O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, afirmou nesta quarta-feira, 23, que tomou a decisão de trabalhar durante o recesso em razão das “urgências da covid-19”. A medida, também adotada pelos colegas Ricardo Lewandowski, Marco Aurélio Mello e Alexandre de Moraes, esvazia os poderes do presidente da Corte, Luiz Fux, que fica responsável por despachar em processos urgentes dos colegas durante as férias do Judiciário.

“A suspensão do recesso em meu gabinete foi excepcionalmente adotada diante da sobrecarga de urgências da COVID-19. Vivemos uma era atípica em que esforços e adaptações são bem-vindos. Buscou-se colaborar com a Presidência do STF, ampliando a prestação jurisdicional”, escreveu Gilmar, no Twitter.

Justificativa semelhante foi apresentada por Lewandowski, que avisou que continuará despachando de seu gabinete até o final de janeiro. Segundo seu gabinete, o ministro “não se sente no direito de descansar diante do enfrentamento da pandemia”.

Esta é a primeira vez, pelo menos nos últimos 15 anos, que um número tão grande de ministros decide manter os trabalhos em pleno recesso. Integrantes da Corte ouvidos pelo Estadão viram no movimento uma retaliação a Fux após o julgamento que discutiu a possibilidade de reeleição de Rodrigo Maia (DEM-RJ) e Davi Alcolumbre (DEM-AP) para o comando da Câmara e do Senado.

Gilmar, Lewandowski e Moraes integram a ala do Supremo que se sentiu “traída” por Fux, que era dado como voto certo a favor da tese da recondução, mas acabou se alinhando a Fachin e a Barroso para impedir a reeleição dos parlamentares.

Durante o recesso, Alexandre de Moraes foi determinado o relator de um habeas corpus coletivo que questiona a liminar de Fux que travou a implementação do juiz de garantias, em janeiro, e cobrou informações do ministro sobre sua decisão. A liminar não foi discutida até hoje e não entrou no calendário de julgamentos de 2021.

Interlocutores de Fux avaliaram que o “habeas corpus da discórdia” poderia ter sido rejeitado, mas ao pedir informações do ministro, Moraes manteve a pressão sobre o presidente do STF.

A criação do juiz de garantias prevê a divisão entre dois magistrados da análise de processos criminais. O modelo foi aprovado no ano passado pelo Congresso, junto com o pacote anticrime, e sancionado em 25 de dezembro pelo presidente Jair Bolsonaro, mas sua aplicação foi suspensa por Fux, em janeiro. O ministro entendeu que a medida tinha sido feita sob medida para depreciar o juiz da causa. Na sua avaliação, mudanças na estrutura do Judiciário somente devem ser feitas pelo próprio Poder.