O mercado de trabalho no Brasil mostra “um processo inicial de recuperação” do choque provocado pela crise sanitária, avaliou Adriana Beringuy, analista da Coordenação de Trabalho e Rendimento do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A melhora é impulsionada pelo avanço da vacinação da população contra a covid-19, aponta a pesquisadora.

A taxa de desemprego desceu de 14,7% no primeiro trimestre para 14,1% no segundo trimestre do ano, segundo os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua) divulgados pelo IBGE.

“Um fator que opera de forma bastante favorável para a recuperação do mercado de trabalho é a expansão da vacinação. Em muitas cidades do Brasil, você tem a primeira dose em pessoas com 18 anos de idade. Então o avanço da vacinação é bastante importante para a retomada”, disse Adriana Beringuy. “Mas a gente sabe que não depende só do avanço da vacinação. Existem outros fatores que operam decisivamente para a recuperação do mercado de trabalho, que é um mercado que responde a estímulos a economia.”

Para Adriana, a recuperação do emprego para patamares pré-pandemia vai depender do desempenho da atividade econômica e do impacto da inflação no poder de compra das famílias.

“Isso vai depender da dinâmica da economia, se os trabalhadores vão ser absorvidos. O processo de inflação mexe no poder de compra das famílias. Mais de 70% do nosso PIB (Produto Interno Bruto) vem do consumo das famílias. Para consumir, as pessoas precisam de renda ou de crédito. O crédito nem sempre é uma opção. Depende do aquecimento da demanda para que haja esse círculo virtuoso”, frisou ela.

Segundo ela, o acesso ao consumo via crédito nem sempre é uma opção, “seja porque as famílias estão endividadas ou porque o crédito está caro”. “O mercado de trabalho sempre foi dependente de variáveis econômicas, como juros, consumo das famílias, investimentos, expectativas de investidores. Sempre foi. Só que dessa vez a gente está adicionando um componente novo para a recuperação do mercado de trabalho, a vacinação. A vacinação está ocorrendo, com algumas dificuldades em determinados lugares, mas está ocorrendo. As demais variáveis vamos ter que aguardar”, acrescentou.

A queda na taxa de desemprego no segundo trimestre ainda não foi decorrente de uma redução expressiva no total de pessoas em busca de trabalho. O Brasil tem 14,444 milhões de pessoas procurando uma vaga, 361 mil a menos que no trimestre anterior, uma queda de 2,4%, considerada não estatisticamente significativa, ou seja, dentro da margem de erro da pesquisa.

“É um contingente (de desempregados) bastante elevado, mas mostra mudança de tendência”, explicou Adriana Beringuy.

A taxa de desemprego recuou graças a um crescimento na ocupação: em apenas um trimestre, 2,141 milhões de pessoas conseguiram um trabalho, embora mais de 75% delas na informalidade.

Em apenas um trimestre, 1,117 milhão de pessoas passaram a trabalhar por conta própria e sem CNPJ, ou seja, aderiram a esse tipo de atuação informal. O trabalho por conta própria subiu a um recorde de 24,839 milhões de pessoas.

“Esse tipo de inserção vem sendo fundamental para a expansão da população ocupada”, afirmou Adriana. “Além da participação importante do trabalho informal para a expansão da população ocupada, nesse trimestre a gente também teve expansão da carteira assinada”, completou.

Segundo o IBGE, porém, embora haja mais pessoas trabalhando, a massa de salários em circulação na economia ficou 0,6% menor do que no primeiro trimestre deste ano. Houve uma redução de 3% na renda média paga ao trabalhador, o que está ligado tanto ao aumento da ocupação via informalidade quanto à perda do poder de compra das famílias em função de pressões inflacionárias, apontou Adriana Beringuy.

Com o salário menor, mais pessoas na família precisam trabalhar para alcançar a renda familiar de antes, mas nem assim a massa salarial teve expansão. A retração no rendimento impediu que a massa de salários se expandisse no País.

“O que a gente vê é que as pessoas reduzem o consumo para compatibilizar o consumo com esse nível de renda. Dado que meu rendimento está caindo, eu acabo tendo que gerar um contingente muito grande de trabalhadores, e isso ocorreu efetivamente, tanto no trimestre quando no ano, fazendo com que haja estabilidade da massa (salarial)”, disse Adriana. “Para gerar uma massa de renda estável, eu tive que ter muito mais gente trabalhando. A retração do rendimento não permitiu que essa massa expandisse”, concluiu.