Mesmo com um prazo maior neste ano, seis em cada dez diretórios de partidos políticos do País não informaram como usaram o dinheiro público que receberam em 2019. O limite para entregar as prestações de contas, inicialmente previsto para abril, acabou na terça-feira passada, dia 30 de junho. Dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) mostram que das mais de 100 mil unidades das legendas nos Estados e nos municípios, 59.634 estão inadimplentes – não enviaram qualquer dado ou fizeram apenas parcialmente.

Ao todo, o TSE distribuiu R$ 927 milhões às 33 siglas no ano passado via Fundo Partidário. O dinheiro é repassado em parcelas mensais para bancar custos como aluguel de sede, salário de funcionários e também as campanhas eleitorais – cabe ao comando nacional de cada uma definir a quantia que destinará aos seus diretórios.

O porcentual de inadimplência registrada neste ano é maior que o de anos anteriores. Como mostrou o Estadão no mês passado, 41,3% dos diretórios partidários não apresentaram os dados relativos a 2017. De 2018, o índice dos que deixaram de prestar contas foi de 50,7%.

Cúpulas partidárias alegam que orientam os responsáveis pelos diretórios locais a cumprir os prazos da Justiça Eleitoral, mas ressaltam que cada unidade tem independência. Além disso, destacam que a maior parte das unidades que não entregam as prestações é sem movimentação financeira – mesmo assim, precisam informar a Justiça Eleitoral que não receberam nada.

Advogado de partidos políticos de São Paulo, Ricardo Porto afirma que a nova modalidade de prestação de contas, exclusivamente por meio de um sistema eletrônico, tornou-se uma dificuldade extra a diretórios com pouca estrutura física e de pessoal.

“A maioria (dos que não prestam contas) é de órgãos municipais, e a imensa maioria sem movimentação financeira, sem movimentação do Fundo Partidário e sem recursos privados. Acreditamos que os partidos, muito embora não tenham observado o prazo, tendem a, nos próximos dias, ainda que com atraso, apresentar as prestações de contas”, afirmou o advogado, que presta serviços a partidos como DEM, MDB, PL e PV.

Para a secretária-adjunta da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (Abradep), Denise Goulart Schlickmann, a declaração de não movimentação financeira é tão importante quanto qualquer outro relatório contábil, uma vez que a Justiça Eleitoral apura a consistência da informação da mesma forma.

Pela regra em vigor, o diretório que não declara a sua movimentação financeira à Justiça Eleitoral fica impedido de receber novas parcelas do Fundo Partidário, mas o bloqueio pode ser revertido caso a prestação seja apresentada mesmo após o prazo.

Antes, os registros partidários também eram automaticamente suspensos, o que impedia o diretório até de lançar candidato. Em dezembro, porém, o Supremo Tribunal Federal (STF) suavizou as sanções ao determinar a necessidade de abertura de um processo específico contra partidos que não entregarem as contas e, só então, aplicar eventuais punições.

Na avaliação da especialista, a pandemia e as restrições no funcionamento de órgãos necessários à regularização dos partidos, como a Receita Federal, contribuem para a alta inadimplência. Por outro lado, ela também destaca que a legislação não reprime os atrasos.

“A própria legislação é condescendente, determina que quem não presta é intimado a prestar. Todos os partidos estão cientes de que haverá uma segunda oportunidade porque serão notificados a prestar contas para só então, caso não prestem efetivamente, terem uma consequência judicial”, afirma.

Um dos partidos mais capilarizados pelo País, o PT reconhece dificuldades para que diretórios estabelecidos nos rincões brasileiros cumpram os prazos contábeis, mas garante que não trata a questão como secundária. Por isso, alega oferecer suporte jurídico e contábil.

“Temos o maior número de diretórios organizados no País. O PT sempre faz formação, seja política, jurídica ou contábil. A maioria dos diretórios estaduais dá assessoria jurídica aos municípios. Quanto menor o município, mais sofrido é para ele. Às vezes, não tem um vereador, mas tem que ter a documentação arrumada”, afirmou Gleide Andrade, secretária nacional de Finanças e Planejamento do PT.