Para quem lida com o agronegócio, o provérbio popular segundo o qual o quintal do vizinho sempre tem a grama mais verde não cola. Hoje, é fácil para um agricultor ou pecuarista conferir de perto o que o vizinho faz, que técnica utiliza, que conceitos aplica em seu empreendimento rural e, se for possível, aprender com ele. No caso, o “vizinho” de porteiras abertas pode ser um americano, um uruguaio, ou estar ainda mais longe, na austrália ou na China. Com as viagens técnicas se popularizando, as distâncias entre as fazendas do país e do mundo vêm ficando cada vez menores. nos últimos anos, os preços médios entre R$ 10 mil e R$ 15 mil por pessoa e as operadoras de turismo, cada vez mais especializadas nas necessidades do cliente, têm fomentado um nicho promissor de negócios.

O empresário Frank Partington, 73 anos, acompanhou de perto esse movi­mento. Com mais de 50 anos de experi­ ência no mercado de turismo, Partington trabalhava principalmente com cruzeiros marítimos. Em 1996, um agricultor o procurou e encomendou uma viagem aos Estados Unidos para conhecer a Farm Progress Show – até hoje é um dos maiores eventos de tecno­logia agrícola do mundo –, que acontece em Iowa, Estado que faz parte do cha­ mado Corn Belt ou “cinturão de grãos” americano. “Eu achava que estava no fim da carreira e pensava em me apo­sentar”, diz Partington. “Mas a viagem mudou tudo, eu me identifiquei com esse tipo de produto e não parei mais.”

Partington fundou a Agritours Brasil, empresa paulista de viagens técnicas para o agronegócio, que em 2000 mudou de nome para Agromundi. A operadora, que reali­ za cerca de 25 viagens por ano com grupos de até 40 pessoas, faturou R$ 6,5 milhões em 2013. “Viagens técnicas era algo bem raro quando começamos, mas nos últimos dez anos a demanda cresceu bastante”, diz. Segundo Partington, foram multinacionais como John Deere, New Holland, AGCO, Monsanto e DuPont que ajudaram a impulsionar o turis­mo do agronegócio. Essas empresas começaram a levar clientes para conhecer suas fábricas no Exterior, como uma espécie de prêmio, e não pararam mais. “Até hoje, elas ainda respondem por uma grande fatia desse mercado”, diz Partington.

Na Agromundi, além do roteiro americano, outros pacotes de viagens fazem sucesso entre os fazendeiros. Entre eles estão os que incluem a Agritechnica, em Hannover, na Alemanha, e a feira Eima, em Bolonha, na Itália. Os eventos, em geral, ocupam no máximo dois dias do roteiro. A via­ gem sempre inclui dias de campo e palestras em instituições de ensino. “É uma programação bem técnica, que explora toda uma cadeia produtiva”, diz Partington. “E sempre renovamos os roteiros definindo novos destinos, porque há grupos que viajam por anos seguidos e querem novidades.”

Quem desenvolve atividade seme­lhante é o administrador de empresas Flavio Salvadego, 36 anos, que coman­da a Caep Brasil, em São Paulo. A ame­ricana Caep, de Fergus Falls, no Estado de Minnesota, é uma tradicio­nal operadora do segmento. Com ape­nas 18 anos, Salvadego foi intercambis­ta pela empresa e passou um ano tra­balhando como estagiário numa fazen­da nos Estados Unidos. A experiência de Salvadego lá fora foi tão proveitosa que ele decidiu criar a filial brasileira da Caep. No País desde 1999, a opera­dora leva mais de 250 estudantes para intercâmbio no Exterior, a cada ano. Mas a atividade mais importante da filial brasileira são as viagens técnicas, que tiveram início em 2007 e responde­ ram por mais de 80% do faturamento de R$ 8,8 milhões no ano passado. Salvadego afirma que essas viagens atraem profissionais do agronegócio e produtores com idade entre 30 e 50 anos, que desejam atu­alizar-­se e buscar tec­nologia no Exterior. “As viagens são uma imersão total, para um aprendizado intenso e rápido”, afirma. “Os produtores costumam se surpreender bastan­te, principalmente com a gestão mais eficiente das fazendas lá fora.”

Nessas viagens, os grupos são acompanhados por um guia técnico, especialista no tema de interesse dos contratantes. Esse guia é responsável pela tradução do idioma do país de destino e por sanar quaisquer dúvidas dos participantes. “O guia não é ape­nas um tradutor”, diz Salvadego. “É um pesquisador da área, o que garante qua­ lidade à comunicação.” Além dele, outro guia é responsável por questões operacionais, como check­in, transporte e para fazer com que os horários das atividades sejam cumpridos. “O produ­tor não precisa se preocupar com nada, não precisa nem falar inglês”, diz Partington. “É só arrumar as malas e viajar.” Salvadego também conta que a experiência possibilita conhecer cole­gas de diferentes regiões do Brasil e fazer amizades. “Os participantes tro­cam muitas informações e continuam esse contato após a viagem”, diz ele.

Novata nesse filão, a BeefPoint, uma consultoria de Piracicaba (SP), especializada em pecuária, começou a operar em 2012 e já realizou quatro viagens. Duas foram para os Estados Unidos, no Texas e Co­lorado, outra para a Austrália e a quarta para o Uruguai, todas em parceria com a Caep Brasil. Segundo o CEO da empresa, Miguel Cavalcanti, a novidade fez tanto sucesso que novos roteiros vêm sendo ela­borados. “A viagem é uma experiência riquís­sima que marca a vida das pessoas.” Neste ano, ele pretende orga­nizar uma viagem para a China e outra para a África do Sul. Já a via­gem ao Texas, marcada para abril, teve sua versão melhorada. “São 25 atividades edu­ cacionais e refeições nos melhores restau­rantes americanos, para a degustação de carnes”, diz Cavalcanti.

Há, ainda, as agências que se espe­cializaram em atender entidades de produtores, entre elas a CNA, sindica­tos rurais e cooperativas. É o caso da empresa TNT, de Londrina (PR). “Os clientes nos procuram e elaboramos roteiros sob demanda”, diz Roberta Borghesi, gerente comercial e de marketing da TNT. A agência promove para essas entidades até mesmo missões técnicas de pesquisas e rodadas de negó­cios. “A viagem é sempre uma ferramenta”, diz Roberta. “E ela deve estar alinhada com os objetivos do cliente.”