No Pará, a pecuária bovina sempre foi um dos principais motores da economia local. O rebanho, de cerca de 18 milhões de cabeças, é o maior da região Norte e equivale a 9% do brasileiro.  São Félix do Xingu, por exemplo, é o principal município criador do País, com dois milhões de bovinos, de acordo com o IBGE. Mas, nos últimos anos, em função da abundância de pastos que foram se degradando em terras propícias às lavouras, o Estado está se tornando um polo de atração para projetos de Integração Lavoura-Pecuária-Floresta (ILPF). 

O pecuarista Everaldo Pinheiro Tenório pode ser considerado um pioneiro no capítulo integração. O dono da fazenda Raízes, desde 1984, no município de Redenção, começou a investir na ILP em 2002. “Passei a investir na produção agrícola porque queria transformar minha fazenda”, afirma Tenório, que administra a propriedade junto com seus filhos, Fabrício e Leandro Tenório. O projeto de criar gado em 7,5 mil hectares ia bem, mas Tenório diz que o potencial da região sempre chamou a sua atenção, principalmente em relação à logística. “Quando pensava nisso, o que me vinha à cabeça é o fato de o Mato Grosso estar a dois mil quilômetros dos portos e produzir muita soja”, diz ele.  “Então imaginei que nós, que estamos a 800 quilômetros dos portos de Belém e de São Luiz, no Mara­nhão, também poderíamos produzir.”


Família raízes:Everaldo Pinheiro Tenório (ao centro), junto de seus filhos Fabrício (à dir.) e Leandro Tenório, no campo de produção de soja da fazenda

Com essa ideia na cabeça, o produtor partiu para a ação. Nesta safra, dos 12 mil hectares que possui atualmente, Tenório destinou dois mil ao cultivo de soja e mil ao de milho. A colheita rendeu sete mil toneladas de grãos, 30% a mais que na safra 2013/2014. A área de lavoura está integrada a seis mil hectares de pasto para recria de seis mil animais,  após a colheita do grão, que depois são terminados em confinamento. No ano passado, a fazenda Raízes faturou R$ 15 milhões. De olho no potencial agrícola da região, Tenório tornou-se também concessionário da Case IH, do Grupo Fiat e um dos principais fabricantes de máquinas e tratores do País. No ano passado, ele abriu a revenda da marca em Santana do Araguaia. “Montamos um negócio para fechar 2015 com um faturamento de R$ 25 milhões”, diz.

Ele tem bons motivos para apostar no Estado. De acordo com a Compa­nhia Nacional de Abastecimento (Conab), a área cultivada com a oleaginosa triplicou na última década no Estado, saindo de 80 mil hectares para 243 mil na safra 2014/2015. E deve aumentar nos próximos anos. O exemplo da fazenda Raízes está se alastrando pela região. Segundo Carlos Xavier, presidente da Federação de Agricultura e Pecuária do Estado do Pará (Faepa), a pecuária pode ceder à agricultura a metade dos 27 milhões de hectares ocupados pela criação de gado, nos próximos anos. “Assumimos esse plano, sem derrubar uma única árvore”, diz Xavier.

A preocupação do presidente da Faepa faz sentido. A história das últimas décadas do Pará esteve ligada ao desmatamento irracional e sem tréguas. Em 2004, no auge da derrubada de árvores, 8,9 mil km2 de florestas foram ceifadas. Na época, o Estado era o campeão em número de municípios na lista negra de desmatamento do Ministério do Meio Ambiente. De lá para cá, produtores e entidades empresariais têm feito de tudo para livrar-se desse estigma, abraçando iniciativas do bem, como a proposta da ILP. “Hoje, o Pará está pronto para se tornar uma potência na produção de alimentos”, diz Xavier.


Invasão da soja: a área ocupada pela oleaginosa triplicou na última década chegando a 243 mil hectares,na safra 2014/2015

Para a Associação Brasileira da Indústria de Óleos Vegetais (Abiove), que tem projeções mais modestas, dois milhões de hectares de pastos convertidos ou integrados à agricultura na próxima década já seriam uma revolução no Estado. “Estamos prevendo essa meta, levando em conta o cumprimento do novo Código Florestal, o qual restringe a produção agropecuária em 20% da área nas propriedade do bioma amazônico”, diz  Bernardo Pires, gerente de sustentabilidade da Abiove. Desde o ano passado, a Abiove vem incentivando a adesão dos produtores ao programa Soja Plus, para que o cultivo esteja dentro de padrões auditáveis para mercados exigentes, como o europeu, atraindo as principais tradings, como a  ADM, a Bunge, a Cargill, a Amaggi e a Algar Agro, que já estão operando no Pará. “Quem produzir de forma sustentável, como acontece na integração lavoura-pecuária, tem mais chances no mercado internacional”, afirma Pires.