ALÍVIO RURAL: Lula abriu uma nova rolagem de dívidas de R$ 7 bilhões

O presidente Lula conseguiu o que parecia impossível. Arrancou elogios do campo. Depois de três anos de grave crise, provocada por secas, enchentes, volatilidade do câmbio e aumento do frete, Lula chama o agronegócio para um novo ciclo de entusiasmo. Há uma série de boas notícias chegando, todas ao mesmo tempo, para o setor que começa a viver um momento especial. Na segunda semana de julho, o governo aprovou a renegociação da dívida ruralista, 15 dias depois de divulgar a expansão do crédito agrícola para a safra 2007/2008. O sinal é claro: chegou a hora de rolar a dívida e tomar mais crédito. “O governo criou as condições para que os agricultores possam plantar a próxima safra e ter renda”, explica o ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes. “A partir de agosto vamos discutir uma estruturação definitiva da dívida do setor, que vem, em grande parte, do início da década de 90”.

A renegociação de R$ 7 bilhões em dívidas rurais deverá atender os produtores de algodão, arroz, milho, trigo e soja.

EM ALTA US$ 58 BILHÕES é o volume de recursos disponível para os produtores na próxima safra

ONDA DE OTIMISMO CONTAGIA O CAMPO

A estimativa do Ministério da Agricultura é de que os pagamentos neste ano girem em torno dos R$ 780 milhões, um sexto dos débitos de dez programas de investimentos, porque, além da rolagem da dívida, o governo deu rebate de 5% a 15%. Outra vitória do setor é que não haverá distinção geográfica por Estado, como queria o governo. Além disso, os bancos estão autorizados a negociar, caso a caso, os pedidos de repactuação de produtores de outras culturas até o limite de 10% da sua carteira.

Neste caso, banco poderá renegociar até 100% das dívidas. “Essas medidas vão colocar o agricultor em condições de crédito e custeio”, diz Carlos Rivaci Sperotto, coordenador da Comissão de Crédito Rural da CNA e presidente da Federação da Agricultura do Rio Grande do Sul (Farsul). “É claro que queríamos um rebate de 30% e juros menores, mas isso já é o começo. Encomendamos uma pesquisa para janeiro sobre a real capacidade de pagamento das culturas. Com ela vamos trabalhar por descontos maiores”.

A negociação entre os dirigentes rurais e o governo resultou em dois planos. O primeiro, para os produtores de algodão, soja, milho e trigo, que têm dívida de R$ 4,8 bilhões com investimentos (Moderfrota, Finame Especial) e cooperativas (Prodecoop).

Eles poderão pagar 30% da parcela de 2007, com rebate de 15% da dívida. O restante será prorrogado para um ano depois do vencimento da última parcela, normalmente para daqui a cinco anos. Na prática, haverá um desconto de 3% sobre o saldo devedor de R$ 49 bilhões com investimentos.

Para as dívidas dos outros sete programas de investimentos (Moderagro, Moderinfra, Prodefruta, Prodeagro, Prodeflora, Pronaf e Proger) – de R$ 400 milhões e prazo médio de oito anos – há outro cálculo. O agricultor deverá pagar 20% das parcelas, com desconto de 5%, e o restante só será cobrado um ano depois da última prestação. “O governo quer limpar a carteira dos agricultores”, explica Edílson Guimarães, secretário de Política Agrícola. “Os anos de 2004 e 2005 foram péssimos. Mas em 2006, a safra foi boa. Os agricultores conseguiram pagar suas dívidas atuais, mas não conseguiram quitar as anteriores.”

Com fôlego novo para a próxima safra, os agricultores poderão tomar empréstimos para custeio – aqueles que optarem pela rolagem da dívida estão impedidos de contratar empréstimo para investimento. Do volume de empréstimos para a safra 2007/2008, anunciados pelo governo, o Banco do Brasil é responsável por 63% dele. Em números reais significa que, dos R$ 58 bilhões que deverão ser emprestados, R$ 37 bilhões sairão do Banco do Brasil. Isso não chega a ser uma novidade para o BB, o único que tem uma carteira própria para o agronegócio. De acordo com o vice-presidente de Agronegócio do banco, Derci Alcântara, o volume total de empréstimo do banco já ultrapassou R$ 50 bilhões. Mas, na contra-mão das críticas ao governo – de que há uma desigualdade de recursos entre a agricultura empresarial e a familiar –, o crédito para a agricultura familiar do banco foi o que mais cresceu. Subiu 20% nesta safra. “Percebemos que nos últimos anos até o IDH dos municípios onde o banco atua com o Pronaf melhora”, explica Alcântara.

