Aos 64 anos, o agrônomo americano Robert Fraley traz em sua bagagem a paternidade das sementes geneticamente modificadas, criadas pela gigante americana de biotecnologia Monsanto, empresa comprada pela farmacêutica alemã Bayer por U$ 66 bilhões no ano passado. Fraley, vice-presidente global da Monsanto, e diretor geral de Tecnologia, está na companhia desde 1981, época em que ela começava a colher os primeiros resultados das pesquisas em engenharia genética aplicada à agricultura. Desde então, já assinou cerca de 100 publicações e pedidos de patentes de biotecnologias agrícolas. O pesquisador e executivo concedeu a seguinte entrevista à DINHEIRO RURAL:

Que elementos o sr. acredita que são preponderantes para acelerar a transformação pela qual a cadeia agrícola passa?

Ainda hoje os nossos alimentos e a forma como eles são cultivados estão atravessando uma evolução sem precedentes, graças aos incríveis avanços na ciência. Ao mesmo tempo, a agricultura está iniciando uma transformação muito necessária, alimentada por uma onda de novas startups, bem como por diversas fusões de empresas existentes e novas combinações de negócios. A combinação destes fatores está trazendo um pensamento inovador para a indústria, expandindo e diversificando projetos de pesquisa e desenvolvimento e aumentando os recursos disponíveis para financiá-los.

Quais serão os impactos dessas mudanças aos agricultores, indústria e consumidores?

Essas mudanças são boas para a indústria, os agricultores, os consumidores e absolutamente fundamentais para atender as necessidades alimentares de nossa crescente população mundial. No caso da fusão entre a Bayer e a Monsanto, em particular, significa mais inovações agrícolas que vão trazer benefícios para a cadeia produtiva, do produtor ao consumidor. As duas empresas têm produtos complementares. Juntas, elas podem melhorar o ritmo e o escopo da inovação, ajudando a identificar novas soluções para o campo.

Como o sr. analisa o portfólio das duas empresas?

O negócio da Monsanto está focado em sementes, em biotecnologia e nas ciências de dados. A Bayer tem um foco maior em ferramentas de proteção de culturas. Combinadas, elas ajudarão grandes e pequenos produtores a otimizarem soluções integradas e a melhorarem a rentabilidade e a sustentabilidade nas suas propriedades rurais. Isso porque haverá uma maior uma variedade de insumos, com foco mais preciso.

Em que medida essa combinação melhora o ritmo das inovações que vão ao campo?

Ao combinar as inovações em sementes e biotecnologia, com as novas ferramentas de proteção de culturas, vamos sim melhorar o ritmo das inovações agrícolas, por uma questão simples. Trabalhar juntos, como uma empresa, significa desenvolver ambos os produtos simultaneamente, reduzindo o tempo de desenvolvimento. Acredito que este tipo de trabalho coordenado, de pesquisa e de desenvolvimento, trará produtos melhores e mais sustentáveis para o campo, mais rápido do que nunca, ajudando os agricultores a melhorarem o uso dos recursos naturais em suas propriedades.

Como essa nova empresa pode atender os agricultores?

Ela se concentrará em investir, pesquisar e trazer inovações para milhões de agricultores em todo o planeta. A combinação criará oportunidades que nos permitirão aumentar os investimentos em pesquisa e desenvolvimento, em novas categorias de ciência de dados e de soluções biológicas melhoradas. Além de poder entregar essas soluções aos agricultores mais rápido do que qualquer um de nós poderia fazer sozinho. Outro fato é que a força comercial da Monsanto está nas Américas, enquanto a Bayer tem uma presença mais forte na Europa e na Ásia.

inovação: os investimentos em tecnologias agrícolas saltaram de US$ 400 milhões, em 2010, para US$ 4,6 bilhões em 2016
Inovação: os investimentos em tecnologias agrícolas saltaram de US$ 400 milhões, em 2010, para US$ 4,6 bilhões em 2016

O sr. acredita que os agricultores enxergam benefícios nesta fusão?

Quando converso com produtores em todo o mundo, fica claro que eles compreendem e apreciam o importante papel que a inovação tem desempenhado para melhorar a sua sustentabilidade, produtividade e rentabilidade. Quando algumas empresas começam a inovar, isso incentiva outras empresas a aumentarem seus investimentos em pesquisa e desenvolvimento, para manterem-se competitivas. Foi exatamente isso que aconteceu quando as culturas transgênicas foram introduzidas, uma tecnologia da qual eu tenho orgulho de dizer que tive uma participação em seu desenvolvimento.

Qual é o atual patamar de investimentos em pesquisa e desenvolvimento no setor agrícola?

Desde a introdução das culturas transgênicas houve um aumento constante nos investimentos públicos e privados em pesquisa e desenvolvimento. Mas nos últimos anos o investimento global disparou. Em 2010, os investimentos de capital de risco em tecnologias agrícolas totalizaram cerca de US$ 400 milhões, mas a partir de 2015, o nível de investimento saltou para US$ 4,6 bilhões, de acordo com o Relatório AgTech Investing publicado pela AgFunder Inc.

Ele está onde é necessário para aumentar a inovação na agricultura?

Segundo o relatório AgTech Investing, em 2016, mais de 1,3 mil empresas iniciantes estavam envolvidas no ecossistema agrícola, incluindo mais de 130 entidades diferentes que submeteram produtos biológicos para a aprovação regulatória nos últimos três anos. Embora este realmente seja um progresso incrível, acredito que nossa indústria ainda não está onde ela precisa estar, quando comparada a indústrias como a farmacêutica, a de ciências de dados e a automobilística.

Por quê?

A agricultura permanece altamente fragmentada. É composta por por quase quatro mil empresas, o que significa que relativamente poucas empresas agroalimentares têm a escala, a experiência em pesquisa e desenvolvimento e recursos financeiros para investir, significativamente, em tecnologias avançadas.

E o quê a indústria agrícola precisa para estar bem posicionada?

Já que outros setores da economia aumentaram os seus investimentos em pesquisa e desenvolvimento, a agricultura tem a responsabilidade social de fazer o mesmo, sobretudo se queremos garantir aos nossos filhos, netos e aos mais de nove bilhões de pessoas que habitarão a terra em 2050 que possam desfrutar de alimentos mais seguros e mais acessíveis. Estou convencido de que as mudanças dinâmicas que estão ocorrendo no setor agrícola são a chave para impulsionar a inovação que os agricultores precisam e francamente merecem.