O presidente Jair Bolsonaro terá que encontrar justificativas técnicas para decidir se a tecnologia 5G no Brasil não terá a participação da fornecedora de equipamentos e redes chinesa Huawei. Representação proposta ao Tribunal de Contas da União (TCU), de autoria do subprocurador-geral Lucas Rocha Furtado, quer que a corte de contas discuta os aspectos geopolíticos do tema para evitar que o País seja influenciado apenas pela proximidade entre Bolsonaro e o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump.

“Isso porque, como se sabe, é notório o alinhamento automático do atual presidente brasileiro com o seu congênere norte-americano. Todavia, não se sabe até que ponto a atual guerra comercial travada entre EUA e China é uma questão de Estado ou reflete apenas uma posição protecionista de caráter pessoal do Presidente Trump, cuja reeleição este ano para a presidência dos Estados Unidos está claramente ameaçada, de acordo com as últimas pesquisas eleitorais naquele país”, diz Furtado, no documento.

Na representação, o subprocurador-geral sustenta que qualquer decisão sobre o assunto precisa ter “critérios técnicos e concorrenciais claros”, para evitar “incertezas e inseguranças jurídicas que podem prejudicar a finalidade precípua da licitação e o seu objetivo último, que é a prestação de adequado serviço à população”.

“Necessário, portanto, que o TCU esteja atento a que a eventual decisão de se excluir a empresa chinesa não se atenha a questões meramente ideológicas ou de alinhamento automático aos interesses norte-americanos (ou interesses do próprio presidente Trump)”, afirma Furtado.

Para ele, o TCU precisa levantar discussões sobre diversos aspectos que envolvem o 5G, como segurança nacional, desenvolvimento tecnológico, transferência de tecnologia, segurança de dados e intimidade da vida privada dos consumidores.

O subprocurador-geral do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União ressalta que qualquer decisão sobre o 5G deve ser tomada de acordo com os princípios básicos da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade e da publicidade,levando em conta critérios técnicos e concorrenciais rigorosos, de forma a evitar incerteza e insegurança jurídica.

Na quinta-feira, em transmissão semanal nas redes sociais, Bolsonaro disse que a decisão sobre os equipamentos que serão utilizados para prover o sinal 5G no País será dele. “Vou deixar bem claro, quem vai decidir 5G sou eu. Não é terceiro, ninguém dando palpite por aí, não. Eu vou decidir o 5G”, disse.

O presidente afirmou que vai ouvir integrantes do governo, entre eles o ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), Augusto Heleno, o chefe de Agência Brasileira de Inteligência (Abin), Alexandre Ramagem, e o diretor-geral da Polícia Federal (PF), Rolando Alexandre de Souza, e até integrantes do governo americano sobre o tema.

“E com mais inteligência do Brasil, com gente mais experiente. Converso com o governo americano. Converso com várias entidades, países, o que temos de prós e contras”, declarou Bolsonaro.

O edital do 5G está sob análise da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), e o leilão está previsto para 2021. A disputa será entre as empresas de telefonia do País, como Claro, Vivo, TIM, Oi e Algar Telecom, mas pequenos provedores também poderão disputar lotes regionais da frequência de 3,5 GHz. Nenhuma tele chinesa opera no País atualmente.

O leilão não vai selecionar os fornecedores das redes e equipamentos, pois essa decisão cabe às próprias teles. Apesar disso, o governo pode decidir banir uma empresa por decreto presidencial ou impor limitações à sua presença nas redes brasileiras.

O 5G é palco de disputa mundial entre Estados Unidos e China. A Huawei, que lidera a corrida pelo domínio da tecnologia, tem sido alvo de ataque de autoridades norte-americanas, que acusam a empresa de fazer espionagem para o governo chinês, o que ela nega.

A Huawei já atua no Brasil há mais de 20 anos. A estimativa no setor é que entre 40% e 50% das redes instaladas no País contem com tecnologia da empresa nas redes 2G, 3G e 4G. Substituir esses equipamentos poderia gerar custos adicionais para as empresas, com impactos possivelmente repassados aos consumidores. Ao lado da Huawei, as principais fornecedoras são a finlandesa Nokia e a sueca Ericsson.