Em junho do ano passado, o executivo Bernardo Paiva, presidente da fabricante de cervejas brasileira Ambev, esteve no Nordeste. A viagem, no entanto, não era de férias. Paiva saiu de São Paulo, sede da empresa, direto para Jaguaruana, município cearense de cerca de 30 mil habitantes, a 190 quilômetros de Fortaleza. Ele foi conhecer os primeiros resultados de um projeto implantado nas comunidades de Sítio Volta e de Caiçara, que beneficiou os habitantes com a perfuração de poços e a instalação de micro usinas de energia. “Nosso objetivo é unir pessoas por meio da água”, afirma Paiva. No caso, a Ambev vem destinando todo o lucro com a venda de água da marca Ama, lançada em 2017, para projetos que levem justamente água potável às famílias da região do semiárido nordestino.

Tarefa: Fabiano Rangel, da Leão, diz que o objetivo da empresa é criar condições para o produtor se desenvolver (Crédito:Alessandro Couto)

A Ambev não é um caso isolado. Hoje, cada vez mais as empresas com algum interesse no agronegócio, além daquelas que atuam diretamente no setor, estão se dedicando a causas que vão além da assistência técnica aos produtores. O que elas querem é fazer a diferença na sociedade, em temas relacionados à sustentabilidade do planeta. São exemplos como o da fabricante de refrigerantes Coca-Cola, que está contribuindo com projetos de recuperação de nascentes e de irrigação no Espírito Santo. Ou da subsidiária da holandesa de nutrição animal Trouw Nutrition, que começou um movimento para que todas as empresas do setor do agronegócio passem a utilizar em suas frotas de veículos o etanol de cana-de-açúcar como combustível. Para o consultor Jeffrey Abrahams, sócio-gerente da holding Fesa para agronegócio, as companhias querem que o mercado reconheça um propósito para seus negócios. “Causas sociais atraem jovens para os seus quadros de funcionários, consumidores antenados e mostra engajamento além de suas fronteiras”, diz Abrahams. “Esse movimento é irreversível em todos os setores, e o agronegócio não fica de fora.”

No caso da Ambev, de acordo com Richard Lee, gerente de relações corporativas da empresa, o lucro do primeiro ano de vendas da água Ama foi de R$ 1 milhão. “Esse recurso levou benefícios que vão além da água nas torneiras”, diz ele. Os projetos AMA já beneficiaram 6.660 pessoas. Na Coca-Cola, que fatura no mundo US$ 41 bilhões e é dona do grupo Leão Alimentos e Bebidas, no Brasil, os investimentos já somam também R$ 1 milhão, desde 2016. A companhia vem investindo essa verba em um projeto de produção de água na microbacia do rio Barra Seca e na Foz do Rio Doce, no nordeste do Espírito Santo, em parceria com ONGs e com o governo do Estado. A região reúne pequenos produtores de café, mamão, pimenta-do-reino, seringueira e goiaba. Segundo Fabiano Rangel, gerente de relações institucionais e sustentabilidade da Leão, o objetivo é criar condições para aumentar a oferta e a reserva hídrica na região, ampliando a cobertura florestal em até 150 hectares em cinco anos. Hoje, a cobertura é de 110 hectares, em 42 propriedades. “A meta é ter 51 produtores cadastrados”, afirma Rangel. “A ideia é que no futuro eles recebam pagamento por serviços ambientais.”

Desde o ano passado, a Leão também está incentivando o uso de tecnologias. Junto com a startup Agrosmart, de Campinas (SP), ela começou um projeto de irrigação em São Roque do Canaã, a cerca de 100 quilômetros da fábrica de Linhares (ES), uma das três unidades da Leão no País. O objetivo é levar água a 19 pequenos produtores, através do monitoramento do solo por sensores e estações meteorológicas. “Ao fim de três anos, esperamos reduzir em 30% o uso de água e em 10% o uso de energia”, diz. De acordo com Rangel, alguns produtores chegam a gastar R$ 2 mil mensais com eletricidade, conta alta para os padrões da região.

Solo fértil: no Espírito Santo, pequenos produtores estão recuperando matas para ter mais água nas propriedades (Crédito:Divulgação)

No caso da Trouw Nutrition, o valor da ação está na imagem da companhia e na sua relação com outras empresas do setor. A frota de 160 veículos da empresa, que passou a consumir apenas etanol nos últimos meses, percorre 5,7 milhões de quilômetros por ano, equivalente a 142 voltas ao redor da terra. De acordo com o presidente da empresa no País, Stefan Mihailov, a Trouw utilizava 430 mil litros de gasolina por ano. “Com a mudança, estamos evitando a produção anual de mil toneladas de gases de efeito estufa”, diz. A próxima missão é fazer com que os 950 funcionários também utilizem etanol em seus veículos e que outras companhias com as quais mantém negócios entrem na campanha Nossa Frota é Movida a Etanol. Entre elas estão a Cabrera, Civemasa e Tatu Marchesan, de implementos agrícolas. “As conversas têm sido positivas”, afirma Mihailov. O próximo passo são ações nas redes sociais, entre elas o Facebook. “É mais uma maneira de envolver pessoas que estão fora do nosso negócio. E quanto mais, melhor.”