DESMATAMENTO NO MT: Críticas ao governador por permitir o avanço da cultura da soja na Amazônia

No dia 6 de outubro o governador de Mato Grosso, Blairo Borges Maggi, deixou o Palácio Paiaguás, em Cuiabá, acompanhado de um grupo de 15 pessoas, com uma missão clara: defender o agronegócio brasileiro. Incumbido da tarefa por si próprio, o maior produtor individual de soja do mundo voou para a Europa, percorreu dez cidades em um período de duas semanas, teve encontros com todo tipo de autoridade, de ministros de Estado a diplomatas, e também ativistas do meio ambiente. O périplo foi a resposta para o mercado internacional aos ataques que o Brasil vem sofrendo em duas frentes: pela Irlanda, contra a carne brasileira, e por organizações não-governamentais (ONGs), contra o avanço da soja na Amazônia, o que significaria devastação da floresta em favor da agricultura. Maggi passou pela Rússia (Moscou, Stavrópol e Essestuki), pela Alemanha (Colônia e Frankfurt), Holanda (Amsterdã e Wagenningen), Bélgica (Bruxelas) e fechou a viagem na França (Toulouse e Paris).

DAQUI PRA LÁ… Acompanhado da comitiva, visita o centro histórico de Toulouse…

 

… DE LÁ PRA CÁ

… antes de participar de mais uma reunião na França.

Em dois lugares, especialmente, encontrou forte oposição aos seus negócios e à forma como gere Mato Grosso – e acabou travando discussões acaloradas. Na França e na Holanda foi inquirido por ativistas sobre o avanço da soja na Amazônia no Estado. Com o olhar sereno, apesar de tenso, a estratégia é simples. Fala comedidamente e argumenta com base em fatos, sempre amparado em números e pesquisas. A pancada acaba saindo, só que pelo lado de sua entourage, formada por dirigentes de associações da agricultura e da pecuária de Mato Grosso (veja quem são eles no quadro da página seguinte).

A QUESTÃO AMAZÔNICA: “Somente 1,2% da Amazônia é ocupada por plantações de soja”

“AINDA EXISTE MUITO PRECONCEITO POR PARTE DOS EUROPEUS CONTRA OS NOSSOS PRODUTOS”

O governador de Mato Grosso, Blairo Maggi, passou a segunda e a terceira semana de outubro cumprindo uma maratona de reuniões, visitas a compradores, debates – e certamente muita polêmica. Foram visitadas, no total, dez cidades européias. Quando tinha tempo, dava atenção à mulher, Teresinha, e à filha. Mas foram poucos os momentos de folga. Leia, a seguir, trechos da última entrevista que concedeu à DINHEIRO RURAL no último dia da viagem.

DINHEIRO RURAL – Qual o balanço do giro europeu?

BLAIRO MAGGI – Achei muito bom ter vindo, porque é algo muito importante para o agronegócio brasileiro. Mostrar a cara e conversar. Mas, por outro lado, não gostei nada do que ouvi.

DINHEIRO RURAL – De que, exatamente?

MAGGI – Ainda existe muito preconceito por parte dos europeus contra nossos produtos, como a carne, e há muita informação errada sobre as questões amazônicas.

DINHEIRO RURAL – O sr. refere-se às acusações de devastação da floresta para o plantio de soja e aos dossiês lançados pela Irlanda sobre a carne brasileira?

MAGGI – Isso mesmo. No caso da carne, a Irlanda faz um jogo que, no fim das contas, será um tiro no pé. É natural que abramos nossas fazendas para a fiscalização internacional. Dessa forma pode-se cobrar qualidade. Mas enviar equipes de pessoas sem que se identifiquem, é um absurdo.

DINHEIRO RURAL – E quanto às denúncias sobre a invasão da soja na Amazônia?

MAGGI – O que eles chamam de denúncia é um absurdo. Primeiro porque a soja cresceu em áreas em que não havia nada. Mas o principal é que apenas de 15 a 16% do território amazônico está sendo ocupado. Deste percentual, somente 2% é ocupação pela agricultura.

E desses 2%, 1,2% referem-se à soja – um valor muito pequeno. Ou seja, a soja não invadiu a Amazônia.

DINHEIRO RURAL – Como então essa questão poderia ser resolvida?

MAGGI – É a segunda grande viagem que faço para rebater informações. Possivelmente terei que fazer outras com menos intervalos para que as informações corretas circulem com mais velocidade.

BATE DAQUI, LEVA DALI: A ativista Catherine Gaudard, da ONG Comitê Católico contra a Fome e pelo Desenvolvimento ataca Maggi

Foi assim em Paris. Sexta-feira, 19 de outubro, último dia do périplo. A ativista Catherine Gaudard, da ONG Comitê Católico contra a Fome e pelo Desenvolvimento, distribuiu um panfleto intitulado “A Soja contra a vida”, em que denunciava o sistema agrícola opressivo dos grandes produtores contra a agricultura familiar e de pequenas áreas, mas a reação veio em seguida. O dirigente da Associação dos Produtores de Soja de Mato Grosso, Ricardo Ariolli Silva, levanta-se para rebater as acusações.

