A agricultura digital já é uma realidade no País e a tendência é que ela se desenvolva ainda mais. Não é à toa que empresas como a americana Climate, da Monsanto, aportou no Brasil no final de 2016. O País é um grande celeiro para o consumo e a produção de inovação tecnológica no agronegócio. É nesse ambiente que nasceram startups, como a especialista em irrigação Agrosmart; a Promip com o seu controle biológico de insetos e doenças; a Strider no monitoramento digital de pragas, e a Aegro, com uma ferramenta de gestão digital descomplicada para as fazendas. Todas elas foram financiadas pelo fundo de capital de risco SP Ventures, com sede em São Paulo. “Estamos investindo em 15 startups agrícolas”, diz Thiago Lobão, sócio e um dos diretores do fundo. “Teremos outros investimentos no agronegócio que vamos anunciar ainda neste ano”. Hoje, a SP Ventures é a que mais investe em startups agrícolas. Por trás dela está o Fundo de Inovação Paulista (FIP), que conta com investidores institucionais do governo federal e de São Paulo, como o Desenvolve SP, o Finep, a Fapesp e o Sebrae-SP, além de investidores privados, como o espanhol Banco de Desenvolvimento da América Latina (CAF) e a paulistana Jive Investments. Segundo Lobão, o aumento de investimentos em agtechs no País é certo. A ideia é sair de um fundo de R$ 107 milhões na SP Ventures para R$ 300 milhões em 2018. Confira o que está por vir:

Para onde vai a SP Ventures em 2018?

Queremos criar um diálogo entre o mundo do agronegócio e o mundo das finanças. Para nós, essa é uma das principais pontes do negócio.

Por quê?

Porque hoje existe uma disparidade da cadeia agrícola com o mercado de capitais. O que se tem muito é uma cadeia de crédito bem desenvolvida. Mas existe uma série de outros produtos financeiros no mercado, para diversos setores produtivos. A ideia é fazer com que esses outros instrumentos financeiros fiquem cada vez mais disponíveis para os produtores rurais.

De quais ferramentas o sr. se refere?

Fundos de participação, por exemplo. São fundos que compram o porcentual de empresas. Hoje, já há alguns fundos comprando participações em operações agrícolas, interessados no setor de insumos. Com isso, a SP Ventures passa a ser o primeiro fundo a se especializar no agronegócio. A ideia é dar mais musculatura a esse tipo de investimento. Chamamos isso de capital empreendedor, que é um mercado muito promissor.

Qual o retorno nesse segmento?

Hoje, o investimento de capital privado no Brasil está dando algo em torno de 25% a 30% ao ano. Mas, no caso de investimentos em empresas de inovação e tecnologia no agronegócio, podemos ir além disso. O retorno pode chegar até 45% ao ano por cada real investido.

O agronegócio tem chamado a atenção dos investidores?

Sim, o Brasil tem muita vocação. Do ponto de vista da pesquisa científica, do desenvolvimento de tecnologia agrícola, o País é muito forte. Não somente pelo tamanho do mercado, mas por ter uma ciência aplicada comparada ou superior a de outros polos de desenvolvimento global.

Qual a posição do Brasil no mercado global de agtechs?

Não temos um posição clara, mas o Brasil está entre os quatro mais importantes do mundo em agtechs, junto com os Estados Unidos, Israel e o Canadá. Claramente, o mercado americano é o principal no mundo. Israel parece estar na segunda posição, talvez em quantidade de startups. Agora, se pegarmos a cadeia alimentícia e olharmos as soluções para restaurantes e até mesmo a cadeia logística que envolve o agronegócio, temos também a China e a Europa se destacando bem. Mas, se olharmos soluções para dentro da porteira, eu diria que o Brasil é um grande competidor.

O que tem levado as agtechs brasileiras a ganhar o mercado lá fora?

Isso é surpreendende e não acontece em outro setor. É muito difícil desenvolver uma fintech e ir lá bater na porta do mercado europeu, por exemplo. Ou mesmo ir nos Estados Unidos e dizer que sua fintech é melhor que as deles. Mas, ao criarmos uma solução agrícola, exportamos isso facilmente. O Brasil é respeitado no mercado de agtechs porque tem apresentado muitas tecnologias disruptivas. Por exemplo, os protocolos de conectividade da Agrosmart, a lógica agronômica adotada pela Aegro, ou a modelagem agronômica por trás dos mapas de fertilidade do sistema da Inceres. Temos uma tecnologia de ponta igual ou até superior às agtechs americanas, por exemplo.

“O Brasil está entre os quatro mais importantes do mundo em agtechs, junto com os Estados Unidos, Israel e o Canadá”

Qual o futuro desse movimento?

O Brasil pode ser o grande polo de tecnologia e inovação agrícola global. Eu acho que de fato isso vai acontecer. Acredito que, assim como existe nos Estados Unidos o polo empreendedor do Vale do Silício, o Brasil tem polos importantes se consolidando como um chamariz de desenvolvedores de tecnologia. Não temos um só vale, mas vários, onde as aplicações de tecnologia agrícola estão nascendo. Temos a Esalq, na região de Piracicaba, no interior de São Paulo. Nessa região também há outras iniciativas, como o Agtech Garage, o Pulse da Raízen e a Usina de Inovação. A região deve se configurar como um celeiro de desenvolvimento para a internet das coisas (IoT). Há também polos na cadeia de biotecnologia, como Jaboticabal, também em São Paulo. Em outras partes do País, mais iniciativas estão despontando, como o Agrihub de Cuiabá, uma iniciativa da Federação de Agricultura e Pecuária do Estado de Mato Grosso. Temos movimentos acontecendo em Londrina, no Paraná. A cooperativa Frísia está entrando para esse mercado digital. Na agropecuária ela é um exemplo. Na Bahia também há coisas interessantes acontecendo. Hoje, por todos os cantos do País vemos sementes de uma agricultura cada vez mais digital.

O País pode passar os Estados Unidos nesse movimento?

Não sei. Mas hoje posso dizer que o Brasil e os Estados Unidos competem pela liderança no comércio de commodities agrícolas. E se existe abertura e um grande volume de dinheiro no mercado do agronegócio tradicional, é natural que tenhamos um desenvolvimento equiparado ao dos Estados Unidos.

Onde estão as oportunidades para mais inovações nesse setor?

Na área de tecnologia da informação há um espaço muito legal para startups agrícolas. O foco é em rastreabilidade de insumos e commodities. Existe um espaço muito grande o comércio digital. Se olharmos a cadeia de biotecnologia temos um espaço gigante em negócios que envolvam a genômica de plantas. Principalmente em inovações focadas em estresse abiótico, com variedades que consigam manter ou superar a atual produtividade, com menos uso de água ou de fertilizantes, por exemplo. Na pecuária também há espaço para inovação. Um exemplo é o sensoreamento no campo. É preciso ir além dos brincos de identificação dos animais e criar equipamentos de internet das coisas que vão ajudar a monitorar o rebanho brasileiro.