquisa, o agrônomo Mororó deixou a Ceplac para se tornar sócio no projeto da fazenda Riachuelo
 

Atualmente, a fazenda Riachuelo colhe frutos que depois de secos resultam em 900 toneladas de amêndoas. Desse total, apenas 45 toneladas, o equivalente 5% da produção, são transformadas em chocolate fino. O restante é vendido como commodity para grandes moageiras da região, entre elas a multinacional belga Barry Callebout e a americana Cargill. Reis Almeida não revela a receita total da fazenda, mas, com o chocolate premium ele já consegue faturar cerca de   R$ 3,5 milhões por ano. “Estamos trabalhando para que o cacau premium chegue a representar 20% da produção”, diz. “Nosso foco é vender em grandes centros, como São Paulo, que tem dinheiro e a cultura do consumo.” Os chocolates Mendoá podem ser encontrados em casas  sofisticadas de alimentos e bebidas, como o empório Santa Luzia e a loja recém inaugurada da mercearia italiana Eataly, dona de uma rede de 29 filiais espalhadas por países como Estados Unidos, Japão, Emirados Árabes e Turquia.


VASTO MUNDO Entre os produtores que estão investindo no chocolate premium, o mais conhecido internacionalmente é, sem dúvida, Diego Badaró, 34 anos, dono da Amma Chocolate, da quinta geração de uma família de agricultores do Sul da Bahia. Dos 400 hectares cultivados com cacau no sistema orgânico, 300 estão no município de Itacaré, situado a 70 quilômetros ao norte de Ilhéus. Atualmente, Badaró produz 50 toneladas de chocolate premium por ano, a metade exportada para 18 países, entre eles Estados Unidos, Japão, Nova Zelândia, Inglaterra e França. O produtor não revela quanto fatura com o negócio, mas a fabricação em larga escala do chocolate Amma só foi possível em 2007, ao se associar ao chocolateiro americano Frederick Schilling. Com investimento estimado em R$ 1,4 milhão, na época, os sócios construíram uma fábrica em Salvador, com capacidade para processar até 400 toneladas por ano de amêndoas.

Em maio deste ano, Badaró inaugurou nos Jardins, bairro nobre da capital paulista, a Casa do Sabor, uma charmosa loja que também vai servir para degustações monitoradas. “O cacau ainda é uma planta esquecida e poucos consumidores se conectam à sua origem”, afirma Badaró. “Mas é uma planta nossa, que já foi responsável por 70% do PIB da Bahia, e por isso é preciso resgatá-la.” Nas primeiras décadas do século 20, o cacau foi o mais importante produto baiano de exportação. Ilhéus, que além de polo produtor, nessa época ganhou um porto,  chegou a embarcar para o exterior 300 mil toneladas por ano de amêndoas. Com a Bahia como protagonista, as exportações da década de 1970 rendiam ao País US$ 1,5 bilhão por ano. “O cacau ajudou a construir o Estado, que se tornou de fato uma potência, mas sempre com uma visão de commodity”, diz Badaró. “Exportávamos sacas e mais sacas, mas sem agregação de valor e sem a riqueza da floresta embutida naquelas sacas.”

   Ferrenho defensor da valorização do cacau, Badaró, formado em comércio exterior, começou a divulgar sua produção lá fora, em 2005. Naquele ano, sem contatos com empresários e especialistas do setor na Europa, Badaró colocou nas costas uma mochila repleta de amêndoas colhidas e processadas em sua fazenda e desembarcou com a cara e a coragem no Salon du Chocolat. A maior parte das tentativas de mostrar sua produção nos estandes da feira, fracassou. Depois de bater muita perna e de dezenas de negativa, porém, teve a sorte de conhecer o chocolateiro francês François Pralus, que se interessou pelo que estava sendo exibido pelo brasileiro. Logo Pralus passou a importar as amêndoas de Badaró para serem processadas em Roanne, cidade próxima de Lion, onde a fábrica de sua família está instalada desde 1948. Na primeira encomenda, foram adquiridas cinco toneladas de amêndoas, parte delas transformadas em barras que levaram o nome Diego Badaró. Desde então, a Pralus mantem com exclusividade a fazenda baiana em seu portofólio mundial de produtos de origem. “Quando a Pralus começou a usar o meu cacau, com um chocolate que levava o meu nome, as pessoas passaram a me procurar para conhecer a fazenda de Itacaré”, diz Badaró. “Os franceses foram um divisor de águas na minha história.”