Com voz embargada e ar compungido, diz: “Eu vi o seu folheto e estou me sentindo um bandido. Minha família planta soja há 20 anos, mas eu não sou assim. Por que vocês europeus querem continuar como estão, e nós temos que viver como índios?”. O ataque deixou os franceses constrangidos porque esperavam menos teatro e mais objetividade. No fim, porém, Maggi colocou panos quentes e atuou como conciliador. Comprometeu- se a melhorar a fiscalização, tirando da manga o anúncio de um contrato assinado no dia anterior, em Toulouse, feito pelo Estado de Mato Grosso com uma empresa francesa de mapeamento aéreo para acompanhar as áreas preservadas.

Saiu-se bem. Ainda mais para quem, há pouco mais de um ano, recebeu o troféu Motosserra de Ouro do Greenpeace britânico, sob a acusação de desmatamento da Amazônia.

Guerra de papel

Como ONGs e governo de Mato Grosso fizeram panfletagem na Europa

Governo de Mato Grosso de um lado, mostrando suas ações, garantindo que a Amazônia está preservada – em francês e inglês. Do outro, organizações não-governamentais francesas e holandesas atacando Maggi, garantindo que a floresta não está sendo resguardada como promete o político e que a soja está sendo usada contra a vida, pois devasta a Amazônia. Veja como as duas partes se atacam (e se atracam).

FOCO NAS AÇÕES SOCIAIS: o governo mostra o investimento na agricultura familiar e nos pequenos produtores rurais

REAÇÃO DAS ONGS: e as ONGs francesas e holandesas miram na soja, que para elas é plantada…

… sem controle em MT, levando ao desmatamento da Amazônia. Por isso a bandeira dos ativistas é: “A soja é contra a vida”

 

Olhar para Blairo Maggi e tentar enxergar somente o político é difícil. Melhor, é impossível. Aos 51 anos, licenciado das atividades na empresa da família desde a primeira eleição para o governo do Estado, em 2002, o empresário paranaense (de nascimento, mas registro em Torres, como gaúcho) percebe que está em um caminho sem volta que oferece apenas duas opções – ele mesmo dá o nome para a sua situação de “encruzilhada”. Findo o segundo mandato, em 2010, terá de optar entre ficar de vez na política ou voltar para a A. Maggi. “Se tiver sorte posso me eleger senador pelo Mato Grosso”, reflete. “Mas seriam mais oito anos que, somados aos dois mandatos como governador, seriam 16 anos longe das empresas. É certo que ficaria de vez na política.”

DESPACHO A JATO: Maggi conversa com um representante da França no conselho da União Européia

A verdade é que Maggi tomou gosto pela política – tanto é que em outubro passado assumiu espontaneamente a figura do embaixador do agronegócio brasileiro. Mas sabe-se, também, que tem forte apego pela história do grupo, criado pelo pai, André Antonio Maggi, a partir de uma serralheria em São Miguel do Iguaçu, no Paraná. Quando fala dos negócios, sua fisionomia muda. Os traços do rosto, até então tensos, suavizam-se e naturalmente ele começa a sorrir.

“Meu pai conseguiu comprar o primeiro pedaço de terra com o dinheiro de bonificações que recebia dos trabalhos”, conta Maggi, que participa do grupo desde a década de 70, ainda estudante de agronomia na Universidade Federal do Paraná. Em 1980 mudam para Mato Grosso – e aí começa a escalada para o sucesso.

RECEITA DE R$ 1,1 BILHÃO é a previsão de quanto o Grupo Maggi deverá faturar este ano

A força que dedicou à viagem segue o modelo de obstinação pelo qual o governador é conhecido. Não é à toa. Blairo Maggi é um dos responsáveis pela criação do conglomerado familiar e pelo seu crescimento: além da soja, planta milho e algodão em uma área de 195 mil hectares e possui um parque industrial com capacidade para esmagar um milhão de toneladas de soja. O faturamento previsto para 2007 é de R$ 1,1 bilhão. Mas os números são ainda mais impressionantes: 50% da colheita de soja da safra 2007/ 2008 já está vendida, o que projeta o faturamento de 2008 para R$ 1,6 bilhão. Maggi foi o principal dirigente até a primeira eleição de que participou, mas não teve outra saída: na sua ausência, acabou partindo forçosamente para a profissionalização da gestão. O objetivo é claro: a abertura de capital, já nos próximos meses, na Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa). Se continuar na política, Blairo Maggi poderá, como ele mesmo diz, se candidatar ao Senado ou até alçar vôos maiores. Mas, se desistir e voltar para o grupo, certamente não será um mau negócio. Assumiria uma cadeira na presidência do conselho de administração de um grupo que fatura mais de R$ 1 bilhão por ano e que cresce a passos largos. Nada mal. Mas sua escolha final dependerá de sua ambição pessoal e de sua capacidade de negociação na política.

Tropa de elite

Quem são os homens do governador Maggi

CAPITÃES DA GUERRA: acima, Prado (à esq.) e Sachetti, de Rondonópolis; ao lado, Vetorazzo e Ariolli, da Aprosoja (à dir.)

São eles que compram a briga em nome de Maggi, para que este não se desgaste nas viagens internacionais: o presidente da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado, Rui Ottoni Prado, o vice-presidente da Aprosoja, Ricardo Ariolli Silva, o prefeito de Rondonópolis (MT), Adilton Sachetti, e o secretário Cloves Vetorazzo.