LUTA AGORA É PELA INDENIZAÇÃO: Genor Facchio teme ficar sem terra e sem dinheiro

No dia 30 de abril venceu o prazo concedido pelo Supremo Tribunal Federal para que os produtores de arroz saíssem da reserva indígena Raposa-Serra do Sol, em Roraima. Conformada, a maioria deixou a região. Mas agora começa uma outra guerra, não mais pelas terras, mas sim pelas indenizações das benfeitorias deixadas no local. E quem tem de pagar a conta é a Funai. O problema principal está no cálculo, que, segundo os arrozeiros, parece muito abaixo do preço real de mercado. Para completar a confusão, os produtores ainda correm o risco de ser multados por danos ambientais e sair sem um real sequer no bolso.

Considerado o líder dos rizicultores locais, Paulo César Quartiero é um dos mais indignados com a situação. “Eles avaliaram as benfeitorias feitas nas minhas propriedades em R$ 2,7 milhões, mas, nas minhas contas, este valor ultrapassa os R$ 50 milhões”, conta ele, que diz ter gasto quase R$ 2 milhões só para retirar suas máquinas agrícolas de dentro da reserva. “Agora estão querendo arrumar alguma multa ambiental porque, se isso acontecer, não vão precisar me pagar nada e ainda saio devendo para eles”, continua.

Por outro lado, o presidente da Funai, Márcio Meira, já afirmou que dificilmente os arrozeiros terão sucesso caso questionem os valores das indenizações na Justiça. “Vamos pagar apenas pelas benfeitorias feitas antes da demarcação da reserva. Tudo o que fizeram depois, e não foi pouca coisa, foi de má-fé e não será levado em conta pela Justiça”, garante Meira.

TRAIDOR DA CAUSA: segundo os produtores, o governador Anchieta Júnior apenas os usava

O bate-boca, pelo que se percebe, está longe do fim. Até o governo do Estado de Roraima, que antes se dizia a favor dos produtores, mudou de lado. Entrevistado por DINHEIRO RURAL há menos de um ano, o governador Anchieta Júnior afirmou que a demarcação da reserva em área contínua ia contra os interesses da população. No entanto, pouco fez para influenciar a decisão do STF (já que não tinha poder para descumprir esta decisão). Segundo Quartiero, Anchieta Júnior apenas usava os arrozeiros para negociar outras questões com o governo federal. Por estas e outras, os produtores temem sair desta briga com as mãos abanando, como já aconteceu anteriormente, não muito longe dali.

“Com os produtores da reserva São Marcos aconteceu a mesma coisa. Eles foram retirados há mais de seis anos e até hoje não viram a cor do dinheiro”, confirma Genor Facchio, um dos mais antigos rizicultores da região. “O Ibama está louco para arrumar alguma multa por danos ambientais na minha fazenda. Assim não precisam nem me indenizar”, conta. Segundo o produtor, a Funai já estipulou sua indenização em pouco mais de R$ 1 milhão, bem aquém dos R$ 15 milhões gastos em benfeitorias nas últimas décadas.

Insatisfeitos, os fazendeiros prometem ir à Justiça para resolver a questão, uma vez que terão que recomeçar suas atividades do zero e precisarão de dinheiro para isso. “Os valores das indenizações estão fora da realidade e vão ter que ser discutidos. Não é a Funai que determina os valores que devem ser pagos, mas sim a Justiça”, diz Luiz Valdemar Albrecht, advogado dos fazendeiros.

“Agora eles estão querendo nos multar por danos ambientais. Assim não precisam nem nos pagar” PAULO CÉSAR QUARTIERO, líder dos arrozeiros de Roraima

A decisão do Supremo Tribunal Federal de mandar retirar os produtores de arroz da Raposa-Serra do Sol pode interferir inclusive no futuro do agronegócio brasileiro, uma vez que existem hoje 22 processos semelhantes, sobre demarcação de terras indígenas, em andamento no Brasil. Caso os critérios sejam mantidos, muitos outros produtores rurais poderão ter o mesmo fim dos arrozeiros de Roraima. Por isso, eles pedem apoio.

“Esta medida pode influenciar o futuro do Brasil, pois abrimos um precedente perigoso. Outras pessoas também poderão perder suas terras em breve. Não podemos mais ficar nas mãos do tridente do diabo”, completa Paulo César Quartiero, em referência clara ao Ibama, ao Incra e à Funai.

Com a saída dos produtores de arroz, a região, uma das mais produtivas do Brasil, deixará de colocar no mercado cerca de 320 mil toneladas por ano, o que fatalmente causará um aumento nos preços do produto na região Norte. Os índios, por sua vez, já deixaram claro que, mesmo com toda a estrutura pronta, não pretendem manter o cultivo de arroz na reserva. A lição que tiramos desta história é que se por um lado o governo acha que resolveu uma importante questão indígena, por outro pode ter aumentado o efetivo dos semterra no País. Lamentável.