A Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) manteve a decisão de destinar toda a faixa de 6 gigahertz (GHz) para o uso de Wi-Fi. O processo já havia sido aprovado em maio, mas as operadoras haviam entrado com recurso e pediram para que metade da frequência fosse reservada para outros fins.

Em seu voto, o relator, conselheiro Emmanoel Campelo, não acatou o pedido. Ele propôs abertura de consulta pública por 45 dias para discutir as especificações técnicas para o uso da faixa, como potência radiada e densidade espectral. Depois disso, a Anatel poderá homologar os equipamentos para uso do Wi-Fi 6E, como celulares e computadores.

O conselheiro citou estudos da Cisco que mostram que o Wi-Fi será responsável pelo offload de 71% dos dados do 5G em 2023. No Brasil, segundo esse estudo, o número de dispositivos conectados às redes crescerá 50% de 2018 a 2023, para 755 milhões. Em 2023, a empresa estima que o Brasil terá 23,8 milhões de hotspots, um aumento de 500% em relação a 2018.

“Precisamos reconhecer que a pandemia gerou mudanças nos hábitos dos consumidores, com aumento do consumo de conteúdo de streaming como forma alternativa de lazer e a massiva adoção de modelos de teletrabalho e educação à distância. Isso aumentou o tráfego de dados e transferiu parcela das redes móveis para as redes locais sem fio”, disse. “As redes Wi-Fi se mostram cada vez mais essenciais às comunicações no Brasil e no mundo, seja por sua capacidade, custo-benefício e versatilidade”, acrescentou.

O uso da faixa foi alvo de disputa na Anatel. De um lado, estavam as operadoras Claro, TIM e Vivo, que pediam para que metade da faixa fosse reservada para outros fins. De outro, estavam 19 pequenos provedores, fornecedores, empresas de tecnologia, associações e até a Oi, que se uniram através da Coalizão Wi-Fi 6E.

O espectro de 6 GHz é considerado auxiliar do 5G. Quando os consumidores chegarem em suas casas, em vez das redes 5G das operadoras, eles usarão a internet que contrataram para uso residencial. O Wi-Fi 6E (em inglês, o “e” vem de enhanced, ou seja, melhorado) promete alta velocidade e baixa latência.

A expectativa é que não haja diferença entre as experiências outdoor e indoor para o usuário final. A faixa tem um total de 1.200 MHz, que pode ser dividido em sete canais de 160 MHz – como se fosse uma rodovia com sete pistas.

A definição da Anatel seguiu a da Federal Communications Comission (FCC), órgão regulador dos EUA, que também aprovou o uso de toda a faixa para o Wi-Fi 6E, mesmo caminho escolhido pela Coreia do Sul e Chile. Na Europa, a decisão da World Radiocommunication Conferences (WRC) deve sair em 2023, mas para as Américas, a perspectiva é até 2027 – as operadoras queriam que a Anatel aguardasse essa discussão.

“Embora entenda que as proposições alinhadas ao arranjo europeu não necessariamente busquem a reforma da decisão (da Anatel), mas o sobrestamento e o estabelecimento das condições de uso da faixa de 6 GHz, considero que tal paralisação se mostraria injustificada, pois poderia impor a necessidade de aguardar até 2027 sem qualquer sinalização em âmbito internacional afeto às Américas”, afirmou.

É a primeira vez em mais 20 anos que uma faixa é liberada para Wi-Fi no mundo. As atuais, de 2.4 GHz e de 5 GHz, foram destinadas para o Wi-Fi em 1999 e estão sobrecarregadas. Quem vive em apartamento sabe disso: quando busca uma rede, encontra também as de seus vizinhos. Por causa desse congestionamento, quando um consumidor contrata um pacote de internet de 200 mega, o roteador de Wi-Fi oferece uma velocidade bem inferior. É como se fosse um funil: muito sinal para pouca vazão.

Com a manutenção da decisão, a Anatel atendeu ao pedido dos pequenos provedores, que, em conjunto, são líderes no fornecimento de banda larga fixa residencial, com 30% de participação, e buscam aumentar essa presença com o Wi-Fi 6E a partir de 2021. Os fabricantes afirmam que os chips para essa tecnologia já estão prontos.