Na vida, é muito importante aprender com os nossos erros, mas aprender com os erros dos outros é melhor. Tenho me lembrado muito deste sábio conselho nos últimos tempos, sobretudo quando penso neste momento atual do agronegócio. Quais reflexões podemos tirar desta crise que afeta toda a economia nacional?

De certo, o setor vai precisar de muita disciplina para fazer esta reflexão, pois o contexto não ajuda: enquanto alguns estudos sugerem uma retração de 10% do PIB brasileiro em 2020. O PIB agropecuário deve crescer 2,4% de acordo com o IPEA. Nada mal. Cito o caso da soja: nos últimos dias, com o câmbio a mais de R$ 5,70, a soja nacional ganhou ainda mais competitividade e os preços bateram recordes, ultrapassando R$ 110 a saca. Céu de brigadeiro!

Por que, então, é bom parar para refletir ao invés de comemorar frente a este cenário tão favorável do agronegócio? Defendo que é justamente nesta hora que precisamos aprender com os erros dos outros e nos blindarmos para as situações difíceis que certamente o setor enfrentará no futuro. Todos conhecemos a natureza cíclica do mercado agrícola. Então, listei cinco temas para reflexão diante desta crise.

Caixa e crédito
Se alguém ainda tinha dúvidas, o caixa realmente é o rei. Justamente para financiar o crescimento e, nos momentos de crise ou retração na demanda e nos lucros, ele se torna ainda mais fundamental por ser uma “reserva técnica”. Lembre-se: tentar empréstimos e financiamentos quando já não há mais caixa e o endividamento é alto significa uma estratégia arriscada.

Pensando que a crise será difícil a todos, para aqueles que a iniciaram com uma situação de caixa mais equilibrada, os efeitos serão menores. Então, não seria este o momento ideal para antecipar o pagamento de empréstimos e financiamentos? Quais ações estão sendo tomadas para preservar o caixa agora e no futuro? A gestão do negócio tem objetivado a geração de caixa?

Retenção de lucros
Há um dilema histórico e muito comum entre os empresários: quanto do lucro do meu negócio devo retirar para mim e quanto devo reinvestir no negócio (retenção)? Sabendo da natureza cíclica do agronegócio, é preciso refletir que safras mais difíceis virão nos próximos anos antes de termos novamente essas ótimas. Pensando nisso, não seria este o melhor momento para investir em tecnologia e em armazenamento, visando aumentar a eficiência das operações? Quanto deveríamos reter em caixa para evitarmos a necessidade de endividamento na próxima queda do mercado?

Diversificação
É preciso focar em três pilares: geração de caixa, aumento do valor da empresa e gestão (leia-se minimização) de riscos. Um dos problemas comerciais que encontro com frequência é a concentração exagerada, que pode ocorrer com a grande dependência de um grupo de clientes, com a venda de um produto ou serviço específico ou ainda quando há concentração de um modelo de negócio específico.

Ao passo do inesperado ocorrido com a pandemia, que afetou sem precedentes diversos setores, o que aconteceria no caso do surgimento de uma praga ainda desconhecida com potencial de trazer sérios prejuízos em algumas safras? Como proceder diante deste cenário?

Pense que este é o momento oportuno para refletir sobre como diminuir o risco do negócio através de uma maior diversificação. Que tal montar uma pedreira em parte da terra que não está sendo utilizada ou fazer um centro de turismo dentro da propriedade, sendo própria ou terceirizada?

Redução de custos e despesas. A importância dos investimentos
Gosto muito da frase “custo é como unha, tem quer cortar sempre”. No início da crise do coronavírus, quando ninguém sabia ao certo a dimensão que ela tomaria, todos focaram na redução de custos e despesas. Foi interessante notar que gastos “impossíveis” de serem eliminados ou reduzidos foram sumariamente cortados nos últimos dias.

Sabemos que no agronegócio a redução dos custos passa com frequência por um uso cada vez maior da tecnologia: menos despesa e mercadorias de melhor qualidade. Sendo assim, já se perguntou quanto do lucro desta safra será direcionado para investimentos visando a redução futura de despesas, assim como para melhoria da eficiência operacional?

Planejamento
Iniciamos o ano em um ambiente de relativo otimismo, na expectativa de que teríamos um crescimento e, em poucos meses, o coronavírus mudou radicalmente o cenário mundial, o brasileiro incluído. Nesta hora, alguém poderia questionar a validade de um planejamento de longo prazo. Afinal, partindo de uma visão um pouquinho míope, “para que gastar tempo planejando, já que as coisas mudam o tempo todo?”. Minha resposta é: justamente porque as coisas sofrem alterações a todo momento, que é fundamental nos dedicarmos ao planejamento do futuro dos negócios.

Seguramente quem se preparou, mesmo não prevendo os impactos do Coronavírus, está sofrendo menos os efeitos desta crise. Porém, quem não planejou quando os ventos ainda estavam favoráveis, agora está apagando incêndios e lutando pela sobrevivência dos seus negócios.

E você? Já pensou no seu plano de sucessão, no seu planejamento tributário, e na sua gestão de riscos? E na expansão e melhoria do seu negócio? Para quem ainda não deu início à essa reflexão, faça! Antes tarde do que nunca, porque depois do impacto da covid-19 em escala mundial temos certeza de que, daqui por diante, não saberemos quando uma crise pode chegar e qual sua dimensão.

* Sérgio Ferreira é consultor focado em gestão com resultados e conselheiro formado pelo IBGC.