Subir a Serra da Ibiapaba não é tarefa da mais fáceis. Curvas sinuosas chacoalham os carros para lá e para cá, colocando os passageiros em perigo entre abismos profundos, mas também mostrando-lhes paisagens de um Ceará verde e cheio de vida brotando da terra. Lá em cima, as temperaturas são altas durante o dia e o entardecer chega com ventos gelados. No meio da montanha está Viçosa, uma cidadezinha cheia de casas coloridas, coladas umas às outras. O município é passagem obrigatória para quem está no litoral e vai a São Benedito, o ponto mais alto da região, a 900 metros do nível do mar. Há 12 anos, quem percorreu este caminho foram os Selbach, gaúchos de São Leopoldo que migraram para o Ceará e traçaram no Nordeste uma história de sucesso que desabrocha milhões de reais na economia. O seu trabalho foi determinante para que a Serra se transformasse em um dos quatro pólos produtores de flores do Estado, capaz de produzir as mais belas rosas do País, e inserisse o Brasil na rota do agronegócio mundial da floricultura. Criados para exportação, os jardins do Ceará, composto pelos polos Guaramiranga, Cariri, Ibiapaba e Metropolitano, movimentarão este ano US$ 5,5 milhões com as exportações, mas o mercado interno agora começa a crescer.

Gabriela Selbach cresceu entre roseiras. Ainda criança, acompanhava o pai, executivo do setor calçadista e floricultor, Paulo Selbach, em sua busca pela rosa perfeita. A paixão virou negócio em 1998 e hoje, Gabriela é seu braço-direito e dirige a CeaRosa, a fazenda de 150 hectares fincada no alto da serra que produz diariamente 24 mil rosas de alto padrão em 12 hectares de estufas. “O objetivo inicial era produzir rosas para exportação, mas o mercado movimentou-se de tal forma que hoje é no mercado interno que está a maior demanda”, explica Gabriela, com um sotaque que mescla o gauchês e o cearês. “Apesar disso, toda a produção segue o padrão internacional e não vamos mudar isso.” Na CeaRosa, os Selbach já investiram R$ 12 milhões. As exportações cessaram em 2008 com a crise mundial e Gabriela, então, começou a fazer vendas diretas. “O momento não era bom, então copiei o sistema de venda alemão: passei a mão no telefone e comecei a vender rosas”. Durante muito tempo, ela ligava, vendia, entregava os pacotes e, depois de uma semana, ligava de novo para saber se o cliente estava satisfeito. Isso lhe rendeu fidelidade e credibilidade no mercado. Atualmente, suas rosas abastecem o Nordeste, mas os maiores carregamentos são enviados, via aérea, a Brasília, Manaus, Rio de Janeiro e Porto Alegre. Por dia, ela vende entre 800 a mil pacotes de 20 botões. O trabalho que Gabriela fazia sozinha hoje conta com 15 pessoas, em Fortaleza, e mais 180 para a produção em São Benedito, entre eles o maior especialista do mundo no setor, o colombiano Julio Cantillo Simanca. “Ele é o pai coruja de todas estas rosas”, resume Gabriela.

O pai das rosas: o colombiano Julio Cantillo Simanca foi o responsável pela formação dos quatro polos produtores de flores para exportação no Ceará

Com a mudança no foco dos negócios, a CeaRosa cresceu. Em 2009, faturou R$ 1,9 milhão e neste ano o faturamento será 25% superior. “Ainda que o brasileiro não tenha o hábito de consumir flores, o mercado está crescendo”, diz Simanca, agrônomo responsável pela formação dos quatro polos cearenses. “Nosso foco está aqui agora, mas retomaremos as exportações quando o dólar estiver mais valorizado. Enquanto isso, continuamos a busca pela perfeição”, emenda. Segundo Gilson Gondim, presidente da Câmara Setorial de Flores do Ceará, entidade que reúne 250 produtores de flores, a média de consumo do produto no Brasil é de US$ 5/habitante/ano, enquanto na Holanda, é de US$ 100/habitante/ano. “Os polos produtores de flores cearenses foram criados visando o mercado externo e seguimos este foco, mas, com o desenvolvimento do setor, o mercado interno despertou”, diz ele. Holanda e Estados Unidos são os países mais interessados em comprar as rosas nacionais.

 

Produzir flores no Brasil ainda é caro. Além do investimento em estufas climatizadas, por volta de R$ 350 mil, para ter o direito de comercializar as variedades, desenvolvidas por empresas de pesquisa europeias, o produtor rural desembolsa US$ 1/ planta. “Os briders são responsáveis por desenvolver as variedades que temos no mercado e estão protegidos pela Lei dos Cultivares”, explica Simanca, que testa as variedades por dois anos antes de dar o aval para os Selbach introduzi-las no mercado. Segundo ele, em um hectare podem-se cultivar 65 mil plantas. Cada uma produz, em média, 20 rosas/ ano e a cada 30 canteiros é necessário ter um funcionário. “O resultado é uma rosa grande, bonita e com maior durabilidade.” Todos esses cuidados eram um problema para os Selbach no início. “Só tínhamos funcionárias mulheres. Os homens daqui acreditavam que se trabalhassem com flores, ficariam afeminados”, lembra Gabriela. “Mesmo com tantos itens que pesam no preço, o consumo interno aumentou.” Para atender à demanda, ela tem que manter um estoque mínimo de quatro mil pacotes/semana. “Há alguns períodos em que faltam rosas no mercado interno como o Dia das Mães, Dia dos Namorados, Natal e o Dia Internacional da Mulher”, revela Gabriela. No Brasil, a demanda maior é do setor de decoração e posteriormente, o de distribuição e floricultura.

Delicado e caro

Os botões pedem cuidados manuais diários para atender às exigências do mercado. As rosas vermelhas crescem protegidas por redes, que são retiradas apenas na véspera da venda

 

Na linha de produção, mãos femininas cortam e embalam os pacotes com as flores selecionadas. Após essa etapa, as rosas seguem para seus destinos, via aérea ou rodoviária