A fruta que em muitas regiões do Brasil leva vários nomes, como laranja-mimosa, mandarina, fuxiqueira, poncã, laranja-cravo, mimosa, clementina ou mexerica, no Rio Grande do Sul é chamada apenas bergamota. Com ela, um grupo de produtores de Montenegro, município do Vale do Caí, construiu uma história de sucesso que pode servir de exemplo no País. Reunidos na Cooperativa dos Citricultores Ecológicos de Montenegro, a Ecocitrus, os agricultores transformaram a paisagem da região, ao optarem pelo cultivo orgânico da bergamota e também de laranja. Com os sucos dessas frutas, eles conquistaram um mercado premium, não apenas no País como também na Europa e nos Estados Unidos. E não pararam por aí. Os subprodutos, como os óleos e os fertilizantes obtidos a partir de compostagem do bagaço e da casca, passaram a agregar valor à produção. No entanto, mais do que cuidar de seus 100 associados, a Ecocitrus está dando uma lição de sustentabilidade ao transformar em biogás os resíduos agroindustriais próprios e de terceiros. Tudo isso, com lucro para o bolso do produtor. Neste ano, a cooperativa espera faturar R$ 11,7 milhões, um crescimento de 24% ante os R$ 9,4 milhões do ano passado. “Hoje somos referência em uma cadeia de produtos orgânicos”, diz Fábio Esswein, presidente da Ecocitrus. “E estamos fazendo nossa história com a ajuda de todos.”

A Ecocitrus nasceu em 1994, pela iniciativa de 14 pequenos citricultores. Durante dois anos, eles investiram R$ 100 por mês para estruturar a cooperativa. O objetivo era acabar com a falta de escala na produção de frutas cítricas, principalmente de bergamota e laranja. O investimento rendeu bons frutos. Hoje, a área cultivada chega a 400 hectares, de onde saem 12 mil toneladas de frutas, por safra. A estrutura da cooperativa está dividida em dois segmentos: a agroindústria, que responde por suco e óleo, e a usina, com a compostagem e o biogás. 

No ano passado, a agroindústria faturou R$ 4,1 milhões, dos quais R$ 2,8 milhões vieram da venda de 1,5 mil toneladas de sucos. Desse total, 50% são destinados ao mercado interno, especialmente para clientes das lojas de redes de supermercados Pão de Açúcar, em São Paulo, Rio de Janeiro e Brasília. Já para o mercado externo, a cooperativa vende anualmente cerca de 1,9 mil toneladas, entre o suco NFC orgânico, que é a bebida pronta para consumo, e o concentrado. Os principais destinos são Alemanha, França e Itália, além dos Estados Unidos. “São mercados estáveis, fixos e com grande chance de novos  negócios”, diz Jorge Alberto Esswein, gerente industrial da Ecocitrus. 

Para os óleos essenciais de laranja e bergamota, o segundo produto em importância da cooperativa, um projeto que começou a amadurecer em 2000, o foco são as indústrias de cosméticos, farmacêutica e alimentícia. Segundo o biólogo Luís Carlos Laux, produtor de citrus em 40 hectares e cooperado, a ideia surgiu da necessidade de tirar o excesso de frutos para não sobrecarregar as árvores nos pomares. “Para melhorar a qualidade das frutas é importante fazer o raleio, ou seja, tirar o excesso dos frutos dos pés quando a fruta ainda está verde”, diz Laux. “Os óleos também se tornaram um bom negócio para nós.” A produção de 30 mil quilos, por ano, rendeu R$ 1,2 milhão em 2013. Metade disso é embarcada para o exterior, com França, Alemanha e Espanha como principais clientes. “Os óleos têm um mercado pouco explorado e com possibilidade de crescimento”, diz Laux. 

Animada com a possibilidade de expansão das vendas, a Ecocitrus investiu, no ano passado, R$ 6 milhões na construção de sua primeira fábrica com capacidade para processar 20 mil toneladas de frutas por safra, oito mil a mais do que o registrado atualmente. Até então, a cooperativa alugava uma unidade para produzir seus sucos e óleos. De acordo com o produtor João Jacó Kranz, que cultiva 23 hectares de fruta, e também é gerente operacional da fábrica, com a unidade própria a Ecocitrus está baixando seu custo de produção. “Com isso, nosso foco passa a ser a busca por novos produtores para aumentar a oferta de citrus orgânicos para cooperativa”, diz Kranz. “A região conta com muitos citricultores que rapidamente poderiam converter seus pomares convencionais em orgânicos.” 

Fertilizantes – A maior receita da Ecocitrus, atualmente, vem da compostagem do bagaço e da casca das frutas. Segundo o presidente Esswein, que cultiva laranjas e bergamotas numa propriedade de cinco hectares, foi importante para a sobrevivência da cooperativa que os citricultores enxergassem nos resíduos da produção outra fonte de renda. “A compostagem se tornou  um grande negócio”, diz. Somente no ano passado, a usina foi responsável por R$ 5,2 milhões do faturamento da Ecocitrus, com previsão neste ano de crescer para R$ 7 milhões, um aumento de  35%. “Em 1995, quando começamos o projeto, foi muito difícil viabilizar a usina de compostagem”, afirma Esswein. “Não foi fácil conseguir recursos.” 

Naquela época, dois anos depois de desenhar o projeto, a usina começou a operar em uma área de três hectares, equivalente a apenas 20% da atual. Hoje, a capacidade de processamento é de 192 mil toneladas de resíduos por ano, com as quais são produzidos 78 mil metros cúbicos de composto orgânico, biofertilizante líquido e cinza para a adubação e correção do solo. Além dos próprios resíduos, para fabricar os fertilizantes, a Ecocitrus utiliza resíduos de outras agroindústrias da região. “Essas empresas buscavam um destino adequado aos seus descartes”, diz Esswein. “Então, vimos nessa demanda uma oportunidade de negócio.” Do fertilizante produzido, parte é fornecida gratuitamente aos cooperados e o restante é comercializado. 

O mais recente desafio da Ecocitrus é vender biogás em parceria com a SulGás, empresa estatal de distribuição de gás no Sul do País. “O projeto é recente, mas o sonho é antigo”, diz Esswein. Há três anos, a Ecocitrus começou a instalar biodigestores ao lado da usina de compostagem, para produzir cerca de mil metros cúbicos de biogás, por dia, hoje utilizados pela frota de veículos da cooperativa. Para que o gás ganhe o mercado, as instalações de novos biodigestores vão elevar a produção a 20 mil metros cúbicos diários de biogás, volume suficiente para abastecer 1,3 mil carros populares. Segundo Esswein, o gás da Ecocitrus está em fase final de certificação e validação pela Agência Nacional do Petróleo. “Nosso foco é sempre a economia e a agregação de valor”, diz Esswein. “O gás é mais um produto na nossa prateleira.”