São Paulo, 27 – A possível mudança na política indiana de incentivo à produção e exportação de açúcar para um mix mais favorável ao etanol não vai acontecer imediatamente, segundo o secretário de Comércio e Relações Internacionais do Ministério da Agricultura, embaixador Orlando Ribeiro. “Não é possível que alterem toda uma política interna por conta de uma visita presidencial. Isso não vai acontecer”, disse Ribeiro, que acompanha a comitiva presidencial em visita à Nova Délhi, em entrevista exclusiva ao Broadcast Agro, sistema de notícias em tempo real do Grupo Estado.

Segundo o diplomata, as conversas entre os dois países, até o momento, foram baseadas em troca de experiências.

Em compensação, o governo indiano, de acordo com o secretário, se mostrou aberto e receptivo em conhecer o “caso de sucesso do etanol brasileiro”. “Apresentamos para eles como foi a transformação do Estado de São Paulo antes e depois da indústria do etanol. Alguns ministros, inclusive, perguntaram à ministra Tereza Cristina sobre como podem conhecer melhor as usinas brasileiras”, disse Ribeiro, em relação ao interesse do governo indiano na experiência brasileira com o biocombustível. Os argumentos apresentados pela comitiva brasileira também levaram em conta o grau de sustentabilidade do biocombustível e a melhora na rentabilidade dos produtores de cana-de-açúcar.

O eventual comprometimento da Índia em incentivar um mix mais alcooleiro – maior quantidade de cana-de-açúcar destinada à produção de etanol do que à fabricação de açúcar – era aguardado com expectativa pelo setor sucroenergético brasileiro. Maior produtora mundial de açúcar, a Índia adota uma política governamental de subsídio à exportação do produto e não tem política de incentivo à indústria de biocombustíveis, importando volumes expressivos de petróleo. A política indiana é questionada por Brasil, Austrália e Guatemala, em contencioso na Organização Mundial do Comércio (OMC). Os países alegam que a estratégia deprime os preços internacionais da commodity, gerando prejuízos aos agricultores locais.

Sobre a possível saída do Brasil do painel contra a Índia na OMC, Ribeiro afirma se tratar apenas de uma revisão de posição. A eventual retirada do País no contencioso foi sinalizada no domingo, 26, pelo presidente Jair Bolsonaro, em resposta ao pedido do primeiro-ministro indiano, Narendra Modi. “O presidente não se comprometeu com a retirada. Ele disse apenas que iria conversar, o que é normal em um diálogo civilizado entre dois líderes”, disse o secretário.

Ampliação do comércio

Entre os acordos fechados pelos governos indiano e brasileiro, foi acertada a abertura do mercado indiano ao gergelim brasileiro, disse Orlando Ribeiro. Em 2019, a Índia importou cerca de US$ 60 milhões do produto. O objetivo do Ministério é que exportadores brasileiros possam alcançar uma participação maior e até mesmo expandir a receita com o produto.

Após a visita à capital indiana, o secretário afirma que os dois países vão seguir trabalhando para ampliação do comércio de produtos agrícolas. “Temos apenas um acordo parcial de comércio, que abrange um número muito pequeno de produtos, não atinge sequer 10% do universo tarifário”, acrescenta o secretário. “Precisamos e queremos expandir o livre comércio, sem tarifas, para uma gama maior de commodities agrícolas”, defende Ribeiro.

Hoje, a receita brasileira de exportação agrícola para a Índia é de US$ 1 bilhão por ano, de acordo com dados do Ministério da Agricultura. O objetivo da pasta é elevar expressivamente a receita, garantindo o livre acesso de produtos brasileiros. O Ministério, contudo, não tem projeção de qual seria a ordem da ampliação, por considerar que a fatia de incremento depende também da iniciativa privada. A expectativa da pasta é que, em cerca de um a dois anos, essa abertura de mercado possa estar concretizada.

Na pauta, o Brasil propõe diminuição das tarifas de importação sobre carne de frango, carne suína, frutas e leguminosas brasileiras; e abertura para citrus, que depende de protocolos fitossanitários. Atualmente, a Índia aplica tarifa de 30% sobre frango inteiro importado do Brasil, 100% para frango em pedaços e 28% para carne suína. “Essas tarifas não são viáveis para o exportador brasileiro, precisamos diminui-las e diversificar a pauta para mais culturas como lentilha, feijão, ervilha e outro”, disse Ribeiro.

Outro ponto levantado pelo governo brasileiro é a revisão nos procedimentos jurídicos de liberação de embarques pela Índia, que divergem das práticas adotadas no Brasil e, segundo o Ministério, geram insegurança ao exportador brasileiro.