As marcas de carne têm ocupado cada vez mais as gôndolas de supermercados e casas especializadas na venda de produtos premium, no Brasil, assim como já ocorre em mercados mais maduros, entre eles os Estados Unidos e os países europeus. Em redes como a Whole Foods – a queridinha de consumidores fitness –, por exemplo, ou em badaladas steakhouses americanas, os cortes se multiplicam: T-bone, porterhouse, strip, hanger, sirloin steak, tri-tip steak e roast são apenas alguns nomes familiares para apreciadores da boa carne. Nesses mercados, as marcas são abundantes. No Brasil não há, ainda, a mesma diversidade de cortes e opções de marcas.

“O Programa de Carne Certificada é o nosso pilar, porque gera renda ao produtor” Nivaldo Dzyekanski, Associação Brasileira  de Angus (ABA) (Crédito:Divulgação)

Mas o público que exige carne de qualidade elevada tem crescido, sustentado, no campo, pelo pagamento de bônus sobre o preço da arroba do boi gordo aos pecuaristas. A indústria vem pagando prêmios de até 10%, principalmente para as raças europeias e seus cruzados, como é o caso da britânica angus. “Para começar a produzir angus, passei a olhar qual era a demanda por carne”, diz o pecuarista Nivaldo Dzyekanski, que cria gado em Itaiópolis, município do interior de Santa Catarina.

“Há 12 anos, decidimos apostar na raça.” Deu certo. Dzyekanski não apenas se tornou um produtor de genética como também é o presidente, desde o início deste ano, da Associação Brasileira de Angus (ABA). A entidade, que reúne 400 pecuaristas, tem como seu projeto mais vistoso o Programa Angus de Carne Certificada, que visa colocar no mercado produto com selo de garantia. O projeto, que começou há 15 anos, abateu no ano passado 430 mil animais, de 5 mil produtores de gado comercial, volume que dá uma média de 35,8 mil bovinos por mês. De carne, são cerca de 27 mil toneladas em peso de carcaça. “O programa de carne é o pilar principal da associação, porque gera renda ao produtor”, afirma Dzyekanski. “Basicamente, o criador escolhe o angus pela lente do mercado.

Dona de uma das articulações de cadeia mais bem-sucedidas no mercado de carne bovina, a ABA quer mais. A meta é 1 milhão de animais abatidos pelo programa. Para isso, as parcerias fechadas com 16 empresas frigoríficas – entre elas Marfrig Global Foods, Frigol, Frigorífico Silva, VPJ Alimentos, Cotripal e Cooper Aliança – devem ser intensificadas. A Marfrig é um bom exemplo. Até março, a empresa abatia animais em quatro unidades, das quais duas em Mato Grosso, uma em São Paulo e outra em Goiás. Agora, são sete unidades, incluindo mais uma em Mato Grosso e duas no Rio Grande do Sul. No ano passado, foram abatidos 130 mil animais. Hoje, a meta é 200 mil por ano. “Esse mercado vem sendo regulado pela oferta. Ou seja, precisamos colocar mais carne nesse segmento”, diz Miguel Gularte, CEO da Operação América do Sul da Marfrig Global Foods. “E quanto mais bem executarmos essa tarefa, mais teremos um crescimento sustentável”.

potencial O Brasil processa cerca de 9 milhões de toneladas de carne bovina por ano, mas não há dados sobre o volume de produtos premium. É possível, porém, ter uma ideia do potencial. “Estive reunido com grandes redes de supermercados. Elas projetam um crescimento mensal de vendas em 5% neste ano”, afirma Gularte. “Quando perguntei sobre carne premium, a expectativa vai a 20% de aumento.” Por causa desse filão de mercado, embora seja um grande produtor, no ano passado o Brasil importou 37,4 mil toneladas de carne bovina, pagando pela tonelada a média de US$ 6,2 mil.

A maior parte veio da Argentina e do Uruguai, países identificados com produtos de qualidade. Já as exportações brasileiras de carne in natura, de 1,3 milhão de toneladas, saíram pela média de US$ 4 mil a tonelada. Para Gularte, as exportações de carne premium também representam uma oportunidade para o Brasil. “Esse tipo de produto é um território a ser explorado”, destaca. “A China, por exemplo, está se ocidentalizando. Quanto mais isso ocorrer, mais mercado haverá”. De acordo com o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (Usda), no ano passado o consumo estimado na China foi de 8,5 milhões de toneladas, o que daria algo próximo a 4 quilos de carne por habitante.

Esse consumo está longe do Brasil, por exemplo, com cerca de 25 quilos per capita ao ano, ou o Uruguai, acima de 40 quilos, segundo o ranking da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Em 2018, do total de U$ 6,5 bilhões em carne bovina exportada pelo Brasil, quase metade (US$ 3 bilhões) foi comprada por China e Hong Kong – região administrativa do país asiático.

A China está dizendo que vai habilitar mais 16 unidades frigoríficas neste ano e que a demanda pode ser superior a 1,3 milhão de toneladas”, afirma Gularte. “Aí, carne premium não tem limite”. Hoje, 14 unidades de abate no Brasil têm permissão para enviar carne bovina à China.