Depois de quase um século, uma ilustre moradora que havia abandonado o Rio de Janeiro está de volta à cidade. Uma onça-parda (Puma concolor) foi registrada pela câmara de segurança do Sítio Burle Marx, em Guaratiba, na zona oeste. Confirmado por um grupo de biólogos da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), o ressurgimento do felino em florestas dentro do segundo maior município do País é um indicador de que as políticas de preservação e reflorestamento da Mata Atlântica estão funcionando.

Conhecida pelo seu nome em tupi, a suçuarana – também chamada de leão da montanha e leão-baio – é classificada como espécie vulnerável pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio). É considerada oficialmente extinta no Rio de Janeiro, de acordo com a Lista Municipal de Espécies da Flora e Fauna Ameaçadas (2000). Os últimos registros oficiais da presença do animal na cidade são da década de 1930. A boa notícia sobre o seu retorno foi oficializada em estudo publicado no jornal científico Check List em 28 de setembro.

Em junho do ano passado, uma câmera de vigilância do Sítio Burle Marx captou por acaso a imagem da onça, que não era observada havia mais de 80 anos. Com a comprovação de que se tratava mesmo da desaparecida suçuarana, biólogos começaram a buscar registros da passagem do felino por outros lugares.

PEGADAS E ARRANHÕES

Os especialistas conseguiram reunir moldes de pegadas e de arranhões deixados em árvores, indicando a presença da onça-parda no Parque Estadual do Mendanha, no Parque Estadual da Pedra Branca e na Reserva Biológica de Guaratiba, na zona oeste da cidade, próximos do sítio. “A partir daquela imagem, fomos reunindo mais dados que comprovassem o reaparecimento definitivo da espécie, não só um indivíduo vagando pela região”, diz o biólogo Jorge Pontes, um dos autores do trabalho e professor de Pós-Graduação em Ensino de Ciências, Ambiente e Sociedade da UERJ.

“Conseguimos comprovar que a onça-parda está realmente no município, não são ocorrências isoladas”, diz ele. “Temos registros feitos mais ou menos na mesma época em lugares diferentes. Não devem ser muitas, mas não dá para estimar quantas seriam; qualquer número seria um chute.”

Há uma semana, um aluno de Pontes conseguiu uma nova imagem que acredita ser da onça-parda, mas o vídeo ainda está em análise.

“O bicho passa muito rapidamente na frente da câmera”, explica o biólogo. “Mas, pelo porte e o movimento, acreditamos que seja a onça-parda.” Outro dado importante é que o grupo de Pontes registrou no ano passado, na mesma região, a presença do porco do mato ou cateto (Tayassu tajacu). Esse animal, que serve de alimento à suçuarana, também era dado como extinto no Rio.

SEGUNDO MAIOR FELINO

Mamífero terrestre com a mais ampla distribuição geográfica no Ocidente, a onça-parda é o segundo maior felino do País. Em tamanho, fica somente atrás da onça-pintada. A espécie está presente em áreas que vão desde a Columbia Britânica, no Canadá, até o extremo sul do Chile. Habita tanto florestas densas quanto áreas desérticas.

No Brasil, a suçuarana está presente na Amazônia, no Cerrado, no Pantanal e na Mata Atlântica. De acordo com especialistas, ela é capaz de sobreviver até mesmo em áreas extremamente alteradas pelo homem.

Ainda assim, a extrema fragmentação da Mata Atlântica no Rio de Janeiro e a ação de caçadores acabaram levando ao desaparecimento da espécie no município.

MAMÍFERO AMEAÇADO

No artigo, os autores reforçam a importância da conservação da onça e de outros mamíferos ameaçados no Rio. Para isso, eles defendem a criação de políticas públicas voltadas para essas espécies, incluindo manejo adequado e vigilância dos animais.

“A importância de termos um animal desse porte, um predador de alto de cadeia alimentar, é que a sua presença indica que ainda temos condições de sustentar esse felino, de que ainda temos uma fauna residual de importância”, explica Pontes.

Os especialistas garantem que não há risco de ataque da onça-parda a seres humanos. A suçuarana é muito tímida: sua tendência natural é fugir quando vê alguém.

DESMATAMENTO ZERO

Segundo o presidente do Instituto Estadual do Ambiente (INEA), Philipe Campello, há dez anos o Estado do Rio tem conseguido manter uma taxa de desmatamento zero (quando são destruídos menos de 100 hectares de floresta por ano). “Quando conseguimos preservar, temos um aumento populacional de indivíduos. E temos tido muitos avistamentos de onça em outros parques estaduais também.”

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.