Safra 2009 começa a se desenhar como uma das

melhores dos últimos anos e o País já colhe os

bons resultados de um ano que parecia perdido

Durante o mês passado centenas de máquinas cortaram os campos de Mato Grosso, colhendo soja num ritmo frenético. A ânsia da colheita tem explicação: naquele Estado, 2009 será melhor que 2008, mesmo com a crise econômica e todos os seus efeitos. O motivo está numa complexa equação que envolve câmbio, oportunidades e estratégias de venda. No ano passado, neste mesmo período, o mundo observava uma subida avassaladora dos preços das commodities. Porém, nessa mesma época, os produtores mato-grossenses estavam com mais de 70% de sua safra vendida antecipadamente, com preços abaixo de US$ 10 o bushel, enquanto a bolsa de Chicago experimentava a astronômica cotação de US$ 14.

Conclusão: sobraram apenas 30% de toda a plantação para ganhar dinheiro, o que gerou um sentimento de frustração. Mas neste ano a história é diferente. A safra foi plantada num câmbio de R$ 1,80 por dólar e será vendida a pelo menos R$ 2,20. “Saímos de uma perspectiva de prejuízo de R$ 100 por hectare no começo da crise para um lucro de R$ 300 por hectare, enquanto as máquinas entram nas lavouras de Mato Grosso”, explica o analista Fernando Muraro Jr., da Agência Rural, de Curitiba e Rondonópolis. Além disso, segundo ele, secas em diversas regiões da América do Sul foram responsáveis por uma quebra de 15 milhões de toneladas, o que pressionou os preços. “A China também comprou quatro milhões de toneladas a mais do que no mesmo período do ano passado, e isso mexeu com os ânimos do mercado”, explica.

Mas não é só Mato Grosso que está se beneficiando do novo momento. Na Bahia, um regime de chuvas praticamente perfeito fez subir a produtividade na região, que deve colher um lucro mínimo de R$ 200 por hectare, segundo dados da Plasteca Consultoria. “Tivemos alguma incidência de ferrugem asiática, o que fez com que produtores gastassem um pouco mais com defensivos, mas não chegou a comprometer a renda”, diz o analista Landino José Dutkevics. E até mesmo a seca que assolava o Rio Grande do Sul sucumbiu diante de chuvas que chegaram na hora certa, conforme explica o consultor da Safras e Mercado Flávio França Junior.

Mas o fato de existir uma moderada euforia no campo não quer dizer que os riscos tenham passado. Todos os olhos do mundo se voltam para os Estados Unidos na esperança de que a indústria do etanol de milho saia do buraco (ver reportagem na página 30). A lógica é simples: para se plantar milho, os custos são muito maiores se comparados com os da soja, principalmente na América do Norte, em que o uso de insumos é elevadíssimo. “A tendência natural é que boa parte das lavouras de milho se converta em soja, o que pode depreciar os preços no mercado internacional”, analisa Fernando Muraro. “Realmente o Brasil tem de torcer para uma recuperação do mercado americano, porque ele pode influenciar o mundo todo”, explica. De forma geral, segundo estudos da Agência Rural, o mercado mundial deve seguir no mesmo ritmo de 2008, sem grandes incrementos. Contudo, pelo menos o consumo de proteína não deve sofrer baixa.

DE OLHO NO CAMPO:

ministro Reinhold Stephanes acredita em um ano positivo

No mês passado, o Ministério da Agricultura divulgou os dados do PIB de 2008, cujo incremento foi de 5,62% ante 2007. O resultado só não foi melhor por causa da desaceleração da economia registrada no último trimestre.

“No primeiro semestre, as taxas de crescimento mensais foram de 0,8%, puxadas principalmente pela alta do preço das commodities”, diz Adriana Ferreira Silva, pesquisadora do Cepea. A produção de soja foi de 60 milhões de toneladas, a maior da história. Neste ano, por causa da baixa de investimentos e pela cautela de produtores, a safra deve ser 7% menor. “A crise de alimento não desapareceu, os estoques mundiais continuam abaixo da média histórica e os chineses devem continuar comprando quantidades crescentes de alimentos, inclusive devem comprar mais que em 2008”, diz José Vicente Ferraz, da AgraFNP Consultoria.

SAFRA DE SOJA:

alta do dólar e bons preços internacionais garantirão a renda

Mas, infelizmente, nem todos conseguirão colher lucros. Na cotonicultura, o tempo está fechado. “Algodão está ligado à indústria, e vestuário é um dos primeiros itens a serem cortados quando há uma crise de confiança”, diz Ferraz. Com margens negativas, esses produtores terão de trabalhar muito na gestão para conseguir empatar as despesas. Mas, em meio a um cenário tão incerto, é possível dizer que na guerra de 2009, entre mortos e feridos, todos se salvaram. Pelo menos no campo brasileiro.