UM SONHO EM COMUM: Rosana e Omizzolo se conheceram no trabalho e se apaixonaram por causa do vinho

Contar a saga de Gladistão Omizzolo, 58 anos, e Rosana Wagner, 45, é mergulhar no mundo do vinho. Enólogos, juntos eles acumulam nada menos que 60 anos de experiência com a bebida. Inclusive, foi por meio dela que os dois se conheceram. Casados há cinco anos, eles trabalharam juntos por 13 anos na Pernod Richard. Mas o sonho que uniu o casal surgiu por ocasião da aposentadoria de Omizzolo. Ele não conseguia se ver longe deste universo e resolveu investir os recursos acumulados nos anos como executivo em uma vinícola. “Na verdade, unimos o útil ao agradável. Vinho é o que sabemos fazer de melhor e também procurávamos qualidade de vida”, conta Rosana, que pediu demissão do emprego e se juntou a Omizzolo na realização do sonho. Para isso, eles investiram US$ 1,5 milhão no empreendimento que deu origem à vinícola Cordilheira de Sant’Ana.

MARCA REGISTRADA: o cerro de Palomas, ao lado, é o sîmbolo da região que tem o terroir ideal para vinhos finos

Ao contrário da maioria das vinícolas do Rio Grande do Sul, que surgiram em função de vinhedos familiares, o casal foi atrás de informações que lhes garantissem a escolha do local certo. Encontraram estudos agroclimáticos da Universidade de Davis, na Califórnia, em parceria com a Universidade Federal de Pelotas e técnicos da Secretaria de Agricultura do Rio Grande do Sul que indicavam a região da Campanha Gaúcha, na fronteira com o Uruguai, como a ideal para a produção de vinhos finos. Com base na descoberta, em 1999, Rosana e Omizzolo escolheram Palomas, subdistrito do município de Santana do Livramento, para iniciar a empreitada. O motivo foi o terroir do local, ou seja, condições climáticas e de solo ideais para o plantio. Em Palomas, o número de horas de frio abaixo de 7ºC é em torno de 380 horas/ano, o que favorece a produção de polifenóis, os taninos responsáveis pela cor e pelo corpo do vinho. A precipitação pluviométrica também é na medida certa e o solo arenoso permite às videiras aprofundarem as raízes em busca nutrientes. “A condição de Santana do Livramento é excelente, principalmente por causa da insolação no período final de maturação das uvas, o que resulta em uma ótima quantidade de açúcar que se reflete em alto teor alcoólico”, diz Roselaine Neves Bonow, engenheira agrônoma e professora da PUC-RS, campus de Uruguaiana.

US$ 1,54 milhão foi o valor investido pelo casal para a construção da vinícola de Sant’ Ana, que já conta com cinco rótulos, vendidos em média a R$ 42 a garrafa. O tempo previsto para o retorno do investimento é de dez anos

Este conjunto de fatores levou o casal a comprar 46 hectares de terra no local e começar o plantio das cepas, que hoje abrangem 24 hectares. “Por conta do meu trabalho, eu já sabia quais eram as melhores uvas para a região”, diz Rosana. Nas uvas brancas, as castas escolhidas foram chardonnay, gewurztraminer e sauvignon blanc. Nas tintas, a cabernet sauvignon, merlot e tannat. A forma de plantio escolhida foi em espaldeiras, em que as árvores são plantadas com três metros de distância umas das outras e a 1,20 metro do chão, facilitando a exposição solar. Como o foco é qualidade, a produtividade não é alta, apenas quatro a cinco toneladas por hectare. E são feitas podas periódicas para favorecer o amadurecimento. Há ainda o raleio dos cachos, que pode tirar até 20% da produção. O procedimento é necessário para a qualidade do vinho. Se o vinhedo fica carregado, as uvas não amadurecem uniformemente, o que interfere na bebida. Quando se aproxima a colheita, são feitas análises em laboratório para verificar se a uva está com PH e acidez corretos. Se confirmado, a colheita se inicia. Na seqüência, começa a vinificação, que o casal acompanha detalhe por detalhe. “Acordamos de madrugada e vamos ver como está a fermentação”, conta Rosana.

Com tanques e equipamentos de aço inoxidável, a adega tem capacidade de estocar até 155 mil litros e possui barris de carvalho e uma cave para envelhecimento dos vinhos, que chegam ao mercado por um preço médio de R$ 42. Dessa forma, Rosana e Omizzolo, que lançaram o primeiro vinho no final de 2005, alcançaram a meta estabelecida: mostrar que é possível fazer um bom vinho sem adicionar açúcar. Indagado sobre qual deles aprecia mais, o enólogo não titubeia. “Vinho é que nem filho. Cada um é de um jeito, mas você gosta de todos”, diz. O casal prevê o retorno do investimento dentro de dez anos. Enquanto isso, querem começar a cultivar a uva pinot noir e pensam em fazer uma cave para espumante, pelo método de fermentação na garrafa. Pelo visto, o sonho vai longe…