Até algumas décadas atrás, a goiabeira era uma árvore que podia ser encontrada na maioria das cidades brasileiras, em especial nas do interior. Colhia-se goiaba para fazer doce cremoso, em barra ou cascão. A goiabada fazia tanto sucesso que, acompanhada de queijo, se tornou um dos símbolos da cozinha rural, o Romeu e Julieta. Mas, com a expansão da indústria processadora e a produção de goiaba em larga escala, a cultura da fruta se profissionalizou. Quem estava acostumado a comer apenas o doce preparado pela mãe passou a ter opções na prateleira do mercado. Um dos grandes responsáveis por essa mudança é o empresário Antonio Carlos Tadiotti. Desde 1990, a fruta avermelhada que exala um forte aroma adocicado dá cor e sabor à rotina do empresário na Predilecta Alimentos, fundada por ele em São Lourenço do Turvo, distrito do município de Matão, no interior paulista. Maior fabricante do País de derivados de goiaba, como doces e sucos, além de atomatados e de vegetais em conserva, a Predilecta fatura cerca de R$ 600 milhões anualmente. “Não me conformava com uma produção tão caseira e pequena para essa fruta”, diz. “Eu queria ser o rei da goiabada.”

Foi com esse sonho em mente que ele erguei o seu império de seis fábricas e 1,4 mil funcionários. Junto com os 400 produtores que fornecem a fruta, o empresário mudou a paisagem da região. Inicialmente, as goiabadas industrializadas por Tadiotti eram vendidas em blocos de sete quilos para revendedores que fatiavam o produto e repassavam ao mercado consumidor. Nos últimos anos, com o aumento do consumo, novas embalagens surgiram, houve uma diversificação de receitas e o doce também passou a rechear biscoitos industrializados. A produção, em 2013, foi de cerca de 45 mil toneledas de goiabadas e de 20 mil toneladas de polpa. A Predilecta é fornecedora da paulista Bauducco e da fluminense Piraquê, duas das principais fabricantes de biscoitos, além de atender redes de supermercados como Extra e Carrefour com frutas frescas e fornecer polpa para a fabricação de sucos de várias marcas. Segundo o diretor industrial Leonardo Bolzam, a aposta para crescer no mercado interno está concentrada em uma nova embalagem para o doce. “Estamos reinventando o produto”, diz. Batizada de termoformada, a embalagem é mais atraente, capaz de facilitar o consumo e a conservação das goiabadas. Além disso, a Predilecta está de olho em outro segmento de mercado: a empresa pretende entrar no ramo de alimentação animal reaproveitando cascas e sementes, que servirão de matéria-prima para rações.

Para continuar crescendo e se manter na liderança do setor de goiaba, Tadiotti quer atrair mais produtores. “Quanto mais goiabas tivermos, mais vamos ganhar mercado.” Atualmente, os agricultores que fornecem goiaba à Predilecta cultivam uma área de cerca de 750 hectares, exclusivamente para abastecer três das seis fábricas da empresa, em Matão e Itápolis (SP) e em Morrinhos, em Goiás. As demais processam atomatados e vegetais. A demanda dessas fábricas é de 70 mil toneladas de fruta por ano, volume equivalente a mais de 50% da produção paulista. Segundo o IBGE, o Brasil produziu 345 mil toneladas, em 2012, das quais 125 mil toneladas foram colhidas no interior paulista.

Nos últimos anos, a Predilecta, que sempre forneceu mudas de frutas para os produtores, vem apostando em variedades de melhor potencial genético, mais produtivas e superiores, principalmente da variedade paluma, a mais indicada para a indústria processadora. Outra aposta é a poda escalonada, que aumenta o potencial produtivo dessas árvores e permite uma colheita ininterrupta da fruta. Tradicionalmente, a safra é colhida entre janeiro e abril, com uma produtividade de até 45 mil quilos por hectare. Mas a irrigação dos pomares, praticada por cerca de 40% dos parceiros, já permite a colheita do fruto a cada sete meses, com produtividade anual de 90 mil quilos por hectare. São quase duas safras por ano. “Com a irrigação conseguimos receber frutas o ano todo”, diz Tadiotti. “A meta é de que em dois anos a gente possa avançar ainda mais na produtividade.” Segundo o IBGE, a produtividade média nos pomares brasileiros é de 22,7 mil quilos por hectare. Em São Paulo, colhe-se uma média de 30,7 mil quilos de goiaba por hectare. Para o pesquisador Antonio Baldo Geraldo Martins, da Unesp, de Jaboticabal (SP), além da irrigação, o aumento da produtividade deverá vir de variedades mais resistentes a pragas, como fungos, moscas e nematoides. “Ainda vamos ter de desenvolver variedades mais resistentes”, diz Martins.

De acordo com o Instituto Brasileiro de Frutas (Ibraf), a produção brasileira de goiabas no País tem crescido entre 2% e 3% ao ano. Segundo Moacyr Saraiva Fernandes, presidente da entidade, a goiaba pode ganhar mais espaço, caso os seus benefícios à saúde sejam conhecidos pela população. “A fruta é muito rica em licopeno e tem mais vitamina C do que a laranja”, diz Fernandes. Ele acredita que a goiaba possa ser redescoberta e alçada ao patamar de superfruta. “Ainda temos uma comercialização internacional pequena porque a goiaba é extremamente delicada e rapidamente se deteriora”, afirma. “Para exportarmos mais, precisamos de uma logística melhor.” Foi com esse objetivo que o Ibraf criou o Projeto Brazilian Fruit, com o apoio da Apex-Brasil, para promover as frutas do País no mercado internacional.

No Exterior, a goiaba é considerada uma fruta exótica, praticamente uma desconhecida, embora a Predilecta exporte para mais de 57 países, principalmente para os Estados Unidos e Portugal. No ano passado, foram embarcadas quatro mil toneladas de doces e dez mil toneladas de polpa. Mas, em comparação com o mamão, por exemplo, isso é quase nada, cujas exportações in natura che- garam a 28 mil toneladas em 2013, ante 143 toneladas de goiaba. Por isso, Tadiotti vê um grande potencial para a goiaba processada pela Predilecta. “Hoje, nossa estratégia no mercado internacional é mostrar que a fruta pode compor as misturas de sucos”, diz. “Com a crise da laranja, os multivitaminados de frutas exóticas começaram a ganhar espaço.”