O ano de 2020 foi considerado histórico para a vitivinicultura brasileira pelas condições climáticas que resultaram em uvas de qualidade incomparável. Foi a “Safra das safras”, no entendimento de agrônomos, enólogos, produtores e críticos de vinho. Foi também um período próspero no que se refere à sustentabilidade.

Cada vez mais engajados na busca de soluções de menor impacto ambiental, muitos produtores de uva e vinho passaram a encarar seus vinhedos como uma espécie de laboratório vivo para experimentações em campo. Um dos objetivos é adotar as melhores práticas de manejo, que possam garantir a sanidade das parreiras com menor uso de defensivos químicos. Mas essa revolução sustentável traz outros benefícios que podem resultar em ganhos para o produtor, para o consumidor e, claro, para o planeta.

Das 607 espécies da flora ameaçadas de extinção no Rio Grande do Sul, 250 estão no bioma Pampa

Ainda que muitos dos novos produtores estejam aderindo à onda dos vinhos orgânicos e naturais, que dispensam agrotóxicos, talvez o melhor exemplo de engajamento ambiental venha da mais antiga vinícola do País, a Família Salton. Em 2020, quando completou 110 anos, a empresa criou seu Núcleo de Inovação, Pesquisa & Desenvolvimento. “Embasados em pesquisa científica e reunindo informações em um extenso banco de dados, buscamos conhecer os detalhes que envolvem nossos vinhedos e nossos parceiros”, afirmou o enólogo Gregório Salton, integrante da quarta geração da família. Segundo ele, os projetos do núcleo, alguns em parceria com a Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) e com a Universidade de Caxias do Sul (UCS), reúnem ferramentas e técnicas para a coleta, organização e análise dos dados nas áreas de viticultura e enologia, “sustentando estrategicamente as decisões na busca pela excelência da matéria-prima e da sustentabilidade em cada etapa.”
Com 96% de seus vinhedos próprios plantados na Campanha Gaúcha, é natural que a Salton priorize a região para desenvolver estudos que possam ser replicados também junto a outros produtores.

MONITORAMENTO Para conhecer melhor esse bioma, suas características e ameaças, a empresa iniciou a catalogação ambiental da região. A meta é identificar toda a flora local, estimulando a preservação da cobertura verde nativa entre os vinhedos de forma a promover a coexistência harmônica no ecossistema rural. Das 607 espécies da flora ameaçadas de extinção no Rio Grande do Sul, 250 estão no bioma Pampa. Somam-se a esse programa outras três frentes de pesquisa: conhecendo o solo, conhecendo o clima e conhecendo o relevo.

O primeiro é destinado ao diagnóstico das características, propriedades, formação e estrutura do solo para suprimento, sob medida, de possíveis deficiências. A pesquisa em parceria com a UFSM define as adequações nutricionais de solo específicas para o cultivo de uvas na região. O estudo foi iniciado em 2015 e deu origem ao “Manual de Adubação de Solo para a Região da Campanha Gaúcha com Foco em Viticultura”, cujo objetivo é garantir a vitalidade da planta através da nutrição do solo, cultivando vinhedos mais resistentes e minimizando o uso de defensivos. A pesquisa é pioneira na região. “Como resultado, conseguimos definir os períodos e intervalos para a aplicação, bem como as doses e composições ideais para a adubação dos tipos de solo da Campanha”, disse Salton. O estudo está sendo compartilhado com 40 viticultores.

Já a coleta e análise de dados climáticos permite entender as probabilidades de ocorrerem doenças em cada área plantada. Por fim, o mapeamento digital de superfície, relevo e curvas de nível ajuda na tomada de decisão sobre a exposição das plantas em relação ao sol, entre outras informações que podem aprimorar os cuidados no manejo. Todos os dados obtidos pelos programas serão disponibilizados no “App do Viticultor”, criado para integrar digitalmente o produtor rural com a vinícola.

CARBONO NEUTRO Pesquisas comprovam que a atividade vitícola mantém o equilíbrio natural do bioma Pampa, fazendo com que os vinhedos se tornem sumidouros de carbono. Isso porque eles absorvem CO2 da atmosfera, contribuindo para preservação da fauna e flora locais e reduzindo impactos no efeito estufa. A esse respeito, outra iniciativa, dessa vez em parceria com a Universidade de Caxias do Sul (UCS) e com assessoria ambiental da empresa Brandalise & Grasseli, envolve os procedimentos na vinícola: um inventário de emissões foi implantado para dar subsídios à busca de oportunidades em ações de eficiência energética e melhora operacional dos processos produtivos em toda a cadeia de atuação da Família Salton, que assumiu o compromisso de se tornar carbono neutro até 2030. E tudo isso fazendo vinhos cada vez melhores, como comprovam as inúmeras premiações que a Família Salton tem recebido no Brasil e no exterior.