OBSERVAÇÃO Diplomatas da Indonésia, EUA e Coreia do Sul na
Embrapa e no Grupo Bom Futuro (Crédito:Wenderson Araujo)

A como o agronegócio de fato trabalha sob óticas tão diversas como regulamentações e sustentabilidade. “Essa visita é uma maneira de apresentar o Brasil de uma forma muito eficaz”, afirmou à RURAL o vice-presidente de Relações Internacionais da CNA e presidente da Federação da Agricultura do Estado do Rio Grande do Sul (Farsul), Gedeão Silveira Pereira.
Como destino, o Mato Grosso ciceroneou os convidados mostrando seu poder. Terceiro maior estado brasileiro com 903,2 mil km2, tem 60,6% do território coberto por mata nativa, 13,3% dedicado à produção agrícola, 25,1% à pecuária e ainda assim é reconhecido por ser o maior produtor de soja, milho e algodão, além de ter o maior rebanho bovino do País com 32 mil cabeças de gado. Performance que, ressaltou Normando Corral, presidente da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de Mato Grosso (Famato), “avançou respeitando uma rigorosa legislação ambiental e seguindo conceitos técnicos e científicos”.
Os recados dados foram atentamente observados pelos visitantes que, ora em perguntas feitas durante as visitas técnicas e apresentações, ora em conversas com a RURAL, externalizaram suas impressões sobre o que viram durante a imersão. Aqui, destaque para quatro grandes agendas de interesse: a performance do agro nacional, investimentos externos, infraestrutura e, não menos importante, sustentabilidade.

A exportação total do agro em 2021 foi de US$ 120,6 bi

SUSTENTABILIDADE Na Embrapa Agrosilvipastoril, visitantes conheceram de perto o modelo ILPF (Crédito:Wenderson Araujo)

PERFORMANCE “Fiquei extremamente surpreso com a escala, com a tecnologia empregada e com as técnicas ambientalmente responsáveis adotadas no Brasil”, afirmou à RURAL o embaixador da Coreia do Sul, Ki-Mo Lim, enquanto andava em meios aos campos de testes da Embrapa Agrossilvipastoril, em Sinop, cidade a 479,4 quilômetros de Cuiabá. O diplomata era um dos mais animados do grupo e surpreendeu a todos ao, poucos minutos antes da programação oficial ser aberta, pegar o microfone e cantar em bom português o clássico Pense em Mim, da dupla Leandro e Leonardo. Mas seu foco não estava na música sertaneja e sim em entender como melhorar a relação bilateral dos dois países. Um dos aspectos no radar do diplomata era conhecer novas oportunidades para diversificar a pauta de importação das commodities brasileiras pelo seu país. “Temos grandes oportunidades não exploradas”, afirmou. Expandir essa relação interessa ao Brasil, que vendeu US$ 1,8 bilhão em produtos agropecuários para lá em 2019, volume considerado pouco perante o potencial de consumo do país asiático. Segundo o estudo Brasil e Coreia do Sul: Complementaridade que Merece Amplo Acordo, publicado pela CNA no ano passado, além de cereais, soja, carnes e café já embarcados, há um potencial imediato de exportação de ao menos 41 produtos agropecuários, mas com perspectivas de chegar a 250. A outra frente pela qual Ki-Mo Lim demonstrou interesse foi a de possibilidades de investimentos de capital externo no setor.

