Nas carteiras, em vez do velho talão de cheque, agora há cartões bancários para os cerca de 3 mil funcionários da São José Agroindustrial, com sede em Igarassu, município da Região Metropolitana do Recife. A nova era da moeda é cada vez mais um movimento digital também na centenária empresa de um dos grupos mais tradicionais do Nordeste, o Petribu. Criado há 290 anos, hoje produz cerca de 140 mil toneladas de açúcar e 20 milhões de litros de etanol por safra, com a cana-de-açúcar cultivada em um raio de até 100 quilômetros da capital pernambucana, nos municípios de Goiana, Condado, Nazaré da Mata e Carpina. “Há alguns anos, o cheque era a forma de pagamento mais utilizada”, conta Genaldo Ferreira, supervisor de Recursos Humanos da São José Agroindustrial. “Hoje, cada trabalhador da usina tem o seu cartão magnético”, afirma Ferreira.

Não é à toa que pagamentos em cheque vêm despencando ano após ano, ao contrário das transferências eletrônicas. Os números não deixam dúvidas. Há duas décadas, cerca de 3 bilhões de cheques eram compensados por ano, segundo o Banco Central. No ano passado, foram menos de 440 milhões, uma gigantesca queda de mais de 85%. Com 200 milhões de habitantes, o Brasil tem, atualmente, 150 milhões de cartões plásticos. No ano passado, foram realizadas 7,9 bilhões de operações na função débito e 6,4 bilhões na função crédito, um crescimento de 16,1% e de 8,4%, respectivamente, em relação a 2017. As transações somaram R$ 1,55 trilhão, 14,5% acima do ano anterior. Para 2019, a perspectiva é de R$ 1,8 trilhão.
O mundo rural, que já enfrentou maiores problemas de conectividade, está entrando definitivamente nessa nova onda de crescimento, levando mais segurança às transações financeiras. “O uso de cartões foi uma grande revolução. Muitos dos nossos funcionários tinham o hábito de repassar seus cheques para terceiros”, declara Ferreira. “Nessa transação, eles perdiam parte dos salários. Agora, isso não acontece mais”, destaca.

Integração digital No caso da São José Agroindustrial, mesmo o funcionário que não possui uma conta bancária está integrado ao projeto da digitalização financeira. A solução foi dada pelo Social Bank, com sede em Uberlândia (MG), de onde saiu o novo método de pagamento aos trabalhadores da usina e de outros 60 mil funcionários de empresas rurais localizadas na Bahia, Goiás, Minas Gerais, Paraíba, Rio Grande do Norte e São Paulo. Por meio de uma plataforma digital e on-line, o Social Bank permite que pessoas e companhias realizem qualquer tipo de transação entre si, a partir de uma conta de pagamento digital.

THIAGO BERNARDES / FRAME

Criado no ano passado, o Social Bank embarca no mesmo sucesso de empresas de tecnologia em finanças, as chamadas fintechs, como a paulistana Nubank, do engenheiro e empreendedor colombiano David Vélez. No Social Bank, os investidores da plataforma já imaginavam sua projeção no ambiente rural. Por trás da ideia está gente graúda, acostumada ao empreendedorismo e de olho no agronegócio. Um deles é o empresário Rodrigo Borges, CEO do Social Bank e sócio da HubPrepaid, empresa que atua no mercado de meios de pagamentos. O outro é o bilionário curitibano Carlos Wizard Martins, presidente do grupo Sforza, dono da rede de escolas de inglês Wiseup e também controlador da rede de alimentos Mundo Verde, das marcas Pizza Hut, KFC e Taco Bell no Brasil. “A proposta é democratizar e simplificar o acesso a serviços financeiros em todos os setores de mercado e segmentos da sociedade”, diz Wizard. “Por isso, é muito natural encontrarmos terreno fértil para crescer junto ao agronegócio”, afirma o empresário.

Crescimento Em menos de um ano de funcionamento, o Social Bank já movimentou cerca de R$ 100 milhões em transações no campo. Até o próximo ano, a empresa espera movimentar R$ 1,5 bilhão em todo o setor. E os investidores acreditam que ainda há muito espaço para crescimento. Tudo indica que eles estão certos. Segundo a consultoria americana Endeavor, o agronegócio conta atualmente com cerca de 670 mil companhias e 513 mil funcionários. O administrador de empresas

Parceria digital A dupla de executivos Carlos Wizard (acima) e Rodrigo Borges está por trás do projeto de plataforma financeira do Social Bank (Crédito:foto: felipe gabriel)

Guilherme Ribeiro, diretor de Negócios do Social Bank, diz que o segmento carecia de ferramentas de gestão mais seguras e que, por isso, faz sentido a ousada meta estabelecida. “No campo, há dificuldades diárias para efetuar e receber pagamentos, devido à ineficiência técnica e à possibilidade de assalto aos carros-fortes”, afirma Ribeiro. “Mas é possível transformar esse quadro, com soluções que atendam bem ao público e às empresas, de forma fácil, segura e eficaz”. Na São José Agroindustrial, o serviço não custa nada para o trabalhador, cabendo à companhia o custo de emissão do cartão, cerca de R$ 10 por unidade.
Para Carlos Wizard, a maior revolução da plataforma está na inclusão financeira de uma população que até então estava à margem do sistema bancário brasileiro e das novidades da economia digital. Nos campos do Brasil, há cerca de 4 milhões de propriedades rurais e 18 milhões de trabalhadores. Desse tanto de gente – equivalente a quase duas vezes a população de Portugal –, muitos ainda vivem excluídos do atual sistema financeiro. Não há dados específicos sobre o ambiente rural, mas, de acordo com o Banco Central Brasileiro, 22,2 milhões de pessoas em todo o País ainda não têm um relacionamento bancário. Isso significa 13,7% de todos os habitantes do País. “A nossa ferramenta tem possibilitado a muitos pequenos produtores rurais a sua primeira experiência com serviços financeiros”, diz Wizard. “Eles podem abrir suas contas e até mesmo contrair crédito sem precisar se deslocar, muitas vezes por longas distâncias, até uma agência bancária.” É o mundo digital melhorando e facilitando a vida do homem do campo.