Uma rápida deterioração da situação financeira de muitos produtores agrícolas tem sido observada desde 2014. A inadimplência no setor se tornou inquietante e já atingiu 2,04%, mais que o dobro do nível histórico em julho deste ano, segundo dados do Banco Central. Essa situação poderia ter sido evitada pelos produtores, com três medidas simples: regras de limite de tomada de risco financeiro, expansão na proporção em que se acumula capital próprio e reservas para intempéries.

Quando se fala em deterioração financeira, o que vem à nossa cabeça são quebra de safra, queda de preços ou aumento de juros. É inegável a influência desses fenômenos. Porém, ao examinar centenas de casos nos últimos 11 anos, as razões primordiais para a piora financeira são, principalmente, expansão rápida e investimentos fora do negócio agrícola.  

Tipicamente, o imbróglio se inicia com a compra de uma área proporcionalmente grande – normalmente financiada pelo vendedor – na busca de expansão do negócio sem a devida retaguarda de capital próprio. Na sequência, ocorre perda de liquidez devido aos compromissos assumidos, busca de mais financiamento para corrigir o aperto de caixa e complicações na gestão financeira. Com sorte, preços altos e boa produtividade absorvem essa situação.  Mas, se neste ponto surgir algum imprevisto, como quebra de produtividade, queda de preços dos produtos ou subida da despesa financeira, a situação tende a tomar o rumo da insolvência.

A constante busca por produtividade e escala é o componente principal da estratégia mais acertada para quem atua com commodities (competitividade de custos).  Mas o aumento na escala de produção também precisa estar sempre em equilíbrio com o acúmulo, ou reserva de capital próprio, para promover o crescimento e ainda assegurar a permanência de alguma reserva.

Como a maior parte do investimento de operações agrícolas está centrada na aquisição de terras e apenas uma fração disso em capital operacional, o produtor tende a ter garantias reais de sobra para a tomada de novos financiamentos. Isso pode levá-lo a um risco mais alto através do endividamento crescente, juros maiores, decisões de gestão focadas na preservação do caixa, ou seja, uma ciranda perniciosa.

Como os produtores normalmente usam sistema de livro caixa, sem produzir relatórios contábeis, nos quais se notaria o desequilíbrio entre usos e fontes de fundos, a percepção de que algo está errado demora a surgir. Disciplina e planejamento do ritmo de investimentos são primordiais para a saúde financeira.

E aqui valem algumas recomendações. A primeira é que o total de endividamento, seja com bancos, fornecedores, trocas, adiantamentos, ou com a compra de terras, não deve ultrapassar a receita anual. Já em caso de atividades de alta rotatividade e alta volatilidade, como hortifrútis, o total de dívidas não deve passar da metade da receita anual.
O total de endividamento também não deve ser maior que quatro vezes o resultado operacional, que é igual as receitas do ano menos despesas de campo, de mecanização e de escritório.


Cautela: produtor deve expandir os negócios com disciplina e adequação ao fluxo de caixa

Ainda é importante que o total de compromissos (custeio, fornecedores, prestações de máquinas, prestações de financiamentos e de terras) a vencer no ano seja um pouco menor que o valor dos haveres, como estoques, aplicações financeiras, recebíveis e o valor da safra no campo. Ou seja, os ativos de curto prazo devem ser maiores que os passivos de curto prazo.

E o racional de finanças pessoais sobre ter uma reserva para emergências também se aplica aos negócios. É fundamental manter-se o equivalente a três meses de despesas gerais (escritório, combustíveis, folha de pessoal, recolhimentos, oficina, por exemplo) em aplicações financeiras reservadas ou em estoque totalmente livres de compromissos. Por fim, a expansão de área anual não deve ser maior que 15% da receita.

A expansão dos negócios agrícolas se faz necessária, tanto para ganhos de escala como para manter uma fatia do mercado, num setor crescente. Porém, precisa ser feita com disciplina e adequação do fluxo de caixa. Seguindo essas recomendações, o negócio será mantido dentro de uma zona de boa segurança e manterá sua resiliência diante das intempéries.