A BRF, dona das marcas Sadia e Perdigão, anunciou ontem uma megaoferta de ações, que poderá girar até R$ 6,6 bilhões. A transação ainda precisará ser aprovada pelos acionistas da empresa, em assembleia marcada para o dia 17 de janeiro, mas o mercado já aposta que a Marfrig, do empresário Marcos Molina, poderá aproveitar o evento para ser o grande comprador dos papéis da operação. Desta forma, o frigorífico poderá ter mais poder dentro da companhia – seria até uma forma de a empresa atingir o controle do negócio sem ter de pagar um prêmio de preço por isso.

Neste ano, a Marfrig avançou significativamente no capital da BRF, por meio de diversas operações. Desta forma, já se tornou o principal acionista da companhia, com 31,66% de participação. Molina nunca escondeu seu interesse em avançar no capital da BRF, que há anos não possui um controlador e enfrentou uma série de dificuldades no mercado nos últimos tempos (leia box).

“Nunca pensamos que a Marfrig seria apenas um acionista passivo da BRF. A empresa tem um longo histórico de negócios agressivos e transformadores em fusões e aquisições, o que sempre apontou para uma agenda maior a caminho”, afirmam analistas do BTG Pactual, em relatório. No documento enviado a clientes, os profissionais afirmam que é natural esperar que, nesse aumento de capital, a Marfrig compre ações para não ter sua participação diluída, perdendo poder.

Antes do avanço da Marfrig sobre a BRF via Bolsa, as empresas chegaram a anunciar um acordo para juntar suas operações, em 2019. Na época, BRF e Marfrig concordaram em um prazo de 90 dias para uma combinação que criaria uma gigante global com mais de cem fábricas. No entanto, cerca de 40 dias após o primeiro comunicado, as empresas anunciaram conjuntamente a desistência do negócio.

Pílula de veneno

No estatuto da BRF há um item, comum nas empresas de capital aberto com controle pulverizado, que vinha travando um avanço ainda maior da Marfrig: a chamada “pílula de veneno” (poison pill, do inglês).

Esse instrumento, criado para proteger acionistas minoritários, prevê que um acionista que ultrapasse a participação de 33,33% na BRF é obrigado a lançar uma oferta de aquisição de ações para o restante da base acionária.

Além de ter de fazer essa grande compra de uma vez só, esse novo sócio precisaria pagar ainda um prêmio de 40% em relação à cotação média da ação da BRF nos 30 dias ou 120 dias anteriores – valendo o maior valor.

No cálculo do BTG Pactual, esse prêmio hoje estaria na casa de R$ 18 bilhões, valor que a Marfrig não estaria disposta a pagar.

No entanto, uma brecha surgiu com a oferta de ações, já que existe uma exceção à regra. Se um acionista passar esse limite de 33,33% por meio de uma oferta de ações, esse instrumento não é acionado, o que abre a porta para o avanço da Marfrig na BRF.

“Portanto, este anúncio pode ser uma forma de matar dois pássaros com apenas uma pedra: para atender à necessidade da BRF de desalavancagem (redução do endividamento), ao mesmo tempo que permite à Marfrig exercer maior controle sobre a BRF, ainda mais no caso de uma futura incorporação”, ainda de acordo com o BTG.

O mercado parece ver a operação como um “ganha-ganha”. A oferta de ações seria apenas primária, para injetar recursos no caixa da BRF e ajudá-la a reduzir seu endividamento. As ações da BRF chegaram a subir 11% na manhã de ontem, após o anúncio. O ânimo se reduziu durante a tarde, mas ainda assim ambas ainda tinham fortes altas.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.