No auge da greve dos caminhoneiros, no final de fevereiro, 129 trechos de estradas federais e estaduais foram paralisados em 14 Estados. As maiores manifestações aconteceram em Rio Grande do Sul, Paraná, Santa Catarina, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. No mês passado, a partir do dia 3 de março, os protestos foram cedendo, após a sanção da nova Lei dos Caminhoneiros pela presidente Dilma Rousseff. Mas nada garante que o impasse tenha terminado. Ainda há muito descontentamento, tanto da parte dos caminhoneiros, quanto dos produtores. “A lei foi um grande avanço, pois garante a flexibilidade dos horários de descanso, mas só isso não basta”, diz Nélio Botelho, presidente do Movimento União Brasil Caminhoneiro (MUBC), que representa cerca de 1,1 milhão de motoristas. O MUBC ainda espera pela elaboração de uma tabela de preços de frete e de uma planilha de custos.

Mais do que uma luta por melhoria da receita do setor de cargas, o movimento mostrou como o Brasil é um País com excesso de caminhões nas estradas. Pelas contas do engenheiro de transportes Neuto Gonçalves dos Reis, diretor técnico da Associação Nacional do Transporte de Cargas e Logística (NTC&Logística), há 300 mil veículos a mais rodando pelo Brasil, um excedente de 13% sobre a frota atual de 2,3 milhões de veículos. “Há mais caminhões do que carga para ser transportada”, diz Reis.

A lei da oferta e da procura reverteu o jogo do frete nos últimos anos: o que antes era um fardo pesado ao produtor rural, com o preço nas alturas da tonelada transportada, virou um péssimo negócio para o caminhoneiro, que viu esse preço despencar. “Hoje, o setor está trabalhando praticamente no vermelho”, afirma Botelho. Em março de 2013, o frete de cerca de dois mil quilômetros, entre Sorriso, no coração de Mato Grosso, até o porto de Santos, no litoral paulista, chegou a um pico de R$ 320 por tonelada transportada. Segundo o Instituto Matogrossense de Economia Agrícola (Imea), o mesmo trecho podia ser contratado por uma média parcial de R$ 245, no mês passado, em queda equivalente a 23%. “Na média, o preço do frete caiu cerca de 15% no País”, diz a economista Natália Orlovicin, analista de mercado da consultoria INTL FCStone, de Campinas (SP).

Em relação às exportações de grãos, principalmente de soja, os embarques em fevereiro caíram pela metade. Foram exportados 1,6 milhão de toneladas, ante 3,3 milhões em fevereiro do ano passado. Porém, já era esperada uma queda do embarque, em função do atraso na colheita do grão. Mas a expectativa no setor é grande para os próximos meses, período no qual os portos trabalham a todo vapor. Entre os produtores e entidades do setor há apreensão de que os protestos voltem a acontecer. Motivos não faltam. Ainda há fagulhas de crise acesas por conta da pressão dos caminhoneiros em fixar os preços de frete. As primeiras conversas pós-greve da categoria com o governo não foram bem recebidas pelos motoristas e, por isso, novas manifestações não estão descartadas.

Sobre a criação de uma tabela de preços para o frete, representantes dos produtores rurais e da agroindústria já sinalizaram que não aceitam qualquer proposta. Entre elas, está a Associação dos Produtores de Soja do Brasil (Aprosoja Brasil). De acordo com o presidente da entidade, o produtor rural Almir Dalpasquale, a adequação dos preços tem de ser alcançada pela oferta e procura. “A criação de um frete mínimo, embora pareça nesse momento uma solução para os caminhoneiros, pressionará o preço dos fretes no pico do escoamento para um teto maior, onerando o transporte de grãos no País”, diz Dalpasquale. Para Reis, da NTC&Logística, tabelas impositivas de fretes são problemáticas porque seria muito difícil fiscalizar o seu cumprimento. “Além do mais, qualquer tabelamento de preços é inconstitucional, pois afronta o princípio da livre iniciativa.”