“Percebemos que o crédito para a agricultura familiar reduziu a migração para a cidade, melhorou a renda, aumentou a produtividade, com assistência técnica e com tecnologia adequada. Há mais dignidade. É um processo que talvez tenha um efeito muito mais benéfico do que um Bolsa Família.”

ELE TEM R$ 50 BILHÕES PARA EMPRESTAR

Derci Alcântara, vice-presidente do Banco do Brasil, é responsável direto pela aplicação do crédito agrícola no País. Para a próxima, ele dispõe de R$ 37 bilhões, além de R$ 11 bilhões voltados para a agricultura familiar. À DINHEIRO RURAL, ele falou dos seus planos.

DINHEIRO – O Plano de Safra 2007/2008 prevê uma forte expansão do crédito agrícola com recursos de até R$ 58 bilhões. Qual será a participação do Banco do Brasil?

Derci Alcântara – Deverá chegar a R$ 37 bilhões, o que representa aumento de 12% em relação à safra 2006/2007. Mas o volume total de empréstimo do banco já ultrapassou R$ 50 bilhões. Temos R$ 11 bilhões para a agricultura familiar, o que atende quase 1,1 milhão de famílias por ano, quase 70% de todo o atendimento na agricultura familiar. É um atendimento pulverizado, simplificado, porque o objetivo do banco é a universalização. Esse é um processo que talvez tenha um efeito muito mais benéfico do que um Bolsa Família.

DERCI ALCÂNTARA: ele responde pela política de crédito do Banco do Brasil

DINHEIRO – E o nível de inadimplência dos produtores rurais, depois de duas safras de rentabilidade muito baixa para o setor, como está?

Alcântara – Ela se mantém em níveis históricos de 2%. De fato, 2005 e 2006 foram anos com menor renda para o setor de grãos, o que levou à necessidade de reescalonar parte das dívidas rurais, mas 2007 está sendo um ano de recuperação, com retomada de pagamentos dos custeios que deverão ser liquidados, acredito, sem maiores problemas.

DINHEIRO – Que perspectivas o sr. enxerga para o agronegócio brasileiro nos próximos anos? A taxa de câmbio não é um problema?

Alcântara – Acredito que os níveis de produção e produtividade deverão manter- se crescentes, assim como o aumento do volume de exportações, principalmente de carnes, produtos florestais, açúcar e álcool. As carências de infra-estrutura tendem a ser superadas, o que contribuirá para a expansão dos investimentos. Os financiamentos deverão ser ampliados e a expansão dos títulos privados do agronegócio propiciará novas fontes de financiamento para o setor. No caso do câmbio, os preços das commodities têm se mantido competitivos no mercado internacional. O “travamento” dos preços pelas operações de hedge também tem amenizado as oscilações de preços.

DINHEIRO – Esses títulos ainda não decolaram. O que falta para eles serem absorvidos pelo mercado?

Alcântara – A redução da taxa de juros e a recuperação da capacidade de pagamento dos produtores darão um boom nesse mercado. Eles vão deslanchar.

DINHEIRO – Várias empresas do agronegócio, como os frigoríficos e as companhias sucroalcooleiras, estão chegando com sucesso ao mercado de capitais. O BB tem planos de apoiar esse movimento das empresas rumo às bolsas?

Alcântara – Além da abertura de capital, outros dois processos que têm interessado os investidores é o Private Equity e a Venture Capital. Ou seja, trata-se de mecanismos para apoiar essas empresas antes mesmo que elas cheguem às bolsas. A diretoria de Mercado de Capitais do BB está orientando e facilitando o acesso das empresas que buscam esses novos mercados.