A vovó Edna Prado Jardim, 59 anos, está acostumada a preparar bolos e pães de mel para receber a visita de seus cinco filhos e oito netos. Detalhe: nenhuma gota da matéria-prima usada na preparação de seus quitutes é comprada no supermercado. Ela mesma sabe como manejar uma colmeia e, se necessário, extrair manualmente o mel do favo. Junto com o marido, o apicultor Antonio Domingues Jardim, dona Edna está na atividade há mais de oito anos em Capão Bonito, município a 240 quilômetros da capital paulista. As quase sete toneladas de mel produzidas por ano com as 150 colmeias do casal são colhidas e processadas pela Associação dos Apicultores de Capão Bonito (AAPICAB) e se transformou na principal fonte de renda da família Jardim. “O mel trouxe muita coisa boa para a gente”, diz ela. “A gente mudou de vida, compramos carro novo, mobiliamos a casa toda.” 

Seu Antonio, 66 anos, é aposentado. No entanto, ele e a mulher levam uma vida bem ativa e estão acostumados a se embrenhar pela mata em busca do mel. O casal se alterna nas atividades. Uma hora ela segura um lançador de fumaça, que acalma os insetos. Ou maneja as abelhas. Idem ele. Embora o trabalho seja pesado, e realizado nas horas mais quentes do dia, seu Antonio, que era operador de máquinas numa fábrica de cimentos do município, prefere a vida que leva hoje. “Eu não tenho chefe, faço a minha rotina e ainda ganho mais”, conta ele. “Não vamos nos aposentar da apicultura”, completa dona Edna. 

Luiz Nascimento da Silva é outro apicultor satisfeito com a atividade que exerce. Com 45 colmeias, ele produziu 2,8 toneladas de mel em 2013. A renda média mensal conquistada, de R$ 1,5 mil, deverá crescer. Isso porque Silva ampliou o negócio para 70 colmeias e pretende fechar 2014 com uma produção de 3,5 toneladas. “Minha produtividade vai evoluir também”, diz ele. “Hoje é de 36 quilos de mel por colmeia, na safra do eucalipto, mas a minha meta é chegar a 50 quilos.” 

O casal Jardim e o apicultor Silva fazem parte do Projeto Colmeias, da Fibria, uma das maiores produtoras de celulose de eucalipto do mundo, controlada pelo grupo Votorantim. Eles estão entre os 60 associados da AAPICAB que têm carta branca para explorar a atividade em 30 mil hectares de florestas da empresa na região, gratuitamente. Segundo o gerente de sustentabilidade da Fibria, Fausto Camargo, o projeto, que nasceu em Capão Bonito, deu tão certo que se espalhou pelo País. Está completando uma década, em 2014, beneficiando mais de 700 apicultores de 29 associações, em cinco Estados onde a Fibria atua. “A iniciativa começou com um objetivo bem modesto, que era apenas de dar múltiplas funções para a floresta”, diz. “De lá para cá, o projeto se tornou um importante instrumento de relacionamento e desenvolvimento das comunidades locais.” 

Em 2013, a companhia investiu R$ 946 mil no Projeto Colmeias, para a capacitação dos apicultores, assistência técnica e compra de equipamentos. Para tocá-lo, segundo o analista de sustentabilidade Israel Gabriel Batista, a Fibria conta com bons parceiros. É o caso da suíça Syngenta, que participa do projeto com pesquisas de duas vertentes: o melhoramento de abelhas rainhas, para selecionar e desenvolver colmeias mais produtivas, e pesquisas de sanidade, para combater pragas e doenças, entre elas o varroa, inseto que ataca a abelha. “Também estamos montando apiários experimentais em parceria com a Syngenta”, diz Batista. Para ele, a ideia é desenvolver novas técnicas de nutrição, possibilitando a alimentação artificial das abelhas durante o inverno, quando não há flores disponíveis. 

O período de floração do eucalipto acontece entre janeiro e março, quando as abelhas se alimentam das suas flores, ricas em néctar, e produzem o mel. Mas, a apicultura não para por aí. Alguns produtores ainda contabilizam outras duas safras no mesmo ano: eles transportam suas colmeias para plantações de laranja ou para a mata nativa, para produzir outros tipos de mel. De acordo com o presidente da AA PICAB, Carmo Henrique Contieri, os associados da cooperativa produziram cerca de 150 toneladas de mel no ano passado, para um mercado cada vez mais aquecido, que está remunerando entre R$ 6 e R$ 7,60 pelo quilo do produto. “O preço está bom, dá para manter o apicultor trabalhando no campo”, diz ele.

Enquanto a produção avança – Contieri estima um incremento de 20% em 2014 –, aos poucos, o processamento do produto também evolui. No início do ano, a associação inaugurou um novo maquinário para abrir as melgueiras, a caixa de madeira onde as abelhas depositam o mel. Em vez de processar 100 melgueiras por dia, o novo equipamento pode abrir 800 delas, no mesmo período. “Essa máquina é uma grande conquista para nós”, diz Contieri. “A apicultura brasileira precisa de padronização e automatização para crescer ainda mais.” 

Das 150 toneladas produzidas pelos cooperados da AA BICAB em 2013, cerca de 30 foram compradas pelo governo para merenda escolar. A maior parte, 120 toneladas, foi exportada para os Estados Unidos. A experiência da AA BICAB no mercado externo retrata o sucesso da produção nacional lá fora. “O mel brasileiro é um dos melhores do mundo”, diz Flávia Salustiano, gerenteexecutiva da Associação Brasileira dos Exportadores de Mel (Abemel). “É livre de resíduos e reflete a nossa biodiversidade, com méis de vários tipos de floradas.” O Brasil exportou 16,1 mil toneladas de mel, em 2013, por US$ 54 milhões. Até maio deste ano, os embarques já somaram 14,5 mil toneladas. “Estamos firmando novos acordos comerciais e as exportações vão crescer”, diz Flávia. “É importante que o apicultor faça parte de associações para ter oportunidades e fortalecer o setor.”

A apicultura está ganhando relevância como fonte de renda para os pequenos produtores. No Rio Grande do Sul, o mel fabricado pela Cooperativa Vacariense de Apicultores (Avapis), do município de Vacaria, é a principal matéria-prima de cosméticos para hotéis, criados pelo projeto “Talentos do Brasil Rural”, uma iniciativa do Ministério do Desenvolvimento Agrário que valoriza a agricultura familiar. Outro exemplo é o projeto “Pescadores de Mel”, uma iniciativa da petroquímica Braskem, do grupo Odebrecht. Criado em 2006, o projeto capacita pescadores do litoral de Alagoas, que sofrem com a redução da oferta de peixes e caranguejos. Eles passam a ter como alternativa a produção de “própolis vermelha”, um produto alagoano que foi reconhecido pelo Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI) como uma própolis exclusivamente brasileira.