Quem passa pela rua Canário, na esquina com a avenida Macuco, em Moema, em São Paulo, e ainda não conhece, certamente vai se surpreender ao descobrir que um negócio situado no número 786 não é uma casa de shows e sim uma casa de carnes. O sobrado de fachada preta e paredes rústicas, na qual a música ambiente tem clássicos do rock como Beatles e Elvis Presley, em nada lembra os tradicionais açougues de azulejos brancos e peças inteiras de carnes penduradas e expostas em balcões. O Empório No Ponto, inaugurado em 2012, comercializa uma variedade de produtos que, vão de cortes premium, como o kobe beef, oriundo da raça japonesa wagyu, que custam ao redor de R$ 500 o quilo, até cervejas artesanais, vinhos e utensílios domésticos.

Para a empresária Natália Regina Dragoni da Costa, uma das proprietárias do Empório No Ponto, a busca por produtos diferenciados está acontecendo porque a carne gourmet caiu definitivamente no gosto do consumidor brasileiro. A casa oferece 20 cortes especiais de bovinos, além de frango, peixes, frutos do mar e carnes exóticas, como de javali. “Como apreciadores de carne, criamos um canal de venda diferente daqueles que estávamos acostumados a freqüentar”, diz Natália. “A ideia é buscar por novas experiências de sabor e sensação de qualidade dos produtos.” Natália tem como sócios os economistas Danilo Simões Jorge, que administra a loja e Guilherme Nastari, diretor da consultoria Datagro, que entrou no projeto como investidor.

O Empório No Ponto segue uma tendência de modernização na venda de carnes, na esteira de um movimento  consolidado na Europa e em países como os Estados Unidos, Canadá e Austrália. No Brasil, cada vez mais empresários e produtores têm se mostrado dispostos a atender consumidores que  pagam um preço mais alto por produtos antes disponíveis apenas em  churrascaria de primeira linha, como a Rubayat, do pecuarista e empresário Belarmino Iglesias, presente em São Paulo, Brasília e Rio de Janeiro, e filiais no México, Espanha e Argentina.

Estimulados pela demanda, os donos do Empório No Ponto, que no ano passado inauguraram sua segunda loja em Alphaville, na Grande São Paulo, já se preparam para uma terceira na Zona Leste da capital paulista. Para o agrônomo Roberto Barcellos, da consultoria Beef & Veal, que há 15 anos presta serviços para marcas de carne, indústria frigorífica, supermercados e produtores, a abertura dessas lojas estão consolidando a formação de um novo tipo de consumidor no País. “São pessoas que já se tornaram seletivas, há alguns anos, quando passaram a comprar com mais frequência vinhos, cafés e cervejas especiais, e que agora querem carne de qualidade”, diz Barcellos. “Para atender esse consumidor mais exigente, é necessário que, além do varejo e dos restaurantes, também os pecuaristas se preparem.”


Da fazendoa ao cliente:o empresário Pedro Merola, dono da casa de carne Feed, produz a propria carne que comercializa em seu estabelecimento

Barcellos dá como exemplo a Feed, também de São Paulo, inaugurada no ano passado, e que pertence ao pecuarista Pedro Merola, CEO da fazenda Santa Fé, localizada em Santa Helena de Goiás (GO). Merola é um dos principais confinadores nacionais de gado, com a previsão de abater 100 mil animais neste ano. Para a casa de carnes, um imóvel de 350 m2 que abriga empório gastronômico, lounge e espaço para degustações e aulas de culinária, são destinados 400 animais por mês e oferecidas 60 opções de cortes nobres, adquiridos por uma clientela de cerca de quatro mil pessoas. Merola diz ter investido R$ 5 milhões no empreendimento. “Criamos um projeto que tem o consumidor como nosso foco na tomada de decisões.” , diz Merola.

Para ele, o grande desafio é desmistificar o conceito de que somente a picanha pode ser uma referência de qualidade.  “Há qualidade até no acém, corte que o consumidor identifica como carne de segunda”, afirma Merola. “Isso ocorre por falta de conhecimento no preparo.” Na desmontagem de um boi é uma questão de sobrevivência para os frigoríficos, e também para os produtores que se aventuram nesse mercado, vender todos os cortes possíveis de uma carcaça bovina. Segundo o Catálogo Brasileiro de Cortes, publicado pela Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carne, eles podem chegar a 90 tipos, entre carnes e miúdos. Há pouco mais de uma década, a maior parte dos projetos de casas de carne abertas por produtores não vingou porque sobravam os cortes do dianteiro do boi, como é o caso do acém, considerados pouco nobres. Foi justamente para driblar o preconceito dos consumidores, que a Feed montou o espaço dedicado às aulas de gastronomia. “Quando o cliente aprende a preparação do prato mais simples ao mais sofisticado, cada um com seu corte adequado, ele muda de comportamento”, diz Merola. Com o crescimento das vendas, o empresário pretende diversificar os negócios, abrindo ainda neste ano seu primeiro restaurante. “Estamos bem otimistas com esse novo projeto que está sendo desenvolvendo”, afirma. “Tenho certeza que também vai dar certo.”