O presidente Lula teve um papel decisivo no estímulo ao biodiesel, mas a aposta em algumas plantas minou o retorno dos empresários

Nova mistura, antes prevista para 2013, deve aumentar a produção para 2,4 bilhões de litros em todo o território nacional

O anúncio de que o governo federal poderá antecipar para 2010 a introdução do biodiesel B5 – mistura com 5% de óleo natural – nas bombas de todo o Brasil está agitando o setor de biocombustíveis. Antes prevista para entrar em vigor apenas em 2013, a nova mistura pode chegar já em janeiro, fato que deve elevar a produção nacional do combustível verde para cerca de 2,4 bilhões de litros ao ano, um adicional de mais de um bilhão de litros em relação ao produzido em 2009. A notícia animou os fornecedores, que já vêm se mexendo para aumentar a produção, mas trouxe à tona a antiga discussão sobre qual a melhor matéria-prima a ser utilizada. No início, a aposta era a mamona, vista como socialmente correta, uma vez que incluía pequenos produtores do Nordeste entre os fornecedores. O uso da oleaginosa, no entanto, não decolou devido ao alto custo de produção. Logo depois, uma mudança nas especificações da ANP praticamente desclassificou o óleo de mamona como matéria-prima. Diante das novas exigências, as empresas passaram a buscar fontes alternativas de energia, como o pinhão-manso, o girassol ou o algodão, mas a produção em si passou a ser focada em uma cultura bem mais conhecida: a soja.

A mudança fez com que as empresas revissem seus modelos de negócio e passassem a encarar o futuro com muito mais otimismo. “Os investimentos realizados na agricultura familiar objetivavam tornar o óleo de mamona o principal insumo para a produção do biodiesel, mas alguns fatores contribuíram para que isso não se concretizasse. Além da mudança da ANP, o óleo de mamona teve um aumento grande de demanda por outros setores da indústria e uma elevação de preço de mercado”, conta Charles Mann de Toledo, diretor-executivo da Brasil Ecodiesel, maior produtora de biodiesel do Brasil.

Ainda de acordo com o executivo, a produção da Brasil Ecodiesel já está baseada exclusivamente no óleo de soja. Mais barato, deverá reinar absoluto por mais alguns anos. “Nosso objetivo estratégico é a diversificação de matérias-primas, principalmente com o pinhão-manso, cultura que a companhia já vem testando há algum tempo. Mas ainda vai demorar para que a produção migre totalmente para o pinhão-manso”, completa Toledo.

“É possível utilizar a mamona para a fabricação de biodiesel”

Alberto Fontes, diretor de biodiesel da Petrobras Biocombustível, garante que a mamona segue nos planos da empresa

DINHEIRO RURAL – Já existe um consenso sobre a melhor a matériaprima a ser utilizada para a produção de biodiesel?

FONTES – Atualmente, as unidades estão rodando principalmente com soja, algodão e sebo bovino, mas, por termos usinas flexíveis, podemos trabalhar com outras oleaginosas, como mamona, girassol, macaúba ou dendê. Porém, as pesquisas na área de biocombustíveis não vão parar. Para os próximos cinco anos, estão previstos investimentos de US$ 530 milhões.

DR – A mamona foi mesmo vetada?

FONTES – Não. É plenamente possível a utilização do óleo de mamona para a produção de biodiesel, em mistura com outras matériasprimas, atendendo às especificações da ANP. O óleo de mamona, inclusive, possui propriedades positivas, como a redução do ponto de congelamento e o índice de iodo. Estes dois fatores tornam o produto, quando misturado com o biodiesel de soja, adequado às especificações europeias, por exemplo.

DR – O óleo de soja hoje utilizado para a produção do biodiesel não compete com a alimentação?

FONTES – Não podemos dizer que exista uma competição. Este não é um dilema do Brasil. A soja é produzida justamente para o mercado alimentício, pelo alto valor proteico de sua torta, o farelo de soja. O óleo de soja é um subproduto, situação idêntica à maioria das oleaginosas comestíveis, como o girassol, por exemplo. O Brasil possui aproximadamente 350 milhões de hectares de terras agriculturáveis e apenas 2% delas são utilizadas na produção de etanol e biodiesel.

DR – Quais as perspectivas para o biodiesel a partir de 2010, quando o B5 deverá chegar ao mercado?

FONTES – A utilização do biodiesel no Brasil ainda está em fase inicial. Estamos completando três anos desde a fase compulsória, iniciada em janeiro de 2008, com o B2. Portanto, o biodiesel tem um longo caminho a percorrer, como o desenvolvimento de alternativas de suprimento de oleaginosas regionais.

Atualmente, a empresa tem capacidade instalada para a produção de 640 mil m3 de biodiesel ao ano, mas vem trabalhando com ociosidade. Pelo contrato de venda estabelecido no último leilão da ANP, a Brasil Ecodiesel é obrigada a entregar apenas 57 mil m3 por trimestre. Com o aumento de 3% para 5% na mistura de biodiesel no diesel comum, a demanda deverá crescer 25%, e o volume extra seria obtido com um simples aumento de produção. O próximo leilão da ANP está previsto para ocorrer em outubro e já deve contemplar um volume suficiente para o abastecimento de B5 no primeiro trimestre de 2010.