Agronegócio direto | médias empresas

Dentro de pouco mais de um ano, o Laticínios Gonçalves Salles, fabricante de derivados lácteos e cafés especiais, entrará para o seleto grupo de empresas brasileiras centenárias. Nessa mais alta classe, já estão ícones como as gaúchas Gerdau e Salton, as catarinenses Hering e Malwee, as paulistas Votorantim e Klabin, e a paraense Matte Leão. Não há dados oficiais sobre o número preciso de integrantes desse clube de empreendimentos seculares. Há, no entanto, um número que mostra a relevância de uma companhia integralmente nacional chegar aos 100 anos.

O dado mais recente do IBGE, de 2016, mostra que a vida média das empresas brasileiras é de apenas 11 anos. E isso num país com cerca de 4,5 milhões de companhias privadas. “O segredo da nossa longevidade é a qualidade dos nossos produtos”, afirma Geraldo Resende Filho, 71 anos, presidente da Gonçalves Salles.

Segundo ele, a preocupação com volumes de produção e receita não é o foco principal da empresa mineira. “Os resultados aparecem como consequência”, diz. De fato, eles aparecem. Sem dívidas e com finanças sólidas, a Gonçalves Salles é a grande campeã do prêmio AS MELHORES DA DINHEIRO RURAL de 2018, na categoria Agronegócio Direto – Médias Empresas. A companhia também ganhou por Melhor Gestão Financeira, na mesma categoria, além de ser a campeã no setor de Laticínios (confira na página 122). Fundada em 1920 e sediada no município de São Sebastião do Paraíso (MG), a Gonçalves Salles é a fabricante da manteiga mais famosa do País, a Aviação. Mas há outros produtos que foram sendo incorporados ao portifólio, como queijos, requeijões, doce e cremes de leite, e, nos últimos 5 anos, uma linha de cafés especiais. “A meta é ter esses produtos cada vez mais presentes nas gôndolas dos supermercados. Mas a manteiga ainda é o nosso carro-chefe”, destaca Resende Filho.

Não é por menos que o faturamento da Gonçalves Salles mais do que dobrou nos últimos 6 anos, chegando a quase R$ 250 milhões em 2017. Em relação a 2016, essa receita cresceu 30,8%. Nos demais indicadores financeiros, a empresa mostrou como fazer bem a lição de casa. O lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização (Ebitda, na sigla em inglês) foi de expressivos R$ 29 milhões, o dobro do registrado em 2016. As dívidas caíram de R$ 834 mil, em 2016, para R$ 350 mil em 2017, que representava apenas 4,4% do total que a empresa tinha em caixa naquele ano.
“É um endividamento irrisório”, afirma Resende Filho. “Investimos prioritariamente com capital próprio, além de nos concentrarmos em uma gestão bem alinhada.” A empresa ainda está sob o controle da gestão familiar – Resende Filho é neto de um dos fundadores, Antonio Gonçalves, que criou a empresa ao lado de Augusto e Oscar Salles, pai e filho. De acordo com o atual presidente da companhia, um dos planos para o futuro é dar início à transição para uma gestão com profissionais do mercado. “A ideia é preservar a tradição da empresa, investindo em profissionalismo, mas sem alterar o que foi conquistado”, diz Resende. Não é difícil perceber o real motivo pelo qual a manteiga criada pela família conquistou tamanho respaldo no mercado consumidor, além de responder por 65% do faturamento da companhia mineira.

Produção local: um dos projetos da Xingu incentiva pequenos produtores rurais a plantar legumes e hortaliças, como beterraba, cenoura, cebolinha e coentro (Crédito:Roberto Castro)

O esmero na produção sempre foi – e continua sendo – a prioridade no processo industrial. “Conseguimos modernizar as etapas de fabricação, sem alterar o sabor do produto”, afirma Resende Filho. O volume é imenso. Somente no ano passado, foram processadas 9 mil toneladas da manteiga Aviação. Para 2018, a projeção é fechar o ano com na casa das 11 mil toneladas. Hoje, com 280 funcionários, a Gonçalves Salles estuda um projeto de médio e longo prazo para a construção de uma nova fábrica, próxima à região de São Sebastião do Paraíso. “Já temos o terreno”, diz Resende Filho. “O plano é migrar toda a produção para essa nova unidade.”

