Produzir cafés de qualidade sempre foi o objetivo de Thiago Veloso da Motta santos, dono da fazenda Jatobá, com 26 hectares, herdada de sua avó materna, no município de Patrocínio, na região do Cerrado de Minas gerais. sem ter grande escala, com uma produção limitada a 1,3 mil sacas por ano, o cafeicultor apostou na exportação de grãos de alta qualidade para ganhar mais dinheiro. no entanto, com as cotações internacionais em baixa, nem o prêmio financeiro recebido pela qualidade do grão garantiu as margens de lucro do produtor. A saída para não ter de deixar a cultura e perder todo o investimento foi criar uma marca própria de café especial, agregar mais valor à sua produção e, de quebra, atender à crescente demanda brasileira pela bebida de qualidade. “Percebi que os consumidores brasileiros estavam comprando cafés gourmet importados”, diz Santos. “Então resolvi atender diretamente esse público.”

Até aqui, pelo menos, tudo indica que santos fez a aposta certa, comprovada pelo desempenho do consumo de cafés gourmet no Brasil, que vem crescendo anualmente 15%, desde 2010, contra uma taxa de apenas 3% dos cafés tradicionais, segundo a Associação Brasileira da Indústria de Café (ABIC). Com isso, santos resolveu investir em uma marca própria, a sollo Café. Comercializada inicialmente em Brasília, onde a marca se tornou conhecida pelos apreciadores de cafés gourmet ao conquistar prêmios e reconhecimento. Em 2009, ficou em segundo lugar no Campeonato do Centro-oeste de Cafés para Baristas, promovido pela Associação Brasileira de Café e Barista (ACBB). No mesmo ano, foi classificado entre os cinco melhores cafés do Brasil pelo Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola (IMAFLORA). E ficou em terceiro lugar no concurso Melhor Café de Minas Gerais, promovido pela Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (EMATER), na categoria natural, em 2010. “Com isso, passei a faturar 30% a mais com meu café”, diz Santos.

Da produção total, o produtor separa 240 quilos por ano e envia para uma torrefadora da região de Patrocínio, que, além de torrar o grão para cafés expressos, também transforma uma parte em pó, para o café solúvel. Ter uma torrefação própria ainda não está nos planos do engenheiro agrônomo, que pretende fechar parcerias com empresas de São Paulo e Curitiba para posicionar sua marca nesses dois mercados importantes para cafés especiais. Para isso, ele já começou a prospectar vendas em cafeterias nas duas capitais. “Meu café possui muitos certificados, o que acaba agregando ainda mais valor”, diz. A mais importante delas é a certificação de indicação geográfica e denominação de origem da região do Cerrado Mineiro, que garante aos cafés da região um selo de identificação.

Reconhecido mais pela qualidade do seu café do que pela quantidade produzida, o Cerrado Mineiro é considerado a “Colômbia brasileira” dos cafés especiais. Atualmente, a região produz seis milhões de sacas por ano, o equivalente a 12% da produção total brasileira, estimada em 50 milhões de sacas. E assim como a fazenda Jatobá, a região também exporta com o selo da marca Cerrado Mineiro grande parte de sua produção, em busca de valores melhores. Segundo Juliano Tarabal, diretor de marketing da Federação dos Cafeicultores do Cerrado Mineiro, com sede em Patrocínio, a industrialização do próprio café é uma tendência local.

Para ele, atualmente a exportação não estimula os produtores, que recebem pelo café um adicional de apenas 5%, em relação ao preço de R$ 250 pago pela saca de grão verde comum, que nem sequer paga o custo de produção de R$ 300. “O valor atual não cobre os custos médios da região”, diz Tarabal. “Um café de qualidade deveria valer bem mais.” Com isso alguns produtores e cooperativas da região tiveram a ideia de investir em marcas próprias para agregar mais valor ao grão. Nas gôndolas dos mercados, um café gourmet importado chega a custar até 200% a mais do que o café comum. essa diferença pode ficar ainda maior se o consumidor optar por uma xícara da bebida em uma cafeteria.

De acordo com Marcos Geraldo Alves da Silva, analista do SEBRAE Minas, parceiro dos produtores nesse processo de criação das marcas próprias, a produção de café na região ainda é bem recente, datando dos anos 1970. Apesar do pouco tempo de cultivo, a lavoura do Cerrado Mineiro apresenta um desempenho superior ao das mais antigas, de São Paulo, Paraná e do sul de Minas. A produtividade média dos cafezais da região é de 40 sacas por hectare, enquanto a média brasileira está em torno de 24 sacas. “Esses resultados comprovam que apostamos certo na parceria com o Cerrado Mineiro”, diz Alves da Silva.

Apesar do desenvolvimento no campo, o movimento pela industrialização do café premium regional é ainda muito recente. Muitos produtores estão terceirizando a torra e o envasamento, a exemplo da Fazenda Jatobá. Esse também é o caso da Central de Cooperativas dos Cafeicultores do Cerrado (Expocaccer), fundada em 1993, em Patrocínio. A Expocaccer já possui a marca própria Dulcerrado, criada, em 2007, distribuída como amostra para os importadores. Segundo Sérgio Geraldo Dornellas da Silva, superintendente da Expocaccer, do 1,2 milhão de sacas de café recebidas por ano pela cooperativa, apenas 400 quilos são destinados à industrialização em torrefadoras de terceiros em São Paulo e Minas Gerais. “Há muitas torrefadoras com capacidade ociosa. Antes de arriscar construir uma própria aqui, vamos ver como o produto se sairá no mercado”, diz Silva. Uma das estratégias para medir a aceitação de seu café entre os consumidores brasileiros é montar uma cafeteria na cidade. “Muitos visitantes e compradores vêm até Patrocínio conhecer a cooperativa, mas não conseguem provar do nosso café”, diz. A ideia é que até o início de 2014 a cafeteria, que contará com uma minitorrefadora e uma máquina empacotadora, esteja funcionando. Se tudo caminhar conforme o planejado com a cafeteria, além de investir em uma torrefadora maior, a cooperativa lançará franquias de sua casa de café pelo País. Atualmente, a cooperativa conta com 470 associados, sendo que cinco deles já possuem marcas próprias de café.

Dos 4,5 mil produtores de café da região do Cerrado Mineiro, um dos poucos que já planejaram instalar uma torrefadora própria é Jorge Fernando Naimeg, do grupo Naimeg, sediado em Patos de Minas. As quatro fazendas, que cultivam 600 hectares de cafezais, são responsáveis por uma produção de 20 mil sacas por ano, das quais 30% são destinadas ao mercado interno. A torrefadora, que deve começar a operar até o final do segundo semestre de 2014, terá capacidade para processar duas toneladas do produto por ano e contará com investimentos de?R$ 300 mil para ser implantada. “Queremos atender as cafeterias do Brasil com nosso café”, diz Naimeg. “E, de quebra, chamar ainda mais a atenção do mercado externo para a qualidade do nosso café verde.”