O uso do berrante, velha tradição das fazendas do Centro-Oeste e do interior paulista, servia para reunir o gado na invernada, um trabalho difícil que somente peão experiente e sabedor da dificuldade da  empreitada conseguia executar com sucesso. Aposentado pelas modernas tecnologias que chegaram ao campo, o artefato é o símbolo mais acabado do desafio que tem a presidenta reeleita Dilma Rousseff (PT) para os próximos quatro anos, em relação ao agronegócio.

Dilma terá de se fazer ouvir, para tentar resgatar a confiança perdida entre os produtores rurais, principalmente das lideranças classistas claramente afinadas com seu opositor, o senador Aécio Neves (PSDB-MG). Ciente a insatisfação predominante e do distanciamento do campo em relação a suas propostas, Dilma afirmou no discurso, após a apuração dos votos, que sua primeira medida será uma aproximação com todos os elos da sociedade, inclusive o agronegócio. “Quero ser a presidenta do diálogo”, disse. 

Para Gustavo Diniz Junqueira, presidente da Sociedade Rural Brasileira (SRB), a relação com o governo federal precisa ser positiva e a presidenta Dilma deve, de fato, estar aberta ao diálogo. “Os riscos no agronegócio são altos demais para que o segmento ainda conviva com inseguranças”, diz Junqueira. De forma inédita, na história das disputas eleitorais no País, o agronegócio foi tema de acaloradas discussões em eventos do setor, em reuniões e, principalmente, em debates na televisão e na internet. Em vários ocasiões, as reivindicações do setor foram apresentadas, documentadas e entregues aos candidatos Dilma, Aécio e Marina, ainda no primeiro turno. Um dos documentos que mais tiveram repercussão foi gestado no Centro de Agronegócio da Fundação Getulio Vargas, em São Paulo, dirigido pelo engenheiro agrônomo Roberto Rodrigues, ex-ministro da Agricultura, no governo Lula. Subscrito por 40 entidades rurais, entre elas a SRB, o estudo Agronegócio Brasileiro 2014-2022/ Proposta de Plano de Ação, lista as principais necessidades do campo. Rodrigues afirma que aguardará pela manifestação da presidenta, mas que isso não o impedirá de manter vivo o documento. “Vamos encaminhar à Presidência o plano de ação que acreditamos ser o mais coerente às necessidades do agronegócio”, diz. Ele dá como exemplo as políticas para a logística. “Se Dilma cuidar com vigor desse setor, o salto será gigantesco.” 

Para o agronegócio é fundamental destravar os gargalos logísticos rapidamente, única maneira de reduzir drasticamente o custo Brasil. No entanto, para um setor que deverá fechar o ano com um PIB de R$ 1,04 trilhão, e mais uma vez segurar a balança comercial brasileira, é preciso muito mais. Para o deputado federal reeleito pelo DEM do Paraná, o pecuarista Abelardo Lupion, o governo Dilma terá de trabalhar muito para cumprir o que prometeu. Ferrenho opositor ao governo do PT, Lupion promete marcação cerrada no segundo governo da presidenta. Aos produtores, interessa um conjunto de salvaguardas que também passam por questões jurídicas, demarcações de terras indígenas, seguro rural e governança fitossanitária. Para Lupion, uma das primeiras medidas que devem ser tomadas é a vigilância mais eficaz das frontei ras do Brasil com seus vizinhos. “Nossas fronteiras estão abandonadas e por isso corremos sérios riscos fitossanitários.” De acordo com Lupion, para enfrentar os desafios econômicos e sociais nos próximos quatro anos, Dilma precisará de nomes fortes ao seu lado. 

Atualmente, uma das maiores críticas do setor ao comportamento da presidenta é não contar com um ministério da Agricultura robusto. Na avaliação de Junqueira, da SRB, seria importante que o governo Dilma valorizasse mais o ministério. “As trocas constantes de ministro são prejudiciais ao setor”, diz Junqueira. Poderá haver surpresas até o anúncio do novo time de Dilma Rousseff, prometido para este mês, mas a lista de nomes que já circula nos bastidores para ocupar a pasta passa pela manutenção do atual titular, Neri Geller. Outros nomes que estão cotados são o da senadora Kátia Abreu, o da ex-secretária de Produção e Turismo de Mato Grosso do Sul, Tereza Cristina Dias, e o do próprio Roberto Rodrigues, que foi ministro da Agricultura no primeiro governo Lula, em 2003.