Na Europa e nos Estados Unidos, os chocolates finos se tornaram referência de produtos de qualidade por dois motivos. Além da busca incessante por amêndoas com identificação de origem, os chocolateiros transformaram o cacau em uma iguaria vendida em ambientes de luxo, com certas especificidades. A principal foi passar a analisar o cacau de forma idêntica à feita com os vinhos, a partir de seu “terroir”. A palavra, emprestada do francês, pode ser traduzida livremente como “uma sensação de um lugar”. Para os especialistas, o terroir é a soma dos efeitos do meio ambiente um produto. “Por isso, os diferentes cacaus são únicos em aroma e sabor”, diz a consultora Chloé. “Eles podem ser frutados, amadeirados ou cítricos, como o vinho, ou o café, por exemplo.” Chocolateiros, como o francês Pierre Hermé, o belga Pierre Marcolini, os venezuelanos Michael e Richard Antonorsi e o americano Richard Donnelly são especialistas em identificar terroirs, onde se abastecem para sua produção. Chocolates vendidos em suas lojas chegam facilmente em US$ 250 o quilo.

No País, Badaró é um dos produtores que vêm se destacando na pesquisa de variedades diferenciadas de cacau, com potencial de darem origem a produtos gourmet. “O pequeno produtor de cacau, muitas vezes escondido no interior do País, sem acesso a mercados, é o elo que jamais poderia se desconectar da cadeia”, diz Badaró. “Muitas vezes é esse produtor que guarda as nossas melhores joias.” Por isso, além de cuidar da sua própria lavoura, Badaró pesquisa a fundo a produção nacional para encontrar cacau de valor. Segundo ele, além da Bahia, há cultivo de excelência no litoral do Espírito Santo, em localidades remotas do Pará, como o município de Medicilândia, e no interior de Rondônia. No mês passado, Badaró foi buscar nesse Estado 30 quilos de amêndoas super especiais, pelas quais pagou US$ 600, valor 200 vezes superior ao preço de uma amêndoa comum. “Rondônia possui cacau de primeiríssima qualidade”, diz o produtor. A idéia é utilizar essa matéria prima altamente sofisticada em uma edição especial de chocolates de sua marca. “Pequenos produtores de amêndoas, que dominam seu ofício, podem nos trazer grandes surpresas.”

PEQUENOS NOTÁVEIS – Do grupo de vanguarda dos produtores de chocolate, fazem parte ainda Marcos Lessa, da marca Chor e Henrique de Almeida, da Sagarana. Lessa começou a produzir chocolate no ano passado, depois de coordenar por cinco anos o festival de Ilhéus. Para fazer parte do ainda restrito clube de fabricantes de chocolate premium ele visitou 20 fazendas, das quais seis foram selecionadas como fornecedora das amêndoas utilizadas pela Chor. “Fiz uma parceria com uma pequena fábrica local para que o processo produtivo não saísse de minha mão”, diz Lessa. No primeiro ano de atuação, ele vendeu duas toneladas de chocolate e faturou R$ 360 mil.  Para ele, o futuro do mercado de chocolates finos passa pelas certificações, como a denominação de origem, mais uma vez, a exemplo do que ocorre com o vinho. “Não tenho dúvida de que, à medida que as pessoas experimentam um chocolate puro, que elas saibam a origem de um barra com teor de cacau de 70%, e de qualidade superior, elas nunca mais voltam a consumir chocolate sem procedência.”

Almeida, que criou a marca Sagarana, em 2011, também acredita em um mercado muito maior para o seu negócio. Dono de uma pequena fazenda em Coaraci, a 80 quilômetros de Ilhéus, onde já fabrica de forma artesanal o seu chocolate, ele pretende construir uma fábrica maior. “Já tenho o orçamento pronto de R$ 3 milhões e há linhas do BNDES que atendem às minhas necessidades”, diz o produtor. Ele dá como exemplo do potencial de crescimento sua experiência no ano passado. Em 30 hectares de floresta de cacau, a renda com a produção de chocolate premium foi de R$ 200 mil. Caso não tivesse produzido os chocolates finos, Almeida teria faturado apenas R$ 40 mil nessa área de floresta.

O dono da Sagarana é um típico pequeno produtor de cacau da região, onde a maior parte das propriedades tem entre 60 hectares e 80 hectares. “O cacau de procedência moveu a produção da Sagarana e isso pode acontecer com outros produtores, é assim no mundo todo”, diz Almeida. De acordo com ele, do total de associados à APC, cerca de 20 produtores já estão produzindo seu próprio chocolate. A maior parte dos integrantes desse grupo, é verdade, não faz parte da elite do cacau premium, a exemplo de Badaró e Reis Almeida, mas muitos deles estão a caminho. Olhando para o futuro, Jorge Amado, que completaria 103 anos no próximo dia 12 de agosto, se ainda fosse vivo talvez reescrevesse alguns capítulos do livro São Jorge dos Ilhéus, de 1944. A obra de ficção, que começa com a frase “a terra dá frutos de ouro”, conta uma história na qual, embora os cacauicultores de Ilhéus sejam derrotados pela depressão dos preços da commodity, a queda não é o ponto final e sim o surgimento de ideais para novos tempos. Nesse novo capítulo, com certeza, os produtores de chocolate premium, um conceito que não existia na época em que Amado escreveu seus romances, hoje fariam parte da trama, ao modernizar e incentivar sua produção, agregando valor e estabelecendo um novo patamar de negócios para o cacau.