Investimentos externos

“A Coreia tem grande interesse em investir no País se houver condições e regras claras”, afirmou o diplomata. Em seguida, representantes da Austrália e da União Europeia também questionaram os líderes da indústria sobre condições para investimento no Brasil tanto na compra de terras como em logística e infraestrutura. A resposta veio em tom desanimador na fala de Normando Corral, presidente da Famato. “A questão da legislação [para compra de propriedades produtivas] não é fácil nem para brasileiro”, afirmou o executivo. “O primeiro passo é ter um bom advogado.” Ele não mentiu. Desde a década de 1970, a aquisição de terras por estrangeiros é regulada pela Lei 5.709, que traz regras como limite de aquisição de até 50 módulos fiscais (medida estipulada pelo Incra que varia de 5 a 110 hectares) e máximo de 25% do território do município sob controle de pessoas ou empresas de outras nacionalidades, sendo que cada país isoladamente não pode ter mais de 10% da área. Uma tentativa de mudar o cenário está em curso. Em 2019, o senador Irajá Silvestre Filho (PSD-TO) apresentou o PL 2.963, que tem como objetivo facilitar a compra, a posse e o arrendamento de propriedades rurais por não brasileiros no Brasil. Já aprovado no Senado, o texto aguarda aprovação da Câmara dos Deputados. Se depender do presidente de Jair Bolsonaro, no entanto, o projeto fica na gaveta. E assim sendo, as oportunidades de investimento externo têm na logística e infraestrutura um campo mais fértil.

Wenderson Araujo

LOGÍSTICA Durante a apresentação do Instituto Mato-grossense de Economia Agropecuária (Imea) o mapa da estrutura logística no Brasil deixou os convidados boquiabertos. O primeiro secretário da Índia, Anand Prakash, foi incisivo ao se manifestar. “Por que o Brasil tem tantos rios e não usa?”, afirmou. Já a representante dos Estados Unidos parecia perplexa diante da baixa extensão da malha ferroviária nacional. De acordo com o Imea, o modal ferroviário com participa com 20,7% da matriz brasileira de transporte. Mesmo número do ferroviário. Já o hidroviário representa somente 13,6%. Nos Estados Unidos, em contraste, cada um participa com 45%. Em resposta, o vice-presidente da CNA, Gedeão Silveira Pereira, atribuiu à rigorosa lei ambiental os entraves para o desenvolvimento do setor. “Um exemplo é a ferrogrão”, disse. A ferrovia de mais de 900 Km que ligará o estado do Mato Grosso ao porto do Pará, enfrenta embaraços na justiça exatamente na região de Sinop porque atravessa áreas de proteção ambiental. Ainda assim, os diplomatas demonstraram interesse em saber se, ao menos em logística, o Brasil estaria aberto ao capital internacional. E a resposta foi um sonoro sim. Uma realidade que mudou há poucos meses com a aprovação do Marco Legal da Ferrovia. Sancionado no dia 23 de dezembro de 2021, a legislação teve efeito imediato: no mesmo dia da sanção, o governo recebeu 64 requerimentos de empresas privadas interessadas. Os projetos apresentados adicionarão 15 mil km de ferrovias ao sistema atual e ultrapassam R$ 180 bilhões em investimentos. Um programa nacional que permite investir no País com segurança jurídica só não fez brilhar mais os olhos dos diplomatas do que as tecnologias brasileiras de aumento de produtividade do campo com técnicas de agricultura sustentável.

Após pandemia, CNA retoma programa de visitas técnicas de adidos estrangeiros e embaixadores ao campo brasileiro

Wenderson Araujo

SUSTENTABILIDADE A agenda de sustentabilidade foi, sem dúvida, uma das mais exploradas pelas lideranças brasileiras durante os cinco dias de AgroBrazil. Com críticas aqui e outras acolá sobre o rigor da legislação ambiental que estipula a obrigatoriedade de manutenção de vegetação nativa em 80% das propriedades rurais instaladas na Amazônia, e de 35% no Cerrado localizado dentro da Amazônia Legal, exemplos de boas práticas de agricultura sustentável foram sendo mostrados na lavoura e reforçadas no discurso. Destaque para visita à Embrapa Agrossilvipastoril, referência nacional na tecnologia Integração Lavoura Pasto e Floresta e técnicas associadas como plantio direto, medição de armazenagem de carbono no solo e agrofloresta. Para a adida agrícola da Espanha, Elisa Nieto, que não conhecia algumas das técnicas apresentadas, o compromisso com o meio ambiente não é uma novidade. “Sabemos que há uma legislação rígida no Brasil, mas alguns fatos acabaram prejudicando essa imagem”, afirmou sem entrar nos detalhes. “Vocês precisam mostrar melhor a tecnologia apresentada aqui ao mundo”, afirmou. “É impressionante ver o Brasil real, sustentável e tecnológico”.