Outra companhia que também está na busca por bons resultados é a Agrícola Xingu, o braço agrícola do grupo japonês Mitsui no País. A Xingu cultiva soja, milho e algodão, em 45 mil hectares espalhados pelos Estados da Bahia, Minas Gerais e Mato Grosso. A companhia é a campeã em Melhor Gestão Corporativa, na categoria Agronegócio Direto Médias Empresas. A Xingu faturou R$ 298 milhões no ano passado, 26,1% a mais do que em 2016. Mas o foco da companhia não está somente nos números financeiros, segundo o executivo japonês Takehiko Shimada, 58 anos, diretor-presidente da Agrícola Xingu. “A tendência, realmente, é crescer. Mas isso não será feito no curto prazo”, afirma Shimada. “Vamos crescer em períodos em que identificarmos oportunidades. O que estamos priorizando agora é um relacionamento mais próximo com as comunidades locais onde estamos produzindo”, declara o executivo.

Um belo exemplo disso é o trabalho que a empresa tem realizado com uma comunidade de 65 famílias de pequenos produtores rurais, no município baiano de Correntina. A iniciativa foi intermediada pela Central das Associações de Agricultores Familiares de Correntina (Caaf), que reúne cerca de 20 associações e mais de 500 produtores locais. Desde o início de 2017, a Xingu estruturou, junto aos pequenos produtores da região, um projeto de cultivo de diversos legumes e hortaliças.

Nesse programa, são plantados 21 produtos, como beterraba, cenoura, cebolinha, salsa e coentro. Graças ao projeto, cerca de R$ 420 mil são injetados na economia local, segundo Hannes Tavares de Moura, presidente da Caaf. “A empresa Xingu doou kits com sementes, instruções de plantio, equipamentos de irrigação por gotejamento e ferramentas”, conta Moura. “Os membros da comunidade, que já criavam frango caipira, passaram também a colher alimentos”, declara.

Olho no social: com faturamento de R$ 298 milhões, a Agrícola Xingu montou projeto com pequenos produtores rurais. “Queremos melhorar nosso relacionamento com as comunidades locais”, diz o diretor-presidente da empresa, Takehiko Shimada (Crédito:Divulgação)

Segundo o diretor administrativo da Xingu, Sergio Della Libera, a empresa estruturou um contrato de compra de parte desses alimentos, incluindo a produção de frangos, para a refeição dos funcionários que atuam na região. “Criamos um círculo virtuoso”, diz. “Ajudamos a economia local e beneficiamos nossos trabalhadores com uma refeição de qualidade.”

Além de garantir uma alimentação saudável a seus funcionários, a Agrícola Xingu também realiza um esforço contínuo no treinamento e na capacitação de sua equipe sobre segurança no trabalho. Atualmente, são 500 trabalhadores em operações no campo e 60 no escritório, na sede da empresa, na capital paulista. Nas atividades de campo, o cuidado é redobrado, com atenção total ao uso de equipamentos de proteção individual (EPI) e na adoção de boas práticas agrícolas. “Não há um dia sequer em que não sejam feitas reuniões sobre esses temas”, diz Della Libera. “Isso é feito antes mesmo de o trabalhador começar suas tarefas no campo”, garante o executivo. Além disso, a companhia desenvolve uma programação de treinamentos que vão do cuidado com o manuseio de agroquímicos à operação de máquinas agrícolas. “Isso faz com que a empresa tenha muitos funcionários profissionalizados, sabendo o que devem fazer e como fazer”, destaca Della Libera.