Vulneráveis às mudanças climáticas, os recifes de corais têm a ciência e a tecnologia como aliadas para sua preservação e restauração. Esses animais – não confunda com rochas ou plantas – são fundamentais para o equilíbrio dos ecossistemas marinhos, mas morrem aos poucos, conforme a temperatura dos oceanos se eleva. ONGs, startups e universidades têm usado impressoras 3D e até reprodução in vitro para preservar corais no Nordeste.

Uma das iniciativas é a produção de “berços”, fabricados em impressoras 3D, para a reabilitação de corais em situação de risco na praia de Porto de Galinhas, em Pernambuco. Fragmentos desses organismos são resgatados do oceano à beira da morte, enfraquecidos pela ocorrência de ondas de calor ou por degradação ambiental, como derramamento de óleo. Então, são colocados em bases de plástico biodegradável onde podem se recuperar, crescer e ter mais chances de sobrevivência.

“Mergulhamos e pegamos os corais no fundo do mar, tiramos da água só para manipular, botamos no berço e acoplamos em mesas”, explica Rudã Fernandes, coordenador da startup BioFábrica, que desenvolve as estruturas. Essas mesas, ele diz, são devolvidas à água numa área que a prefeitura e os jangadeiros ajudam a tomar conta, para não haver vandalismo, pesca ou outras atividades que atrapalhem a recuperação.

Ligada à Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), a startup começou a trabalhar com prototipagem 3D após perceber limitações em sua atividade inicial, que era criar esponjas do mar em varais. “É elementar: se o animal vive associado ao chão, nada mais natural que desenvolver uma base para ele”, diz Rudã. Posteriormente, o objeto foi patenteado e as esponjas substituídas por corais.

Por trabalhar com polímeros moldáveis, a BioFábrica consegue adaptar a morfologia dos “berços” para torná-la mais favorável ao crescimento de diferentes espécies. Ele afirma ainda que outra vantagem das peças é que elas podem ser levadas para qualquer lugar. Segundo Vinicius Nora, analista de Conservação da ONG WWFBrasil, a iniciativa mitiga os danos causados pelo aquecimento da água na região e abre um precedente para ser aprimorada e replicada no futuro.

Relatório divulgado em agosto pelo Painel Intergovernamental sobre o Clima (IPCC), das Nações Unidas, mostrou que o planeta deve atingir 1,5 ºC acima do nível pré-industrial na década de 2030. Nesse patamar de temperatura, o IPCC projeta que a população de recifes de corais diminua de 70% a 90%, ocasionando perda irreversível. “O desenvolvimento de técnicas como esta são nossa aposta para responder melhor aos impactos do clima”, diz Nora.

A produção das peças é financiada pela WWF-Brasil e pelo Instituto Neoenergia. O projeto também mantém diálogo com associações de jangadeiros de Porto de Galinhas, ONGs locais e hotéis. A ideia é ampliar o escopo elevar a iniciativa a outros pontos do litoral.

Proveta. Também no Nordeste, cientistas do projeto ReefBank, apoiado pela Fundação Grupo Boticário e pelo Instituto Coral Vivo, tentam preservar as gerações futuras dos recifes de corais do litoral sul da Bahia.

Algumas espécies se reproduzem de forma sexuada, isto é, com a presença de óvulos e espermatozoides. Inédita no Brasil, a tecnologia testada pelo grupo consiste em criar um banco de gametas congelados e, assim, evitar a extinção.

Durante a fase de reprodução dos corais, os pesquisadores vão a campo para coletar exemplares dos animais e recolher seus gametas. Congelado em nitrogênio líquido, a -196 °C, o material reprodutivo é levado para a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), em Porto Alegre.

Lá, a equipe utiliza técnicas de microscopia eletrônica e fluorescência para analisar a saúde dos gametas a nível molecular, permitindo a escolha das melhores células para fazer uma reprodução in vitro.

O experimento é feito em provetas, onde os gametas masculinos e femininos são injetados para que se encontrem e formem um embrião, dando origem a uma larva. “Em outubro, nosso planejamento é usar o sêmen que foi congelado para realizar a fertilização artificial dos óvulos coletados e, assim, gerar os primeiros ‘corais de proveta’ do Brasil”, diz o pesquisador e zootecnista Leandro Godoy, que lidera a equipe na UFRGS.

Godoy explica que o objetivo do trabalho, a princípio, não é produzir corais em laboratório e soltá-los no ambiente, mas definir um protocolo de sucesso que permita o repovoamento de recifes quando necessário.

“Se o aquecimento do planeta e as taxas de mortalidade dos corais continuarem nos níveis atuais, as projeções científicas indicam que eles poderão ser extintos até o fim do século”, diz o pesquisador. “Diante desse cenário, a criopreservação de gametas, permitindo a estocagem segura do material genético por tempo indeterminado, pode se tornar uma das peças-chave na luta contra extinção”.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.