Desde que sentou-se na cadeira de presidente da maior exportadora do agronegócio brasileiro, o ex-ministro da Casa Civil Pedro Parente não tem tido vida fácil. A rotina tranquila de consultor e conselheiro em empresas abertas ficou para trás. Com uma carga de trabalho de mais de 12 horas diárias ele tem se mantido focado na missão de promover uma das maiores transformações na história da Bunge Brasil, empresa que chegou ao País em 1905 e que fatura mais de R$ 30 bilhões ao ano.

Na verdade essa é mais uma grande mudança na companhia, entre tantas outras que vêm ocorrendo nos últimos anos. Entre o fim da década de 1990 e começo dos anos 2000, a empresa se desfez de quase 130 negócios e se jogou com força no agronegócio. Inicialmente, os resultados não foram satisfatórios, as margens ficaram apertadas e o lucro caiu.

Nesse período, a multinacional fundada pelo alemão Johannpeter Bunge, em Amsterdã no ano de 1818, entrou com força na área de fertilizantes e saiu às compras. Fertisul, Serrana, Manah, IAP foram algumas das marcas compradas, quando se formou a Bunge Fertilizantes. Na mesma esteira, foi formada a Bunge Alimentos, que possui um sem-número de produtos e marcas. Dez anos depois, mais uma transformação: as duas empresas deixam de existir e se tornam divisões de negócios de uma Bunge Brasil cuja menina dos olhos será justamente o setor sucroenergético, um novato no chamado plano de negócios da empresa e que provavelmente será o grande foco de investimentos nos próximos três anos.

Dos US$ 2,8 bilhões aprovados e disponíveis, US$ 750 milhões irão para o setor de açúcar e etanol, em que a empresa ostenta atualmente a terceira posição com capacidade de moer 20 milhões de toneladas de cana, atrás apenas de Cosan e Louis Dreyfus. E será de Parente o desafio de colocar nos trilhos uma empresa que nos últimos anos, procura a sua própria identidade. “Estamos passando por reformas profundas, mas no fundo estamos nos aproximando de nossa própria história”, explica o diretor de assuntos corporativos Adalgiso Telles.

A companhia é listada na Bolsa de Nova York e o seu controle está nas mãos de empresas e fundos americanos. Das antigas famílias controladoras sobraram apenas o nome e a história. No Brasil, a empresa já teve o seu capital aberto, mas fechou após uma reestruturação mundial em que apenas a matriz se mantém listada em bolsa.

Álcool e açúcar: são as grandes apostas do novo executivo que brigará pela liderança no setor

Alimentos: empresa se tornou uma unidade de negócios e terá poucos investimentos

Grãos: consolidado, o setor se manterá estável na estrutura corporativa

Mas, diante de todos os desafios que a empresa tem pela frente, há um foco muito claro: crescer na área de bioenergia. Isso porque um dos pilares estabelecidos com a chegada do novo executivo é justamente alavancar as ações nas cadeias de valores complementares – açúcar e etanol. Parente tem dito em reuniões internas que a flexibilidade na produção de açúcar ou álcool é significativa e passa a ser uma parte importante do conjunto de produtos oferecidos aos clientes mundo afora.

A empresa entrou no setor em 2006 trabalhando como trading de açúcar. Com a aquisição do Grupo Moema terá também uma forte operação no etanol, com a produção de cerca de 3 bilhões de litros. O plano de expansão no setor sucroenergético receberá US$ 750 milhões no próximo triênio e contemplará todas as unidades. A Usina Santa Juliana, localizada em Minas Gerais, terá sua capacidade de moagem ampliada de 1,4 milhão de toneladas para 4,5 milhões. Em Pedro Afonso, uma nova planta será inaugurada no próximo mês, com capacidade inicial de 2,5 milhões, atingindo sua maturidade com 4,5 milhões de toneladas.

Entre as preocupações do presidente da Bunge está também estabelecer um bom relacionamento com produtores, num misto de incentivos e exigências. A ideia é levar um pouco da experiência como trading de soja para o mercado da cana. Neste ano, 60% da safra será colhida de forma mecanizada e o objetivo é chegar a 90% nos próximos anos.

A mão de obra para o corte da cana é contratada de forma direta pela própria Bunge e não há intermediários, os chamados “gatos”. Todo o sistema tem sido montado no sentido de evitar ao máximo problemas com funcionários. Como o setor sucroenergético é muito visado nas questões trabalhistas, qualquer notícia negativa envolvendo o nome da empresa poderia gerar prejuízos contratuais sem precedentes. “Não podemos correr esse risco”, avalia Telles.

A área de cana receberá R$ 750 milhões

Mesmo que controle a contratação dentro de suas terras, a Bunge não tem como interferir na gestão das propriedades de seus fornecedores, embora possa exercer outros tipos de pressão. Uma das experiências levadas da soja para a cana está no que a companhia tem chamado de “programa de sensibilização”. Na prática, isso significa uma espécie de “reeducação” de fornecedores. O programa é dividido em três fases. A primeira, chamada “sensibilização”, mostra aos produtores a importância econômica de levar a propriedade dentro dos requisitos legais.

A segunda é a capacitação – que dá todo o arcabouço teórico para que o produtor saiba quais são as suas obrigações. A terceira é a cobrança que pode culminar até na exclusão de fornecedores, caso as recomendações não sejam cumpridas.

Parente apostará todas as suas fichas para fazer crescer as operações nos setores de açúcar e etanol e concentrar o foco no que tem chamado de “agronegócio estendido”. “Essa é a orientação que estamos seguindo”, diz Telles. “Estaremos mais próximos de nossa própria história”, diz.