Papagaios. Com pouco mais de 550 mil km2 de área e incrustada no centro de Minas Gerais, a cidade de 14 mil habitantes não tem tradição na produção de grãos, ou na criação de animais de corte. Ainda assim é lá que estão instaladas duas fazendas com potencial para servir de exemplo para o País nessa nova economia verde. As propriedades da Órigo Energia são fazendas solares construídas com uma expressiva participação da mão de obra feminina. Dos 60 operários contratados para a construção das usinas, 28 eram mulheres. Agora, a empresa quer levar o exemplo para outros estados.

INCLUSÃO Dos 60 operários das fazendas, cerca de 50%
eram mulheres (Crédito:Divulgação)

As qualidades das fazendeiras podem ser um diferencial seja na produção de energia, seja na de algodão, soja ou café. “Elas são extremamente habilidosas, cuidadosas e muito engajadas com a empresa”, afirmou à RURAL Osvaldo Cruz Junior, diretor-técnico da companhia. Por essas habilidades, nas fazendas elas foram alocadas especialmente nas áreas de pré-montagem e de construção elétrica. Mas a verdade é que elas dominaram todas as áreas. Exceção foi a de lançamento de cabos. “Não que eles não quisessem, mas por questões de segurança a empresa preferiu esse caminho”, afirmou.

PRÉ-CONCEITOS Mas a primeira impressão das mulheres ao verem anúncios recrutando candidatas, mostra como a questão de equidade de gêneros ainda é um tabu em áreas rurais. “Elas chegavam perguntando se a vaga era para ser cozinheira, faxineira”, afirma Cruz. Aos poucos a empresa foi convencendo as futuras funcionárias de que elas eram capazes e que ali teriam o treinamento necessário para exercer a função. Ouvi-las, entendê-las e capacitá-las foi crucial para o sucesso do programa segundo as impressões de Tatiana Fischer, chief marketing officer da Órigo. “Muitas não se achavam aptas ao trabalho, algumas nem merecedoras”, afirmou. “O que vimos foi um grande processo de transformação dessas mulheres e de todo o entorno das fazendas”.

A companhia não tem o perfil detalhado do contingente que foi empregado, mas eram majoritariamente moradoras de áreas rurais, muitas das quais sem nenhuma experiência formal no mercado de trabalho. Após o período de capacitação, o cenário mudou conforme relato da funcionária Débora Naiara de Abreu Campos Resende. “Antes eram só os homens fazendo, hoje nós também estamos fazendo. Me sinto orgulhosa”, afirmou. Diferentemente da mão de obra masculina, as mulheres querem migrar com a empresa para as futuras obras estabelecendo relações de longo prazo benéficas para ambas as partes conforme atesta Cruz. “Poucos homens têm a pró atividade de perguntar sobre novas usinas e já se colocar à disposição. Elas, sim”.

Habilidades das profissionais como cuidado com detalhes e fidelidade à empresa tornam a contratação diferencial competitivo

POTENCIAL A participação do agro no consumo de energia solar é de apenas 13,2% (Crédito:Divulgação)

RESULTADO NO CAMPO A construção de uma fazenda dura cerca de três meses. Cada unidade construída pelas fazendeiras solares gera em torno de 6 mil MW hora/mês de energia. Como no Brasil o consumo médio de uma família é de 200 KW hora/mês, a energia é suficiente para atender cerca de 3 mil famílias tanto em áreas urbanas como rurais. Mas mesmo com a vantagem da redução da conta chegar a 95% quando as propriedades usam a fonte solar em substituição aos sistemas tradicionais, a opção fotovoltaica ainda é pouco usada nas propriedades rurais.
De acordo com dados da Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (Absolar), o setor rural respondeu por somente 13,2% da potência instalada no Brasil em 2020 e os investimentos nas propriedades chegaram a aproximadamente R$ 1,7 bilhão. Aos poucos, o cenário vai mudando e a estimativa é que o campo consuma 7,5 gigawatts em 2021, cerca de 70% a mais do que o registrado no ano anterior. Esse crescimento se explica, principalmente, pela redução de impostos de importação dos equipamentos, maior disponibilidade de linhas de crédito e aumento da tarifa de energia elétrica. Para o técnico do Departamento Técnico e Econômico (DTE) do Sistema FAEP/SENAR-PR Luiz Eliezer Ferreira, “essa movimentação é importante para o desenvolvimento do setor uma vez que a competitividade ajuda a impulsionar a qualidade de equipamentos e serviços, e também a diminuir custos”. As fazendeiras e sua produção de fato ainda têm muito a agregar ao agronegócio.