A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) avalia abrir um processo para investigar operações atípicas com papéis da Petrobras nas últimas semanas, quando eclodiu a crise entre o presidente da República, Jair Bolsonaro, e a administração da companhia, que culminou com a troca do comando da petroleira. Segundo apurou o Estadão/Broadcast, a área técnica do órgão regulador do mercado de capitais está analisando informações preliminares antes de formalizar uma investigação sobre uso de informações privilegiadas (insider trading, no jargão do mercado).

Os sinais de que alguém pode ter lucrado com a antecipação de informações sobre o que ocorreria na estatal foram revelados pela coluna de Malu Gaspar, no jornal O Globo. Segundo a coluna, um investidor pode ter levantado R$ 18 milhões em transações opções de venda de papéis da petroleira ao efetuar operações, na quinta-feira, 18, em um volume que só faria sentido se realmente acreditasse que as ações iriam cair pelo menos 8% na sexta-feira, 19.

Na operação de opção, o investidor adquire o direito de comprar ou vender um ativo em uma data futura, a um preço fixo, para se proteger do movimento contrário do papel ou especular. Dados públicos da B3 verificados pelo Estadão/Broadcast mostram que os detentores dos papéis tinham garantida a venda de ações da Petrobras no vencimento – 22 de fevereiro – a R$ 26,50.

No dia 18, quando a ação fechou a R$ 29,27, antes de o presidente anunciar durante live, à noite, que promoveria mudanças na estatal, duas ordens de compra foram realizadas: uma de 2,6 milhões de opções às 17h35, e outra às 17h44, de 1,4 milhões de papéis, ambas com preço de R$ 0,04, ou seja, a R$ 160 mil no total. O número de negócios com o papel naquela data foi de 238, disparando para 1.097 no dia seguinte, após Bolsonaro sinalizar mudanças.

Dois operadores de mercado disseram que o volume de compra dos papéis, chama a atenção, uma vez que até aquele momento não havia uma indicação de mudanças. “Me parece um movimento premeditado de alguém que, no mínimo, tinha um feeling de que algo ia acontecer. Pode não ter sido ‘insider trading’, mas tem cara e cheiro disso”, diz um deles.

Crime no Brasil, o insider trading é o uso de uma informação relevante ainda desconhecida do mercado na negociação de papéis, obtendo lucro ou evitando uma perda. O ex-diretor da CVM, Otavio Yazbek, descreve o roteiro de investigação: identificar quem operou e se teve acesso à informação relevante. A CVM leva em conta indícios como volume, horário e frequência de negociação. “Há um indício forte no fato de que o lote comprado era muito grande. Quando se toma risco, a lógica é não apostar todas as suas fichas”, diz.

Fontes de mercado informaram, sob anonimato, que a plataforma da corretora Tullett Prebon Brasil atuou nas duas pontas da transação, de compra e venda. A corretora não retornou o contato da reportagem.

Oficialmente, a CVM diz que “acompanha e analisa informações e movimentações envolvendo companhias abertas, tomando as medidas cabíveis, sempre que necessário”.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.