Na primeira quinzena de maio, a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) divulgou mais uma estimativa da atual produção agrícola do País, como faz mensalmente. O ritual de anunciar recorde sobre recorde tem se tornado corriqueiro: neste ano, o Brasil fecha uma inédita safra de 184,1 milhões de toneladas de cereais e fibras. Entre eles, destaque para a soja, com 81,5 milhões de toneladas, e para o milho, com 77,9 milhões de toneladas, além do trigo, algodão, feijão e arroz. Mas, para o produtor, isso são águas passadas. Para quem está no campo, a safra 2013/2014, que começa a ser plantada no segundo semestre do ano, já está no radar. Ao produtor, interessa o que pode acontecer daqui para a frente. O atual cenário não é dos mais confiáveis para muitos agricultores. “Não sei bem o que fazer”, diz o sojicultor Zeca Viana. Além de cultivar 32 mil hectares com a oleaginosa em Primavera do Leste, em Mato Grosso, ele é deputado estadual pelo PDT e presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária. “Temos um grande problema para a safra 2013/2014”, diz Viana. “As tradings estão resistindo a fazer hedge porque não conseguem calcular o preço do frete, o que não ocorria nos anos anteriores.” Segundo ele, na safra cuja colheita está se encerrando, o hedge de sua produção chegou a 80%, com bastante antecedência. “Mas, para a safra 2013/2014, ainda não negociei nenhum contrato de venda antecipada”, afirma.

No início de maio, entre os dias 8 e 10, Viana era um entre 500 grandes produtores de soja, com áreas entre cinco mil e 180 mil hectares, convidados pela empresa de agroquímicos FMC, para participar da terceira edição do Clube da Soja no Guarujá (SP), evento que durou três dias, organizado om o objetivo de debater os caminhos da próxima safra. Para Glauber Silveira, presidente da Associação dos Produtores de Soja (Aprosoja), presente no encontro, não é somente a posição das tradings que está gerando incertezas em relação à próxima safra. De acordo com a análise da entidade, os produtores também têm evitado fechar negócios que envolvam a troca de soja por insumos. A preferência é por assumir a dívida pelos produtos necessários ao cultivo da lavoura e esperar que a oleaginosa suba de preço no futuro. “Há um conjunto de elementos que se somam”, diz Silveira. Entre eles, também estão as dificuldades de logística, que devem se acentuar, e os preços internacionais pressionados para o primeiro semestre de 2014, situação que não ocorreu no mesmo período neste ano. Por isso, entre os produtores, o ambiente é de cautela e preocupação com o que vai ocorrer nos próximos meses nos mercados da soja e do milho.

No início de maio, na Bolsa de Chicago, nos Estados Unidos, a grande responsável pelas oscilações mundiais da oleaginosa, a diferença de preços entre o contrato spot (para pagamento e entrega posterior) e os vencimentos do primeiro semestre de 2014 desencorajava as vendas antecipadas da próxima safra brasileira de grãos. Segundo análise da consultoria Safras & Mercado, as vendas antecipadas, realizadas até o mês passado, não passavam de 1% do total previsto para a próxima colheita, que deve ficar acima de 82 milhões de toneladas. Em 2012, nesta época, esse índice era de 14%. Com base nas últimas cinco safras, segundo a consultoria, a média para os primeiros cinco meses do ano é de 4% de hedge da colheita futura.

Para o consultor André Pessoa, da Agroconsult, a tendência para a soja no mercado internacional é de preços descendo a ladeira nos próximos dois a três anos, independentemente das decisões de compra e venda dos produtores. Ele prevê, para a safra 2013/2014, uma cotação de US$ 26,40 a saca de 60 quilos no mercado internacional. Esse patamar não é nada empolgante para os produtores que têm como referência, nos últimos tempos, o ótimo preço de US$ 37 a saca. Mas, para Pessoa, as atuais cotações ainda estão acima do que deve ser praticado na safra seguinte, a de 2014/2015. “Nossas análises apontam que a cotação deve oscilar entre US$ 22 e US$ 28 a saca”, diz. Segundo os estudos da Agroconsult, a média de preço da oleaginosa na próxima década não deve passar de US$ 28 a saca.

Para o milho, ao contrário da soja, que tem um cenário previsível, a volatilidade dos preços deve predominar nos próximos anos. Segundo Pessoa, a atual cotação internacional não é má, mas a logística deficiente no Brasil atrapalha o planejamento da venda da safra. Em maio, a cotação em Chicago era de US$ 17,60 a saca, e para setembro está em US$ 11. “Mas, como o custo no Brasil compromete a concorrência com outros mercados, o produtor pode ter prejuízo na safra 2013/2014”, diz Pessoa.

Silveira acredita que o produtor está pagando por ser eficiente no campo. “O que ocorreu com o milho foi fruto da capacidade do agricultor de responder rapidamente à demanda mundial, mais a disponibilidade de crédito”, diz. “É preciso reagir e cobrar por uma logística eficiente para estocar a safra, porque não podemos sair desse mercado.” Nos últimos anos, o crescimento dos recursos para financiar a safra de soja e milho mostra a gana de quem lida com a terra. Em 2007, para plantar 5,7 milhões de hectares, os produtores de Mato Grosso tomaram R$ 4,8 bilhões em financiamento. Na safra 2012/2013, para 7,9 milhões de hectares, a captação somou R$ 8,2 bilhões. “Não dá para desconsiderar cifras dessa natureza”, diz Pessoa.