Fôlego financeiro: preços internacionais mantêm a rentabilidade do açúcar, ante real forte

Fôlego curto: o dólar fraco prejudica a cultura da soja, mais dependente do câmbio

O mês de outubro foi marcado por uma sequência de notícias atreladas ao câmbio. A de maior ressonância, com certeza, foi a taxação de 2% de Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) no investimento estrangeiro em ações no País. A medida foi uma clara reação do governo para conter a queda contínua do dólar.

No entanto, a medida apenas a ameniza, evitando temporariamente que a desvalorização da moeda americana seja ainda maior. Mas o fato é que o dólar como está, no patamar de R$ 1,70, deixa o agronegócio em situação delicada. E há analistas prevendo a sua chegada a R$ 1,40.

“Se isso acontecer, vai ser uma situação de derretimento do dólar não só em relação ao real, mas em relação às outras moedas do mundo. Seria uma catástrofe”, opina José Vicente Ferraz, diretor do Instituto AgraFNP. O fato é que, quanto mais o dólar cai, mais espremidas ficam as margens do agronegócio, setor que tem sido o carro-chefe da balança comercial brasileira.

No ano passado, as exportações nacionais totalizaram US$ 197,942 bilhões. Deste montante, US$ 71,9 bilhões vieram do campo. Mas, com a valorização do real em relação à moeda americana, o setor tem pedido competitividade.

No caso dos produtores de grãos, a maior preocupação é quanto ao descasamento do câmbio da aquisição dos insumos com o da venda.

Os agricultores temem que, no ano que vem, no momento da comercialização, o dólar esteja ainda mais baixo. “Quanto maior o descasamento, pior será a rentabilidade porteira adentro.

Há produtor que comprou insumo com o dólar a R$ 1,90″, diz André Pessoa, diretor da Agroconsult. Como a rentabilidade do agricultor depende dos custos de produção e logísticos, não há como generalizar os efeitos do câmbio para todas as atividades e localidades.

“O dólar a R$ 1,70 pode ser ainda favorável a uma região e péssimo para outra”, explica Pessoa. Ferraz vai por esta mesma linha de raciocínio. “Se a moeda estabilizar em R$ 1,70, o produtor vai ter uma erosão da renda. Existe um prejuízo, mas é um prejuízo administrável”, diz.

Por ora, a única commodity que está com uma rentabilidade razoável, apesar da baixa do dólar, é o açúcar. O motivo é a alta dos preços. Em outubro do ano passado, o produtor de cana recebia cerca de US$ 210 por tonelada de açúcar exportado.

Neste ano, a mesma quantidade está sendo comercializada a US$ 485. Em contrapartida, culturas como milho e algodão já vêm enfrentando dificuldades há algum tempo, o que explica o recuo no plantio das duas commodities. No milho, as estimativas apontam que a área plantada pode encolher 35%. Na pluma, a queda pode ser de 15%.

No entanto, o governo tem se mostrado desconfortável com relação ao câmbio. Em declarações recentes, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, deixou claro este posicionamento ao falar do IOF. “Não vai mudar o fato de que o real é uma moeda valorizada, porque a economia é firme e sólida.

Porém, vai eliminar exageros, desequilíbrios que possam prejudicar a produção brasileira.” Mas os consultores são unânimes em dizer que o IOF ajuda, mas não resolve. Para o ex-ministro da Agricultura Roberto Rodrigues, a solução envolve a queda de juros e o aumento de produtividade, coisas que não se resolvem no curto prazo.

Ele ainda apontou outras medidas: “A desoneração das exportações, um aporte significativo de crédito na produção e a compra de dólar pelo Banco Central também poderiam ajudar.” Mas Mantega deixou claro que o espaço fiscal diminui e não há como desonerar as exportações. Neste cenário, resta ao produtor se preparar para mais um ano complicado.