Montado numa colhedora de grãos, no papel de personagem principal para a realização da foto que abre esta reportagem da série DESAFIO 2050, o produtor gaúcho Alfredo Cristiano Horn, de Nova Mutum, em Mato Grosso, é taxativo: “Nunca pensei que seria famoso”. Segundo ele, jamais passou pela sua cabeça, quando, em 1978, aos 28 anos de idade, ao lado da família, deixou para trás a gaúcha Estrela, que Nova Mutum, encravada no inóspito norte-mato-grossense, um dia se tornaria um dos municípios com melhor Índice de Desenvolvimento humano (IDH) do Brasil. “Vivíamos rodeados de mato e amassávamos muito chão de barro vermelho”, diz Horn. Com um PIB de R$ 1,4 bilhão, o município ocupa a sétima posição no ranking estadual, liderado por Rondonópolis, e a 298ª posição em nível nacional. As crianças que o acompanham na sessão de fotos, filhos e filhas de agricultores que estudam em escolas públicas da cidade, não conheceram a Nova Mutum dos primeiros tempos e provavelmente jamais passarão pelo desafio de construir uma comunidade a partir do nada. “Foi justamente para isso que trabalhamos muito, para que as novas gerações venham mais fortes e sadias”, diz Horn, prestes a completar 64 anos de idade. Ele é o  produtor mais antigo que ainda reside  no município, um dos primeiros a se instalar nas terras agrícolas de Nova Mutum. “Quando chegamos aqui, nunca se imaginava esse progresso  todo que temos hoje”, diz. De  fato, rodeada de instalações de gigantes do agronegócio, que utilizam as mais modernas tecnologias, como a BRFoods, Cargill, Bunge e Amaggi, Nova Mutum é bem diferente de 26 anos atrás, quando obteve a emancipação política do município de Diamantina, época em que uma ligação telefônica era um luxo, e exigia uma viagem de 200 quilômetros até o aparelho mais próximo, em Rosário do Oeste, nas cercanias da capital Cuiabá.

Foi o agronegócio que transformou o município na potência agrícola de hoje, dona da terceira maior área cultivada de soja do Brasil, com  338 mil hectares, e a oitava maior de milho, com 90 mil hectares. No  entanto, o progresso de Nova Mutum, diretamente relacionado com sua origem agropecuária, não é um caso isolado no Brasil, segundo aponta um estudo inédito realizado pela consultoria Kleffmann, de Valinhos SP), divulgado no mês passado. A  consultoria avaliou os dados de 100 cidades que no período de 40 anos, entre 1991 e 2010, tiveram uma melhora do IDH acima dos 76%. Pelo estudo, cidades que nesse período basearam sua economia principalmente nas culturas de soja, algodão, cana-de-açúcar e milho cresceram em IDH mais que as cidades não agrícolas. É o caso de municípios como Sapezal também em Mato Grosso, e São Desidério, na Bahia, que, assim como Nova Mutum, viram seus IDHs alcançarem um crescimento na faixa de 115%. Enquanto isso, a média nacional das localidades não agrícolas foi de 57%. “Os dados mostram que a sociedade foi influenciada, com ganhos na qualidade de vida”, afirma Horn. “Tenho orgulho de ter colaborado com isso.” Com uma população estimada em 40 mil habitantes, Nova Mutum arrecada R$ 87 milhões por ano, de acordo com a prefeitura do município.

O desenvolvimento da região aconteceu graças aos esforços de agricultores como Horn. Assim como outros gaúchos que saíram do Sul do País para fazer a vida no Centro-Oeste, o produtor se valeu da experiência no cultivo de soja e arroz em sua terra natal para acertar o passo. “Quando cheguei aqui já sabia como cuidar dos grãos”, diz Horn. Por isso, enquanto seus vizinhos menos experientes tiravam a média de 18  sacas de 60 quilos de soja por hectare, ele já conseguia colher 52 sacas. “Como produzia bem, a soja alavancou os nossos negócios e o desenvolvimento do município atraiu outros produtores”, afirma Horn. O advogado e hoje agricultor Fábio Luiz Tissiani é um desses casos de paixão pelo campo. Em 1997, Tissiani decidiu abandonar o terno e a gravata para realizar o grande sonho de ser fazendeiro. Atualmente, em sua propriedade de 600 hectares, ele produz soja na safra e milho na safrinha usando 100% da área. Segundo ele, o uso de tecnologia tem sido primordial nessa evolução. Tissiani cita como exemplo a eficiência alcançada no cultivo das duas safras de sua fazenda. A despeito das margens estreitas de lucro nesta safra, o milho ajuda a diluir o custo total de produção, além de estimular o comércio local. “O agricultor virou um grande empreendedor. Hoje somos propulsores da economia da nossa região”, diz.

A pesquisa da Kleffmann revela, ainda, que entre os 100 países líderes em IDH no ranking da Organização das Nações Unidas (ONU), o Brasil é o mais desigual,  sobretudo pela má distribuição de renda e pelo baixo investimento em educação. Na contramão dessas informações, as cidades agrícolas foram as que mais cresceram no ranking de escolaridade nos últimos 30 anos. Isso justifica o baixo nível de analfabetismo de Nova Mutum, já que, segundo o prefeito do município, Adriano Pivetta, a educação é o foco da atual gestão. “O nosso objetivo é formar e capacitar os jovens para o mercado de trabalho”, diz Pivetta.

De acordo com a secretária de Educação, Elena Maria Maass, Nova Mutum conta com 19 escolas com cerca de dez mil alunos matriculados. Atualmente, o grande desafio da gestão municipal é a educação continuada, para formar e atender à demanda agroindustrial que não para de crescer. O município forma por ano cerca de 200 técnicos. “Temos parceria com o Senai e oferecemos cursos de agronomia”, diz. “Queremos dar estrutura para que os jovens não migrem do município.” 

A melhoria de qualidade de vida alavancada pelo agronegócio em Nova Mutum também se destaca pelo investimento no setor público de saúde. Atualmente, o município está implantando um sistema online na internet para unificar os dados da população que passa por consultórios médicos, laboratórios, farmácias  e hospitais. Segundo o secretário da Saúde João Batista, o objetivo  dessa unificação é acabar com as filas nas unidades de saúde. “Em breve, teremos todo nosso sistema interligado, com cadastramento de 100% dos pacientes através de um prontuários totalmente eletrônicos”, diz.

Além dos pequenos municípios, o estudo da Kleffmann  traz ainda em sua lista com as 100 cidades brasileiras que mais registram  crescimento no IDH aquelas de regiões de médio e  grande porte, como é o caso de Maringá, no Paraná. Com 385 mil habitantes, a cidade paranaense
também é predominantemente agrícola e focada no pequeno e médico produtor, apesar de contar com várias indústrias e um setor forte de serviços. No caso do município, as cooperativas da região têm um peso grande como mola propulsora dos negócios no campo. Por conta disso, Maringá também está bem ranqueada no IDH , na 23ª posição entre todas as cidades do País.