Um caminhão segue pela rodovia a 30 quilômetros por hora num perímetro urbano. A poucos metros de distância à frente dele, um homem distraído atravessa a faixa de pedestres. O caminhão para automaticamente, sem encostar na pessoa. Em outro momento, o mesmo veículo está em disparada, a 70 quilômetros por hora. A colisão é certa com dois carros parados a alguns metros. Novamente, o veículo breca, sem que o motorista mudasse de faixa ou desacelerasse. As cenas descrevem uma sessão de testes de sistemas autônomos feitos pela alemã Mercedes-Benz do Brasil. As tecnologias já estão embarcadas nos veículos fabricados pela montadora e tem tudo para revolucionar essa indústria. “São os primeiros passos para a engenharia de caminhões autônomos no País”, afirma o engenheiro mecânico Roberto Leoncini, vice-presidente de Marketing e Vendas de Caminhões e Ônibus da companhia.

“Nesse momento, algumas decisões já passam ser do próprio veículo.” A companhia, controlada pelo grupo alemão Daimler, fabricante de veículos de passeio, caminhões e ônibus, e que faturou € 164,3 bilhões (R$ 795 bilhões) no ano passado, se soma às demais indústrias, como a italiana Iveco e a sueca Scania, na busca de um veículo cada vez mais seguro e inteligente. “É um novo caminhão que representa uma nova forma de pensar o transporte”, afirma Christopher Podgorski, presidente da Scania para a América Latina. “Além de contar com uma plataforma preparada para o presente e para o futuro.”

O nível de inovação vem crescendo com o próprio desenvolvimento de novos componentes e sensores, em especial, os de detecção de objetos. É essa tecnologia que dando maior poder de decisão aos caminhões da Mercedes-Benz. O sistema Assistente Ativo de Frenagem (ABA, na sigla em inglês), foi lançado em 2013, e está na quarta geração. “Estamos praticamente no meio do caminho para entregar um veículo totalmente autônomo”, diz Leoncini. “Mas ainda resta uma legislação que permita isso e, até agora, não existe nada em tramitação no Congresso.” Se por um lado, no quesito legal não há nada acontecendo. Do outro, na indústria, o movimento é acelerado. Além do sistema inteligente de freios, o caminhão tem um dispositivo que reconhece uma mudança brusca de faixa de rodagem, feita pelo motorista. Alertas luminosos se acendem no painel do veículo e até o um sistema de vibração no banco é acionado para avisar o motorista.

Com três fábricas no País, duas delas concentram uma capacidade produtiva de 83 mil caminhões da Mercedes-Benz: a de São Bernardo do Campo (SP) e a de Juiz de Fora (MG). Este ano, a unidade paulista ganhou uma linha completamente nova de montagem de caminhões. Com um investimento de R$ 500 milhões, a fábrica agora conta com cerca de 60 veículos autônomos para o transporte de peças, 40 monitores de tevê, dispensando o papel na orientação aos montadores, impressoras 3D e, em breve, óculos de realidade aumentada.

“Está nascendo aqui uma das mais modernas fábricas de caminhões do grupo Daimler”, afirma Philipp Schiemer, CEO da Mercedes-Benz do Brasil e para a América Latina. “Tudo isso está programado dentro do investimento de R$ 2,4 bilhões que anunciamos recentemente para os próximos cinco anos, até 2022”.

Tecnologia: para Christopher Podgorski, da Scania, uma nova geração de veículos vai mudar o conceito de transporte (Crédito:divulgação)

A Scania, que também tem levado a seus caminhões tecnologias semelhantes às da Mercedes, atualizou sua fábrica no País, em São Bernardo do Campo, que tem capacidade de montar até 30 mil caminhões por ano. Com um aporte de R$ 2,6 bilhões, a unidade ganhou automação com 75 robôs na linha de montagem, além de uma nova linha de soldagem. É dessa fábrica que são estimados sair 25 mil veículos até o final do ano. “Essa é a nova geração de caminhões que está chegando ao mercado brasileiro”, afirma Silvio Munhoz, diretor comercial da Scania.

“Eles representam uma ruptura do processo de fabricação que tinha até então.” Do conceito ao acabamento, tudo foi pensado para ser diferente. Entre os exemplos está um maior espaço na cabine e itens de segurança como air bag na porta do veículo. Mas a grande inovação da empresa é oferecer, a partir dessa nova geração de caminhões, um sistema de monitoramento constante do veículo. Com um chip instalado, uma equipe da Scania poderá acompanhar desde desvios de rota até padrões de direção perigosa. “Se necessário, um atendente pode entrar em contato com o motorista para saber o que está acontecendo”, diz Munhoz.

Já a Iveco, controlada pelo grupo italiano CNH Industrial, traduz o conceito de segurança e inovação no transporte de cargas numa série de sistemas de frenagem automática. Um dos sistemas está no próprio motor do veículo, que conta com um sistema chamado de freio motor, segundo Ricardo Barion, diretor de marketing e vendas da Iveco para a América Latina. “Esse sistema é acionado quando há uma redução da marcha do veículo”, diz Barion.

Outro sistema é o Intarder, um tipo de freio auxiliar que está acoplado à caixa de câmbio do veículo. Ao todo, o conjunto pode dobrar a vida útil dos freios do veículo. A empresa faturou globalmente US$ 10,7 bilhões no segmento de veículos comerciais, com caminhões e ônibus. No Brasil, para se manter entre as maiores montadoras, a Iveco vem investindo desde o ano passado US$ 120 milhões no desenvolvimento de produtos para o setor de transportes de cargas. A companhia tem capacidade de montar 70 mil caminhões por ano em sua fábrica em Sete Lagoas (MG). É o único centro de engenharia da Iveco fora da Europa.