Carona com a oportunidade: Zeca (acima) pediu carona a Lessa e, dessa forma, ficou sabendo do projeto

A vida não era nada fácil para os assentados da comunidade Mata do Sossêgo, em Igrapiúna, na Bahia. Os agricultores, que chegaram ali como invasores, eram vistos com preconceito pela sociedade local. E havia motivo para isso. A falta de recursos ou de gerenciamento deles levava os produtores a uma dura luta pela subsistência. Para não passar fome, valia tudo: caçar, pescar, desmatar, matar. Sim, a comunidade chegou a ser conhecida por ter matador de aluguel. Mas essa é uma página virada, desde que a Fundação Odebrecht resolveu trabalhar na região, por volta de 2005.

Sonho realizado: Souza é o orgulho da comunidade, porque comprou um carro zero com o dinheiro do palmito

Mudança de vida: com o palmito, a renda de Zequinha, que era de R$ 140 por mês, subiu para R$ 600

O encarregado por fazer a prospecção foi o engenheiro agrônomo Roberto Lessa. Em uma de suas andanças, Lessa foi abordado por José Soares dos Santos, 53 anos, o “Zeca”, um dos assentados da Mata do Sossêgo que pedia carona na pista. “Posso levá-lo, mas vou fazer um trabalho na estrada e vai ser demorado”, respondeu Lessa. O agricultor aceitou.

Essa feliz coincidência fez Zeca saber dos planos da Fundação Odebrecht de implantar na região um projeto de palmito pupunha, cultura que se mostrou a mais indicada por dar um retorno em apenas 11 meses. Na época, Zeca disputava a presidência da associação comunitária e ficou interessado. “Por que o senhor não leva esse projeto para a gente?” Lessa disse que poderiam conversar e Zeca se comprometeu a procurá-lo, caso vencesse a eleição. Três dias depois, ele estava na porta da casa do engenheiro, que logo marcou uma reunião com a comunidade. Os primeiros encontros foram polêmicos. Desconfiados, muitos diziam: “O doutor Odebrecht quer pegar a terra da gente.” Tanto é que das 82 famílias, apenas 39 abraçaram o projeto. José Marcolino Gonçalves dos Santos, 43 anos, o “Zequinha”, foi um deles. Pai de nove filhos, o agricultor estava sem perspectivas. “Queria deixar de ser peão, ter minha roça, mas se plantasse não tinha como adubar”, conta.

Filho da casa: o técnico agrícola Santos é filho de assentado e dá assisténcia aos agricultores de sua comunidade

Por isso, Zequinha não perdeu a oportunidade, na esperança de ver sua renda mensal, até então de R$ 140, subir. Deu certo. Três anos depois, ele está com 1,5 hectare em produção e uma renda de R$ 600. “Hoje, os meus filhos estudam e quando chegam da escola têm o que comer”, diz. Agenor Felix de Souza, 66 anos, foi outro que acreditou. Antes da pupunha, a renda de sua família se restringia à sua aposentadoria e à da esposa. Agora, a vida é bem diferente.

Formação de Primeira filhos de assentados no círculo de leitura da escola rural da Fundação Odebrecht

Só o palmito lhe rende R$ 700 por mês, o que permitiu ao assentado realizar um grande sonho. “Comprei uma Strada zero. Dei um adiantamento de R$ 5 mil e me comprometi a pagar o resto com o dinheiro do palmitos”, diz.

Experiências como essas espantaram de vez a desconfiança dos assentados. Hoje, o projeto engloba 64 famílias da Mata do Sossêgo e a cada dia há um novo interessado. No entanto, para chegar até a fase atual eles pediram ajuda para lidar com o dinheiro. No passado, eles haviam conseguido crédito, mas não tiveram disciplina para aplicar o recurso no plantio.

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“A gente pegava o dinheiro e gastava com coisa que não era para gastar”, conta Zequinha. A solução encontrada pela Fundação Odebrecht foi a criação de uma conta mãe, para a qual são encaminhados os créditos do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiara (Pronaf) de cada um dos assentados. Mas havia outro obstáculo: o descompasso entre o calendário agrícola e o repasse dos recursos. “O calendário é tão importante para o agricultor quanto os prazos para um advogado”, diz Lessa. Por isso, foi criado o fundo de inclusão social, composto por quatro fundos: o garantidor, de preparo da terra, de plântulas e de insumos. “Cada fundo é uma conta específica com aquela finalidade. Como a cooperativa não dispõe de recursos, aparece a figura do investidor social, que está representado pela Fundação Odebrecht. Ela aporta financeiramente numa conta específica da cooperativa”, explica Bruno Lawinscky, responsável pelos núcleos de atendimento aos cooperados da Cooperativa dos Produtores de Palmito do Baixo Sul (Coopalm). Enquanto o recurso do Pronaf dos agricultores não é liberado, ele usa o dinheiro destes fundos. Assim que o dinheiro cai, ele o devolve à conta.

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Cada fundo tem sua finalidade específica. O garantidor tem por objetivo eliminar as restrições que impedem que o produtor acesse o Pronaf. “Muitos agricultores tinham área propícia e garra para o plantio, mas, quando chegava a documentação, havia uma restrição de crédito. O que fazer? Devolver essa bomba para ele? Não, a cooperativa recorre ao fundo”, diz Lawinscky. O segundo é o fundo de preparo da terra, cujo nome já define seu objetivo. O fundo de plântulas (mudas de palmito) é o terceiro e visa formar plântulas para contemplar todos os plantios. O último é o fundo de insumos, usado para a compra de adubo para os cooperados. Assim, tudo é feito no tempo ideal e, quando o produtor recebe, o valor é descontado e volta ao fundo social.

Outra ferramenta fundamental para o sucesso do projeto foi a assistência técnica. Carlos Henrique Nascimento Santos, 29 anos, filho de assentado, é um dos técnicos da Coopalm. Depois de cursar a escola agrícola, ele voltou para sua comunidade e hoje ajuda os agricultores no manejo da lavoura. “Antes era necessário cinco hastes de pupunha para produzir um vidro de palmito. Hoje há pessoas com rendimento de uma haste e meia para um pote”, diz. Replicar a história de Santos é um dos objetivos da Fundação Odebrecht, que, para isso, mantém a Casa Familiar Rural, uma escola agrícola onde estudam jovens da região, entre eles filhos de assentados. Da lavoura, as hastes seguem para a Ambial, uma agroindústria de palmitos que presta serviços para a Coopalm. O comércio com o varejo é feito via cooperativa, para isentar o produto de impostos e garantir maior renda aos agricultores. Já o modelo de fundos rotativos foi ampliado para toda a Coopalm. E a comunidade, antes conhecida por sua violência, agora começa a fazer jus ao nome: Mata do Sossêgo.