Lá se vão dois meses desde que casos de encefalopatia espongiforme bovina, doença conhecida como o mal da vaca louca, foram identificados nos estados do Mato Grosso e de Minas Gerais. A exportação de carne para a China foi imediatamente suspensa. E ainda não foi retomada, mesmo após os casos serem identificados como “atípicos”, ou seja, ocorreram de forma natural e espontânea em animais com mais de oito anos. Os prejuízos, no entanto, estão se avolumando e preocupam os pecuaristas.

INTERNACIONAL Demanda mundial por carne continua forte e preço externo não deve ter queda (Crédito:MIGUEL ROJO)

Com base em dados preliminares da Secretaria de Comércio Exterior (Secex), o Instituto Mato-Grossense de Carne (Imac) divulgou, no dia 26 de outubro, que a média mensal de exportação brasileira de carne bovina caiu 36,7% quando comparada aos dados do mesmo período de 2020. Em volume foram exportadas 83.489 toneladas, mas esse montante é quase 49% inferior ao de outubro do ano passado. Só para o estado do Mato Grosso, o prejuízo com os embargos chineses pode chegar a R$ 1,4 bilhão.

Os impactos da suspensão já começam a preocupar produtores. A pecuarista Chris Morais, responsável por um rancho em Barretos (SP), disse que a demora na retomada das atividades está causando prejuízos diários ao setor, influenciando inclusive no preço da arroba do boi gordo. Após atingir R$ 320 na metade do ano, o valor da commodity caiu para R$ 270 no início de outubro, 13% abaixo do registrado em setembro, segundo dados divulgados pelo Centro de Estudos Avançados em Economia (Cepea).

“A demanda mundial continua firme e os preços internacionais não devem cair tão cedo”, afirmou Marcos Fava Neves, professor da USP Ribeirão Preto e da FGV-SP. Em sua opinião, se a situação durar mais tempo, haverá uma troca de canais, mas não uma queda de preços. Afinal, os custos da produção e do transporte continuam elevados. Já no mercado interno há uma possibilidade de queda no preço das carnes à medida que os estoques destinados à exportação forem remanejados.

PREJUÍZO BILATERAL Há muita especulação sobre o que estaria prolongando o embargo. Já se falou até em uma possível retaliação do governo chinês às declarações do presidente Jair Bolsonaro. Em maio, Bolsonaro afirmou que a pandemia fazia parte de uma “guerra biológica” iniciada pela China. Em outubro, o presidente chegou a fazer uma imitação preconceituosa dos chineses em uma live. Especialistas em agronegócio, como Henrique Dau, economista do Insper, no entanto, dizem não acreditar que a suspensão das exportações esteja relacionada a problemas diplomáticos anteriores à identificação da doença da vaca louca. “A China é muito visceral nessas suspensões. Os britânicos ficaram um ano sem retomar as exportações para a China em razão de um embargo que eles sofreram”, afirmou Dau.

“Se as exportações não retornarem, os preços das carnes na China podem sofrer inflação e prejudicar seu próprio consumidor’’ Marcos Fava Neves USP E FGV-SP (Crédito:Divulgação)

Neves, da FGV, também diz não acreditar que a atual situação esteja ligada às declarações do presidente. Para ele, os embargos não devem demorar muito para cair, pois tanto brasileiros quanto chineses saem perdendo com o prolongamento da situação. “Se as exportações não retornarem, os preços das carnes na China também podem sofrer inflação e prejudicar seu próprio consumidor. São países que têm uma relação comercial cada dia mais vigorosa e essa lentidão não foi um bom sinal da China”, disse.