País, dono do segundo maior rebanho bovino do mundo, com mais de 200 milhões de animais, produziu no ano passado oito milhões de toneladas de carne – em equivalente carcaça –, e exportou 1,2 milhão de toneladas por quase US$ 6 bilhões. Foi o maior volume de carne comercializada no mundo. Há pouco mais de duas décadas, caso alguém se atrevesse a dizer que um dia o Brasil protagonizaria um feito como esse, provavelmente seria motivo de chacota. Nos idos de 1980, a Austrália e os Estados Unidos eram imbatíveis, enquanto o País ocupava o quarto lugar na classificação mundial de criadores, com menos de 90 milhões de animais, e os embarques de carne nem sequer apareciam na lista dos grandes exportadores. “Hoje, o mundo se curva diante de nós, e boa parte desse movimento se deve ao melhoramento genético”, diz o professor Raysildo Barbosa Lôbo, presidente da Associação Nacional de Criadores e Pesquisadores (ANCP), em Ribeirão Preto, no interior paulista.

Especialista em genética bovina pela Universidade de São Paulo, o professor Lôbo coordena o programa de melhoramento Nelore Brasil, que completa 25 anos no próximo mês. No dia 5 de abril, Lôbo pretende reunir os criadores na sede da entidade para um seminário de avaliação desse período e o que se espera no melhoramento bovino nos próximos anos. “O conhecimento por meio do estudo e da pesquisa foi fundamental para chegarmos até aqui”, diz Lôbo.

O Programa Nelore Brasil, que começou com três criadores, em 1988, conta hoje com mais de 300 pecuaristas, em 18 Estados brasileiros, incluindo, ainda, membros da Bolívia e do Paraguai. Depois do nelore, vieram os programas para as raças brahman, guzerá e tabapuã. Juntas, elas representam mais de 80% do gado criado no País. Nesse período, dois milhões de animais foram cadastrados pela associação, e seis milhões de bovinos avaliados através de pesagens. As medições serviram para analisar e indicar os melhores animais para características como, ganho de peso, precocidade sexual, permanência de um animal no rebanho, quilos de bezerros desmamados por ano e qualidade de carcaça, entre outras medições.

A ANCP também foi a primeira entidade, no Brasil, a utilizar em seu critério de seleção as medidas de perímetro escrotal (PE) dos candidatos a reprodutores. O programa já computou um milhão de medidas de PE. “Nos machos, o PE tem relação com o ganho de peso”, diz Lôbo. “No decorrer dos anos, essa medição ajudou muito a encaminhar para a seleção os animais com maior potencial para a produção de carne.” A ANCP também foi pioneira no uso da ultrassonografia na pecuária, na produção do primeiro bovino Puro de Origem (PO), com fecundação in vitro, e no primeiro sequenciamento do gene do hormônio de crescimento em zebuínos (BGH).

Nos últimos anos, os pesquisadores têm se debruçado sobre as características econômicas que interessam a uma pecuária cada vez mais tecnificada. “Saber quais são essas características na carcaça de um bovino é fundamental”, diz Lôbo. Entre elas está o marmoreio, que é a quantidade de gordura presente em um corte de carne, e a relação entre o peso do animal logo após o abate e o quanto ele rende em carne após a desossa. Os criadores de gado têm reconhecido o esforço dos pesquisadores da área. No ano passado, 44% do sêmen comercializado pelas centrais de inseminação foi de animais que estão em teste no programa de reprodução programada. Segundo a Associação Brasileira de Inseminação Artificial (Asbia), o ano fecharia com quase cinco milhões de doses de sêmen comercializadas. “A composição da carcaça tem importância economica porque está relacionada à quantidade do produto vendido.”

O pecuarista Carlos Viacava, que também é diretor corporativo da Cutrale, uma das maiores processadoras de suco de laranja do País, faz parte do programa da ANCP desde o seu início. Em abril, ele será o presidente do seminário da entidade. Viacava é dono de um rebanho de 2,2 mil matrizes da raça nelore mocho nas fazendas São José, em Paulínia, Campina, em Presidente Venceslau, e Santa Gina, em Presidente Epitácio, no interior de São Paulo. Com essas matrizes, Viacava consegue vender 600 touros e 200 fêmeas com garantia de fertilidade e precocidade, por ano. Em 2012, os 250 touros top da seleção leiloados saíram a R$ 7 mil de média, R$ 1 mil a mais que a média do País. “Fazendo melhoramento a gente cresce muito mais depressa.” O projeto de Viacava é chegar a mil touros nos próximos anos. Para Lôbo, não será difícil alcançar a meta. “A genética dá as respostas que o rebanho precisa para avançar. Basta observá-lo”, diz o professor.