O mercado da carne bovina no Brasil está num momento que podemos chamar sellers’ market, ou um mercado de vendedores. Prova disso é que mesmo em plena safra do boi os preços seguem subindo. De acordo com o Cepea, o preço do boi gordo em janeiro fechou em média de US$ 53,96 a arroba, praticamente 25% mais alto que a média para o mês dos últimos cinco anos – US$ 43,26/@. Com preços altos e um mercado em alta, esta é a melhor hora para a cadeia investir em transparência e comunicação. Mas por que isso é necessário agora?

Quesitos socioambientais têm ganhado cada vez maior importância para os compradores de produtos do agronegócio brasileiro. No Brasil o boletim CiCarne – Centro de Inteligência da Carne da Embrapa, de 1 a 7 agosto de 2020, divulgou os resultados do estudo Como Será o Mercado Consumidor de Carne Bovina em 2040?. Este estudo traz pontos interessantes sobre mudanças no comportamento dos consumidores de carne nos próximos anos. Um dos desafios que o mercado vai enfrentar é um consumidor cada vez mais exigente e atento às questões como bem-estar animal, adoção de práticas sustentáveis de produção e redução das emissões de gases do efeito estufa. No mercado internacional um bom exemplo é o que já acontece no comércio de frutas. Em 2019, dos dez maiores compradores de frutas do Brasil cinco eram da Europa; eles compraram US$ 616 milhões ou 77% do total exportado, e têm tolerância zero com qualquer resíduo de defensivos agrícolas. Outro exemplo vem da França onde leis como a Devoir de Vigilance (Dever de Vigilância, tradução livre), responsabiliza as empresas francesas pela compra e comercialização de produtos que causem danos ambientais e sociais. Trata-se de uma lei bastante ambiciosa, que se aplica às operações dessas empresas na França assim como em outros países, e está servindo de modelo para uma lei semelhante para toda a União Europeia.

“A rastreabilidade e a transparência na cadeia produtiva ajudarão a mostrar os bons atores e destacar o grande trabalho que está sendo feito” (Crédito:Istock)

Esses são sinais claros que os consumidores querem se sentir bem com o que compram e com o que comem. Eles querem transparência e rastreabilidade para que possam ter certeza de que o que consomem é sustentável e não têm ligações com práticas prejudiciais que não condizem com os padrões atuais. O consumidor pede mais do que apenas informações genéricas sobre quanto o Brasil preserva, ele quer saber de cada propriedade rural. Como os mercado de carne e couro bovinos são muito competitivos, tanto no nível nacional como internacional, a pecuária brasileira tem aí uma grande oportunidade. Os produtores já vêm melhorando a produção em ritmo acelerado, agora a cadeia como um todo precisa trabalhar a comunicação com os consumidores para manter e ampliar seu mercado consumidor. As ferramentas para isso nós já temos. O Brasil tem o Cadastro Ambiental Rural (CAR), uma grande base de dados sobre as condições ambientais de todas as propriedades rurais. Agora o CAR precisa ser validado e, se for o caso, os produtores devem fazer os ajustes necessários para que possamos divulgar os resultados. Além disso, o Grupo de Trabalho da Pecuária Sustentável, GTPS, já tem o Guia de Indicadores da Pecuária Sustentável que, num futuro breve, poderá ser usado para reportar progresso nos diversos elos da cadeia.

A conclusão é que na soma de demandas dos consumidores e ferramentas para demonstrar resultados, temos o que é necessário para fazer tudo isso acontecer. A rastreabilidade e a transparência na cadeia produtiva ajudarão a mostrar os bons atores e destacar o grande trabalho que está sendo feito por agricultores e pecuaristas. Só assim a produção do século 21 irá encontrar os consumidores do século 21.