A nova receita do cacau
Pesquisas do Ministério da Agricultura indicam que é possível recuperar a produção e processar amêndoas de qualidade


Fábrica de chocolate: a pesquisadora Neide Pereira ajuda os produtores a conhecerem as qualidades de seu próprio cacau

A Costa do Marfim, na África, maior produtor mundial de cacau, deve colher 1,6 milhão de toneladas de amêndoas, na safra 2014/2015, cerca de oito vezes o obtido pelo Brasil, o quarto do ranking, com 287 mil toneladas, estimadas pelo IBGE. Mas nem sempre foi assim: até o começo dos anos 1970, o País era o primeiro do ranking, chegando a produzir em seu auge 350 mil toneladas por safra, quando mundo produzia pouquíssimo cacau. Essa posição foi perdida, primeiro por conta do acirramento da concorrência internacional, com o estímulo ao cultivo nos países africanos, de parte das multinacionais americanas e europeias, interessadas em diversificar suas fontes de abastecimento. Some-se a isso, a destruição provocada pela vassoura-de-bruxa, uma praga que começou a atacar as lavouras no sul da Bahia, a partir de 1989, e que provocou a queda do mercado cacaueiro no País. Em 1990, em meio à crise sem precedentes que assolava o setor, a produção nacional caiu de 400 mil para apenas 100 mil toneladas a mais. A vassoura-de-bruxa é causada por um fungo que apodrece o fruto e a planta, levando à perda total da produção se a praga não for combatida – há suspeitas de que a praga foi introduzida de forma criminosa para acabar com a hegemonia do cacau brasileiro no mercado.


Visão de futuro:o pesquisador José Pereira diz que as tecnologias estão prontas para ajudar o produtor a lutar contra as pragas da lavoura

Atualmente, depois de décadas de estudos, os pesquisadores da Comissão Executiva do Plano da Lavoura Cacaueira (Ceplac), entidade que atua na Bahia, Pará, Amazônia, Rondônia, Espírito Santo e Mato Grosso, acreditam que já encontraram respostas suficientes para que o produtor conviva com a doença e volte a ter plantações produtivas. “Não há como extinguir a praga, mas há como produzir bem, apesar dela”, diz Helinton José Rocha,  diretor geral da Ceplac. “O cacau pode tornar-se novamente uma cultura importante, porque nenhum outro país do mundo tem uma cadeia produtiva tão adensada quanto a brasileira, indo da genética da planta até o chocolate.”

A unidade da Ceplac em Itabuna, a 45 quilômetros de Ilhéus, é o principal polo de estudos, e onde se concentra a maior parte das pesquisas de combate à vassoura-de-bruxa. Já foram pesquisadas 200 variedades de cacau, em busca das mais resistentes. Hoje, são indicados 16 clones, plantas que surgiram a partir de cruzamentos de variedades que se destacaram como resistentes à praga. O principal objetivo é elevar a produtividade média das plantações de cacau, das atuais 20 arrobas por hectare nas áreas de floresta para até 200 arrobas a pleno sol. Para o agrônomo José Marques Pereira, chefe do serviço de pesquisa do cacau da unidade, o caminho já está traçado para a produção pelo sistema cabruca, em que o cacau é plantado em florestas. “O produtor pode seguir um manejo mais fino e retomar a produção”, diz Pereira. “A tecnologia está pronta.”


Depois do desastre:a vassoura-de-bruxa (à dir.), que quase dizimou a cacauicultura no País, está dando lugar a frutos mais resistentes
à praga

Além das práticas agronômicas, a Ceplac possui um centro de pesquisa de chocolate que funciona como uma incubadora de empresas, desde 2002. De acordo com a engenheira Neide Alice Marques Pereira, chefe da Seção de Tecnologia e Engenharia Agrícola da Ceplac, os produtores podem processar seu próprio cacau por até duas safras, na fábrica de chocolate, como é conhecido o centro. “Os agricultores aprendem a desmontar a amêndoa do cacau em líquor e manteiga, e a remontá-lo em barras de chocolate”, diz Alice. “Quando saem do centro estão prontos para montar seus próprios negócios.” Cerca de 15 pequenas marcas artesanais de chocolate nasceram ali. Mas, o trabalho da fábrica vai além. Os produtores também podem avaliar a qualidade das amêndoas de suas fazendas. No mês passado, uma das salas de estoque guardava pelo menos 40 lotes para serem testados. Os melhores serão enviados ao próximo Salon du Chocolat, em Paris, em outubro.