Provar uma xícara do Peneira 19, mais recente lançamento da empresa paulista Café do Centro, é difícil de descrever. Imagine uma bebida encorpada, com aroma e sabor pronunciados, sem acidez e com retrogosto agradável. À medida que é saboreada – sem açúcar nem adoçante, claro –, mesmo quem não tem um paladar apurado consegue perceber variações da textura e do aroma. “O Peneira 19 é produzido apenas com os maiores grãos de uma variedade do café arábica, chamada catuaí amarelo”, diz Rodrigo Branco Peres, sócio da Café do Centro. “Conseguimos essa qualidade em um lote do nosso cafezal, onde o solo permite obter um produto menos ácido”, afirma. Essa sofisticação tem custo. Um pacote de 250 gramas do Peneira 19, vendido em grãos, pode custar o dobro de outro café não moído de grife. Na comparação com o produto torrado e moído encontrado nas gôndolas de supermercados, o total a pagar pode ser até dez vezes maior. Esse fator limita o mercado, mas isso não chega a preocupar o empresário. “A produção do Peneira 19 representa menos de 1% do nosso total, e nunca será um produto de massa”, diz Peres.

O preço mais amargo tampouco deverá assustar os consumidores mais abonados. Produtos como o Peneira 19, lançado no início de fevereiro em alguns restaurantes de alto padrão de São Paulo, e que será oferecido em cafeterias gourmet, são a face mais vistosa de um movimento que começou há pouco mais de dez anos e vem ganhando corpo, o dos cafés premium. São variedades do grão com sabor e aroma diferenciados que buscam atrair o consumidor pela exclusividade e reproduzem, duas décadas mais tarde, o que ocorreu no mercado brasileiro de vinhos. “Em todo o mundo, o consumidor está disposto a pagar mais caro por um produto diferenciado”, afirmou, em janeiro, o empresário italiano Andrea Illy, presidente da empresa que leva seu sobrenome. Até alguns anos atrás, o cafezinho que o brasileiro tomava ao fim da refeição ou no meio da tarde dividia-se em com ou sem açúcar. Atualmente, multiplicam-se os cursos de formação de baristas, as principais fabricantes de máquinas de café contam com representantes no Brasil e discussões sobre região de origem e grau de torrefação do produto vão além dos provadores profissionais.

A sofisticação afeta positivamente o bolso do produtor. Comparados aos vinhos finos, os grãos premium têm sido leiloados por valores três vezes superiores aos preços de mercado, avalia John Forsyth, porta-voz da empresa britânica de pesquisas de mercado Mintel. “Os baristas e as cafeterias independentes da moda estão influenciando o que as pessoas bebem”, diz ele. “Assim como ocorre no caso do vinho, esse consumidor quer conhecer o ‘terroir’ do café, as características geográficas, geológicas e climáticas do lugar de cultivo do grão.” Por isso, apesar do clima adverso, quem produz café diferenciado não se queixa. As temperaturas elevadas e as chuvas escassas em janeiro elevaram os preços do café. Um estudo do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea), ligado à Universidade de São Paulo, mostra que, desde o início de 2014, as cotações do café arábica tipo seis subiram 30%, atingindo R$ 369,79 por saca de 60 quilos. Somente em fevereiro, segundo o Cepea, a valorização chegou a 22%. Já em Nova York, o contrato de arábica com vencimento em maio (o mais negociado) chegou a 154,85 centavos de dólar por libra-peso em meados de fevereiro, o maior valor desde janeiro de 2013.

Peres acredita que os cafés brasileiros de primeira linha logo encontrarão espaço nos mercados internacionais, concorrendo de igual para a igual com os competidores colombianos, africanos e centro-americanos. Em breve, o Peneira 19 será exportado para as oito lojas que a Café do Centro mantém no Japão. “Servimos 230 mil xícaras por mês e queremos aumentar esse volume oferecendo produtos de maior valor agregado”, afirma Rafael Branco Peres, o outro sócio da empresa. “O Japão é o terceiro maior consumidor do mundo, mas o primeiro em cafés premium, e é a porta de entrada para a Ásia.”